Opinião

Avanços e retrocessos nos 40 anos da Lei de Execução Penal

Autor

  • Alexandre José Trovão Brito

    é advogado em São Luís especialista em Direito Penal e Processo Penal pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB Seccional Maranhão.

    View all posts

15 de julho de 2024, 13h16

Em 1975, em pleno regime de exceção, uma Comissão Parlamentar de Inquérito foi instalada na Câmara para analisar o sistema prisional brasileiro. Naquela época, coube ao deputado Ibrahim Abi-Ackel, relatar a comissão, que constatou um problema: não havia um padrão de execução penal no Brasil, e cada estado prendia do seu próprio jeito.

Freepik
Prisão, presídio, presidiário, algemas

É preciso festejar os 40 anos da Lei de Execução Penal. São muitos avanços, conquistas e realizações ao longo desse tempo. A LEP foi promulgada no dia 11/7/1984, quando exsurgiu no apagar das luzes da ditadura civil-militar, ou seja, no governo João Batista Figueiredo. O ministro da Justiça daquela época era Ibrahim Abi-Ackel.

Ressocialização

O objetivo da Lei 7.210/1984 (LEP) foi unificar cientificamente as normas relacionadas à execução da pena no Brasil. Foi realizada uma verdadeira imersão doutrinária em outros países e uma das conclusões obtidas foi que o sistema progressivo de pena era algo essencial para se alcançar a ressocialização do detento.

O Direito de Execução Penal foi instrumentalizado no Brasil como uma política de Estado para neutralizar os indesejáveis, vulnerabilizados e descartáveis. Quando na verdade, deveria ser manejado como uma política de Estado voltada para a concretização de um projeto reabilitador.

A todo momento a Lei 7.210/1984 tem como objetivo a reintegração da pessoa privada de liberdade. As saídas temporárias (atualmente permitidas apenas em casos de estudo, após a edição da Lei 14.843/2024), o trabalho externo, a remição pelo trabalho e estudo são apenas alguns exemplos desse mote ressocializador.

Conquistas

Ao longo dessas quatro décadas, o sistema carcerário avançou em alguns pontos, como por exemplo o fortalecimento de políticas voltadas ao egresso, demonstrando uma preocupação no estágio pós-pena. Precisamos não somente garantir direitos ao sujeito privado de liberdade, mas também aos que foram liberados do cárcere.

Muita coisa mudou nos 40 anos da LEP. Outro belo exemplo de avanço foi a Lei nº 12.313/2010, a qual foi responsável por estabelecer a competência da Defensoria Pública de garantir o acesso à Justiça, no âmbito da execução penal, e a prestação de assistência judiciária integral e gratuita aos presos. Tal medida robusteceu a defesa dos direitos da população carcerária.

Spacca

Outra conquista significativa foi a possibilidade de governos, nas três esferas (federal, estadual e municipal), celebrarem convênio com a iniciativa privada para implantar oficinas de trabalho em setores de apoio nos presídios. Basta conferir o artigo 34, §2º, da LEP, incluído pela lei 10.792/2003.

Retrocessos

Mas nem só de avanços vive a execução penal. Um retrocesso que merece ser citado foi o fato de a Lei 14.843/2024, já citada anteriormente, exigir a obrigatoriedade do exame criminológico para a progressão de regime prisional, não permitir mais a saída temporária dos presos para visita à família e expandir com bastante amplitude o monitoramento eletrônico.

Inclusive, já existem decisões judiciais declarando incidentalmente a inconstitucionalidade parcial da Lei 14.843/2024 no que concerne ao artigo 112, § 1º da Lei de Execução Penal, uma vez que a obrigatoriedade do exame criminológico seria algo contraproducente em um sistema superlotado de prisioneiros e com carência de profissionais para a realização do exame.

Outro retrocesso para a execução criminal foi o pacote anticrime (Lei 13.964/2019) inserir no rol de falta graves da LEP a recusa do reeducando de se submeter ao procedimento de identificação do perfil genético. Isso afronta o princípio da vedação de autoincriminação ou privilege against self-incrimination.

Sigo. A lei anticrime ainda ousou aumentar os prazos para a progressão de regime, além de vedar o direito ao livramento condicional do habitante prisional que for reincidente em crime hediondo. Ora, isso vai na direção oposta das coordenadas legalistas da execução penal que tentam promover a readaptação do apenado ao convívio social.

Prevenção

Continuamos com um grande déficit de vagas prisionais. A malha carcerária precisa ser alargada para comportar o enorme quantitativo de hóspedes prisionais, mas, ao mesmo tempo, temos que despertar para a urgência de se investir em medidas que tenham o condão de afastar nossos jovens da criminalidade e do encarceramento, como por exemplo, empregos, educação, esporte, dentre outras medidas.

Ergo a bandeira de um Direito de Execução Penal Humanitário, pautado na dignidade da pessoa humana, princípio irradiador de efeitos para todo o sistema jurídico bem como corolário da nossa carta constitucional, de diplomas internacionais de direitos humanos (v.g. convenção americana de direitos humanos e pacto internacional de direitos civis e políticos) e da própria Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Autores

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!