CENÁRIO DE INCERTEZAS

Policial se livra de júri após vídeo e laudo colocarem em xeque atentado

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19 de julho de 2024, 20h52

Sem que se comprove a ocorrência (materialidade) de um crime doloso contra a vida, o réu não deve ser submetido a júri popular, nos termos do artigo 414 do Código de Processo Penal. Com essa fundamentação, a juíza Denise Gomes Bezerra Mota, da 1ª Vara Criminal de Guarujá (SP), impronunciou um policial penal acusado de tentar matar um homem a tiro em uma padaria.

Porte de arma, assalto

Vídeo de câmera de segurança mostrou que não houve disparo da arma do policial

“Não há conclusão segura de que foi efetuado um primeiro disparo, acidental ou intencional, tampouco de que o disparo da arma de fogo foi para o réu se defender da vítima ou para ceifar a vida da vítima, caso tenha sido intencional”, constatou a julgadora. Ela acrescentou que inexistem nos autos indícios suficientes da prática do delito descrito na denúncia, não ficando comprovado eventual dolo de matar do réu.

O suposto delito aconteceu no dia 18 de julho de 2022 e o policial penal foi autuado em flagrante. Na audiência de custódia, ele teve a prisão preventiva decretada e ficou encarcerado um mês. Foi solto após obter a liberdade provisória mediante a imposição das medidas cautelares de proibição de manter contato com a vítima e de se ausentar da comarca, salvo a trabalho.

Advocacia investigativa

Denunciado pela promotora Patrícia Mendonça Barbosa Laport por tentativa de homicídio qualificado pelo motivo torpe, o réu foi defendido pelo advogado Anderson Real Soares. O defensor apresentou na audiência de instrução a filmagem de uma câmera de segurança da padaria. O vídeo reforçou a versão do réu de que não houve disparo, mas um confronto físico, no qual a suposta vítima tentou furtar a arma do policial penal.

A filmagem foi obtida por Real após ele fazer diligência no estabelecimento comercial, constatar a existência de câmeras e solicitar o vídeo ao dono da padaria. Como a Polícia Civil não havia conseguido essa prova e nem o Ministério Público havia requisitado que se investigasse a sua eventual existência, o advogado peticionou pela juntada da gravação nos autos. O pedido foi deferido pela juíza e o MP alterou o seu posicionamento.

O promotor Victor Conrad Santos Teixeira de Freitas pediu a impronúncia do réu em suas alegações finais, sob a justificativa de não haver qualquer elemento de prova oral que permita privilegiar a palavra de uma parte em detrimento da outra. Ele também reconheceu que “as imagens da câmera de segurança que captou toda a ação também criam fundada dúvida sobre a agressão inicial e o intento homicida do acusado”.

Crime impossível

Real não só pediu a impronúncia, como foi além em sua manifestação final. O advogado sustentou a tese de crime impossível, destacando que a perícia feita na pistola calibre 380 do policial penal teve resultado negativo para disparos recentes. “O laudo diz que não houve tiro, o que é confirmado pela filmagem. Desse modo, seria impossível alcançar o resultado do delito descrito na denúncia”, argumentou o advogado.

A julgadora observou que o ofendido e o acusado ofereceram versões contraditórias, enquanto as testemunhas ouvidas em juízo não presenciaram os fatos. Em relação às imagens gravadas, segundo a julgadora, após instantes de aparente diálogo entre as partes, ambas começam a brigar. Porém, a filmagem não mostra o réu sacando a arma ou apontando-a para a vítima, gerando um “cenário de incertezas”.

Embora tenha considerado a impronúncia como a decisão cabível ante a falta de indícios suficientes da prática do crime, a juíza afastou a tese defensiva de crime impossível devido a um adendo do laudo da arma do policial penal. Apesar de atestar que não houve disparo recente na pistola, o perito cogitou que o intervalo de 14 dias entre a ocorrência e a apresentação do armamento para perícia pode ter afetado o resultado do exame.

Processo 1502490-93.2022.8.26.0536

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