Opinião

Regime especial tributário para condomínio de lotes

Autores

25 de julho de 2024, 20h40

Implementado pela Lei nº 10.931/2004, o regime especial de tributação é um regime opcional para incorporadoras imobiliárias que permite às empresas pagarem um percentual fixo de 4% sobre as receitas mensais recebidas, que corresponde ao pagamento unificado do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins.

Freepik

Inicialmente, não havia regulamentação no formato de parcelamento de solo urbano pelo condomínio de lotes. A Lei 6.766/79 trata do parcelamento do solo urbano, dispondo que o lote poderá ser constituído sob a forma de imóvel autônomo ou de unidade imobiliária integrante de condomínio de lotes.

Com a Lei nº 13.465/2017, que inseriu o artigo 1358-A ao Código Civil, restou expresso na legislação que o condomínio de lotes constitui espécie de condomínio edilício. O §3º do artigo 1.358-A prevê que, para fins de incorporação imobiliária, a implantação de toda a infraestrutura ficará a cargo do empreendedor. Dessa forma, deixa claro também que o condomínio de lotes poderá ser desenvolvido na forma de incorporação imobiliária.

Após a Lei nº 14.382/22, o artigo foi alterado e, no parágrafo segundo, passou a dispor que se aplica ao condomínio de lotes, no que couber, o regime jurídico das incorporações imobiliárias, de que trata do Capítulo I do Título II da Lei nº 4.591, equiparando-se o empreendedor ao incorporador quanto aos aspectos civis e registrários.

Embora a lei civil não tenha tratado especificamente do RET, a conclusão natural é de que o condomínio de lotes desenvolvido na forma de incorporação imobiliária, inclusive pela constituição de patrimônio de afetação, poderá ser tributado na forma do regime especial, a partir da opção pelo contribuinte.

Ocorre que a alteração promovida pela Lei nº 14.382/22, ao acrescentar a ressalva de que o regime da incorporação se aplica “no que couber”, e ainda ter mencionado que o regime aplicável é o do “Capítulo I do Título II da Lei nº 4.591” (artigo 28), sem incluir, portanto, as regras sobre patrimônio de afetação que constam dos artigos 31-A a 31-F da lei, restou dúvida sobre se a constituição do patrimônio de afetação é obrigatória para que o empreendedor usufrua do RET.

Com efeito, a constituição do patrimônio de afetação é requisito legal para a adesão ao RET, na forma do artigo 2º, II, da Lei nº 10.931.

Na prática, a constituição de patrimônio de afetação não chegou a ser excluída do condomínio de lotes. O condomínio edilício e o condomínio de lotes são figuras jurídicas similares, não havendo qualquer distinção quanto ao regime da incorporação imobiliária. De um lado, tem-se um condomínio vertical, e, de outro, condomínio horizontal. Em ambos há a existência de unidades autônomas e de áreas comuns.

As unidades autônomas poderão ser comercializadas na forma da incorporação imobiliária, e o incorporador poderá fazer uso da faculdade do artigo 31-A da Lei n. 4.591/64. Isto é, poderá constituir patrimônio de afetação, com a afetação do terreno e das acessões. As regras do patrimônio de afetação não constituem um regime jurídico autônomo, mas uma faculdade legal do incorporador, na forma da Lei nº 4.591/64.

Spacca

Ocorre que a matéria se tornou complexa em virtude da Solução de Consulta Cosit nº 24 de 20 de janeiro de 2023. Nessa solução de consulta, a Receita Federal emitiu opinião acerca do regime de parcelamento do solo para construção de casas isoladas ou geminadas, previsto no artigo 68 da Lei nº 4.591/64, inserido pela Lei nº 14.382/22. Através desse artigo, ficou definido que a atividade de alienação de lotes integrantes de loteamento, caracteriza incorporação imobiliária.

Tipo diferente de loteamento

A comercialização de lotes de que trata do artigo 68 da Lei nº 4.591/64 consiste num tipo diferente de loteamento ou parcelamento do solo. Nesse caso, não existem unidades autônomas e área comum, tanto que o conjunto imobiliário resultante não se sujeita ao regime de condomínio edilício, por força expressa da lei (§ 1º). Nesses empreendimentos, as vias construídas são públicas e entregues ao patrimônio público, não constituindo área comum em regime de condomínio. Portanto, embora a venda de loteamento de casas isoladas possa ser realizada na forma de incorporação imobiliária, a partir do que dispõe o artigo 68 da Lei nº 4.591/64, trata-se de uma figura jurídica diferente em relação ao condomínio de lotes.

Mas a Solução de Consulta Cosit nº 24 de 20 de janeiro de 2023 não deixou claro que a situação analisada era justamente a de casas isoladas. A sua ementa, trouxe disposição que causa certa confusão entre os regimes, quando se trata da aplicação do RET. Veja-se:

INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. REGIME ESPECIAL DE TRIBUTAÇÃO. PARCELAMENTO DO SOLO MEDIANTE LOTEAMENTO. CONSTRUÇÃO DE UNIDADES HABITACIONAIS. ADMISSIBILIDADE DE ADESÃO. MARCO TEMPORAL.

Anteriormente a 28 de junho de 2022, data de publicação da Lei no 14.382, de 27 de junho de 2022, no DOU, o parcelamento do solo mediante loteamento, per se, ainda que contratualmente vinculado à opção de construção de unidades habitacionais segundo projetos previamente aprovados pelo órgão competente, era insuficiente para caracterizar a incorporação imobiliária, para fins de adesão ao Regime Especial de Tributação (RET) instituído pelos arts. 1o a 10 da Lei no 10.931, de 2004.

A partir de 28 de junho de 2022, o parcelamento do solo mediante loteamento caracteriza a incorporação imobiliária, para fins de adesão ao Regime Especial de Tributação (RET) instituído pelos arts. 1o a 10 da Lei no 10.931, de 2004, desde que sejam atendidos os requisitos da legislação de regência, entre os quais se destaca a vinculação da atividade de alienação de lotes integrantes do loteamento à construção de casas isoladas ou geminadas, promovida por uma das pessoas indicadas no art. 31 da Lei no 4.591, de 1964, ou no art. 2o-A da Lei no 6.766, de 1979.

SOLUÇÃO DE CONSULTA PARCIALMENTE VINCULADA À SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT No 196, DE 5 DE AGOSTO DE 2015.

Dispositivos Legais: Lei no 4.591, de 1964, arts. 28, parágrafo único, 29 e 68; Lei no 6.766, de 1979, art. 2o, §§ 1o e 2o; Lei no 10.406, de 2022 (Código Civil), art. 1.358-A; Lei no 10.931, de 2004, arts. 1o e 4o; Lei no 14.382, de 2022, arts. 10 e 14; Instrução Normativa RFB no 1.435, de 2013, art. 2o, § 1o.

Nos termos da Solução de Consulta Cosit nº 24 de 2023, o loteamento de casas isoladas somente caracteriza incorporação imobiliária, para fins de aplicação do RET, a partir de 28 de junho de 2022, data de vigência da Lei nº 14.382, que incluiu o artigo 68 na Lei nº 4.591/64.

Como a solução de consulta não deixou clara a diferença entre loteamento de casas isoladas e o condomínio de lotes, restou dúvida se, para fins do RET, também as regras do artigo 68 da Lei nº 4.591 condicionariam a interpretação para o condomínio de lotes. Em especial, porque, nos termos da Cosit, o parcelamento do solo por si caracteriza a incorporação imobiliária, para fins de adesão ao RET, no caso do loteamento de casas isoladas.

Diante deste contexto, foi realizada consulta na Receita Federal (Cosit nº 205/2024) questionando a exigência da constituição do patrimônio de afetação para a adesão  ao RET em condomínio de lotes.

Ora, se o instituto da incorporação imobiliária é regulamentado e previsto para os condomínios edilícios, pela lógica, também seria aplicável ao condomínio de lotes. E, assim, fora esclarecido pela Receita na Cosit nº 205, que concluiu que o incorporador imobiliário que realiza o parcelamento do solo urbano na forma de condomínio de lotes poderá optar pelo RET aplicável às incorporações imobiliárias (RET-Incorporação), desde que atendidos aos requisitos dos artigos 1º a 4º da Lei nº 10.931/2004, entre eles a necessidade do regime de afetação (artigos 31-A a 31-E da Lei nº 4.591/1964).

O esclarecimento possibilita que os incorporadores de condomínio de lotes optem pelo regime especial de tributação, trazendo segurança jurídica para os referidos incorporadores, além de ser um ponto positivo do ponto de vista tributário para o contribuinte-incorporador.

Autores

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!