VAI E VEM DA REDE

Decisão de tribunal preocupa defensores da neutralidade da internet nos EUA

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17 de julho de 2024, 11h55

O novo regulamento da Comissão Federal de Comunicações (FCC Federal Communications Commission), que restabelece a neutralidade de rede nos Estados Unidos, entraria em vigor em 22 de julho. Porém, o Tribunal de Recursos da 6ª Região, com sede em Ohio, pisou no freio: prorrogou a data de início da vigência para 5 de agosto.

Disputa judicial nos EUA coloca em xeque neutralidade de rede dos provedores de internet

Em uma curta ordem judicial, o tribunal explicou seus motivos: “Com o objetivo de dar oportunidade suficiente para a consideração dos méritos da ação, que propõe a suspensão (definitiva) do regulamento da FCC, concluímos que uma suspensão administrativa (temporária) é justificada”.

Em sua ordem, o tribunal convidou as partes para protocolarem no tribunal, até 19 de julho, petições com análises sobre dois precedentes da Suprema Corte, que devem ser analisados no julgamento do mérito do caso o que contesta o regulamentoSafeguarding and Securing the Open Internet” da FCC.

Um dos precedentes derivou da decisão de “National Cable & Telecommunications Association v. Brand X Internet Services”, chamada de “Brand X”, que pode favorecer a defesa da neutralidade da rede. O outro derivou da decisão de “Loper Bright Enterprises v. Raimondo”, conhecida como “Loper Bright”.

Neste caso, a Suprema Corte revogou um outro precedente de 40 anos, o Chevron U.S.A., Inc. v. Natural Resources Defense Council, Inc., mais conhecido como “Chevron Deference”. Esse precedente criou a “Doutrina Chevron”, que orientava os juízes federais a acatarem a interpretação (ou a regulamentação), pelos experts de órgãos governamentais, de leis que são ambíguas desde que a interpretação seja razoável.

Em “Brand X” (de 27/6/ 2005), a Suprema Corte deu poder à FCC para interpretar a Lei das Comunicações. E sustentou que a Comissão decidiu, corretamente, que as provedoras de banda larga não se enquadram na definição de “serviços de telecomunicações”, como estabelece a lei e estava de acordo com a “Doutrina Chevron”.

Em “Loper Bright” (de 28/6/2024), a Suprema Corte retirou o poder dos órgãos governamentais, incluindo a FCC, de interpretar leis, ao revogar o precedente “Chevron Deference” (de 25/6/2984).

Utilidade pública

O enquadramento das provedoras de serviços de internet (ISPs) na categoria de serviços de utilidade pública (tais como telecomunicações, eletricidade, gás, água e esgoto) as submete a um certo nível de autoridade reguladora da FCC, de acordo com a Lei das Comunicações e as obriga a manter a neutralidade de rede.

A neutralidade é explicada, nos EUA, como o princípio de que as ISPs não podem bloquear ou limitar o tráfego de forma discriminatória ou seja, são serviços que devem ser disponibilizados de forma igual para todos.

As autoras da ação, um grupo de ISPs e provedoras de serviços de telecomunicações e de TV a cabo, lideradas pela Comcast, Charter, AT&T, Verizon e Spectrum (ex-Time Warner), querem ter liberdade para operar seus negócios como lhes apetecer.

Poderiam, por exemplo, disponibilizar diferentes “pacotes” de internet com preços variáveis, como fazem os canais de TV a cabo. Ou criar pacotes específicos para notícias, filmes, esportes e entretenimento.

Poderiam, igualmente, reduzir ou aumentar a velocidade de download e upload de cada site, de acordo com o que o freguês quiser pagar. E ainda impedir o acesso a sites, incluindo de empresas concorrentes ou o uso de aplicativos como WhatsApp, Skype ou Netflix, a não ser que o consumidor pague por isso.

Essas grandes empresas argumentam que a regulamentação de suas atividades pelo governo é desnecessária e que só servem para inibir investimentos em inovação.

Porém, outras grandes organizações entre as quais Google, Amazon, Facebook, Netflix, Twitter, Spotify, Reddit, Mozilla, Airbnb, Dropbox, Tumblr, GoDaddy e Expedia, bem como as organizações American Civil Liberties Union (ACLU) e a Electronic Frontier Foundation discordam e fazem campanha a favor da regulamentação pela FCC.

Há uma previsão de que a FCC poderá recorrer ao tribunal pleno para tentar modificar a decisão do colegiado de três juízes que votaram, unanimemente, pela suspensão temporária da entrada em vigor do regulamento da FCC. Mas essa parece ser uma medida precipitada, porque não se pode prever qual será a decisão do colegiado sobre o mérito da questão.

Sabe-se que a Suprema Corte afirmou que a revogação do precedente “Chevron Deference” não anula automaticamente o precedente “Brand X”. A corte declarou que, em vez disso, a decisão “não questiona casos anteriores que se sustentaram na estrutura de Chevron”.

Vai e vem

A disputa sobre a neutralidade da rede tem mudado de roupa a cada governo, dependendo de que partido está no poder. Foi implementada, pela primeira vez, no governo Obama, quando a FCC era governada por três democratas e dois republicanos.

Depois, foi desmontada no governo de Donald Trump, quando o quadro mudou para três republicanos e dois democratas. E, finalmente, voltou a valer no governo Biden, com três democratas e dois republicanos no poder. Se o ex-presidente Trump ganhar as eleições deste ano, provavelmente acabará novamente com a neutralidade da rede e com a ação que corre na Justiça.

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