Opinião

Como Kamala Harris pode redefinir a política imigratória dos EUA

Autor

  • Mariana Celestino de Paula Santos

    é advogada master of laws em direito internacional pela American University Washington College of Law em Washington D.C EUA sócia-fundadora da empresa I’m.migrationEUA diretora de relações internacionais do Instituto Luiz Gama (@institutoluizgama) e advogada colaboradora no escritório Advocacia Gomes Almeida & Caldas.

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27 de julho de 2024, 6h03

A possível eleição de Kamala Harris para a Presidência dos Estados Unidos, que se avizinha com a decisão de Joe Biden de não concorrer à reeleição, pode representar um momento crucial para a política imigratória americana. Em contraste com a abordagem rígida e polarizadora de Donald Trump, Harris oferece uma perspectiva que promete um retorno a uma política mais humana e ponderada, alinhada com os princípios de direitos humanos e justiça social.

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Kamala Harris, filha de imigrantes e atual candidata do Partido Democrata na corrida presidencial americana de 2024, tem um histórico de evolução em suas posições sobre imigração. Durante sua carreira, desde a Procuradoria Geral de San Francisco até o Senado, Harris demonstrou uma crescente consciência das complexidades e necessidades das comunidades imigrantes.

Em 2008, como procuradora-geral de San Francisco, Kamala Harris apoiou uma política que envolvia a notificação de imigrantes juvenis às autoridades federais em casos de crimes graves. A política era voltada para a colaboração entre autoridades locais e federais na imigração e tinha o objetivo de garantir que os imigrantes juvenis que cometiam crimes graves fossem reportados ao Departamento de Imigração e Alfândega dos Estados Unidos (ICE). Esse posicionamento gerou controvérsias e críticas de defensores dos direitos dos imigrantes nos EUA.

No entanto, Harris evoluiu significativamente desde então. Em sua gestão como senadora e, mais tarde, como vice-presidente, Harris adotou uma abordagem mais empática e orientada para soluções.

Oposição e vice-presidência

Como senadora, Harris foi uma das primeiras a se posicionar contra a administração Trump e suas políticas anti-imigração, incluindo a separação de famílias e a limitação das oportunidades para os “Dreamers” (beneficiários do Daca).

Diferentemente de Donald Trump, ex-presidente norte americano e candidato à reeleição para presidência, cuja administração foi marcada por uma postura unilateral e frequentemente adversarial em relação aos países vizinhos, Harris tem demonstrado um compromisso com o multilateralismo e a diplomacia.

Spacca

Durante sua vice-presidência, ela liderou a iniciativa “Root Causes Strategy”, que visou abordar as causas profundas da migração da América Central, como pobreza, violência e corrupção. Esse enfoque busca soluções sustentáveis e de longo prazo, ao invés de medidas punitivas imediatas. Esse papel, frequentemente referenciado de forma crítica como “czar da fronteira”, foi mal interpretado por vários críticos e pela mídia. A designação de Harris para o cargo foi uma tentativa de administrar a complexa questão da imigração de uma maneira que se distanciasse das práticas de seus antecessores.

Gestão da fronteira e estratégia

O termo “czar da fronteira”, utilizado predominantemente por opositores políticos, gerou confusão e contribuiu para uma percepção incorreta das responsabilidades de Harris. Ao contrário do que o título sugere, Harris não tinha controle direto sobre a gestão da fronteira EUA-México ou sobre as políticas de detenção e deportação. Seu papel estava focado em liderar uma estratégia que abordava os fatores que impulsionam a migração irregular, como a violência, a corrupção e a falta de oportunidades econômicas na América Central.

A estratégia “Root Causes” visava promover investimentos em desenvolvimento econômico e social para reduzir a necessidade de migração forçada, além de fortalecer instituições locais para enfrentar a corrupção e a violência. A iniciativa gerou um investimento de mais de US$5 milhões em países da América Central por empresas. Embora essa abordagem não tenha resultado em uma solução imediata para a crise na fronteira, ela representou uma tentativa de atacar a raiz do problema de maneira mais estratégica.

Equilíbrio

A política imigratória defendida pela candidata a presidência está longe de apoiar uma imigração ilegal. A abordagem de Harris busca equilibrar a segurança nacional com o respeito pelos direitos humanos e pela dignidade dos indivíduos.

Se eleita presidente, espera-se que Harris afaste abordagens estritamente punitivas e rígidas em relação a imigração, que não apenas falharam em conter a imigração ilegal, mas também prejudicaram a economia americana.

Em vez disso, acredita-se que a candidata adotará uma abordagem que una segurança e direitos humanos com soluções eficazes, incentivando a imigração legal que beneficia a economia dos EUA e limitando a imigração ilegal de forma mais eficiente.

 


Referências

CELESTINO, Mariana de Paula Santos; SILVA, Keyla Rodrigues da. Apoio de DeSantis a Trump sugere política imigratória mais rigorosa nos EUA. Folha de S.Paulo, 1 fev. 2024. Disponível em: https://www.folha.com.br/politica/imigracao/apoio-desantis-trump. Acesso em: 24 jul. 2024.

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Autores

  • é advogada, master of laws em Direito Internacional pela American University Washington College of Law, em Washington D.C (EUA, sócia-fundadora da empresa I’m.migrationEUA (@im.migrationeua), diretora de Relações Internacionais do Instituto Luiz Gama (@institutoluizgama), advogada colaboradora no escritório Advocacia Gomes, Almeida & Caldas, palestrante e autora de textos jurídicos.

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