Opinião

Medidas atípicas de execução devem proteger direitos dos credores e dos devedores

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28 de dezembro de 2024, 13h12

As medidas atípicas são instrumentos processuais que têm se tornado cada vez mais relevantes no contexto do direito executivo, especialmente em situações em que as medidas tradicionais não se mostram suficientes para garantir a satisfação do crédito. Elas são concebidas para assegurar a efetividade da execução, funcionando como mecanismos de pressão sobre o devedor, a fim de compeli-lo a cumprir suas obrigações.

Entre as medidas atípicas mais frequentemente utilizadas, destacam-se a suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), a apreensão do passaporte e o bloqueio de cartões de crédito do executado. Essas intervenções visam a provocar um impacto direto na vida cotidiana do devedor, forçando-o a reconsiderar sua postura em relação à dívida.

Essas medidas não apenas refletem uma busca por maior eficiência na recuperação de créditos, mas também levantam importantes questões jurídicas e éticas. Por um lado, garantem aos credores um meio de assegurar seus direitos, especialmente em um cenário onde a inadimplência é uma realidade crescente. Por outro lado, o uso de tais medidas suscita preocupações quanto ao respeito aos direitos fundamentais do devedor, especialmente no que diz respeito à dignidade humana e ao princípio da menor onerosidade.

Essa nova abordagem nos permite compreender melhor o papel das medidas atípicas no sistema jurídico atual e as implicações de sua utilização em um cenário de crescente complexidade nas relações de crédito.

Entendimento dos tribunais 

A título de exemplificação, o acórdão do Agravo de Instrumento 2062987-72.2022.8.26.0000, julgado pela 8ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP em 2022, em sua fundamentação, levou em conta que, após esgotarem-se as  tentativas de localizar bens do devedor que pudessem ser penhorados, as medidas  requeridas eram apropriadas para garantir a satisfação do crédito, uma vez que a  maneira mais efetiva de contemplar o direito do credor de receber o que lhe é devido, levando em consideração sólidos precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A efetividade da medida atípica a ser estabelecida depende da situação de fato existente em cada caso analisado. Isso porque a efetividade se dá no ato capaz de conduzir o devedor à realização da sua obrigação, ato que será diferente com as variedades de credores.

Spacca

Com o desenvolvimento das teses judiciais no âmbito da execução, são inúmeras as novas modalidades de medidas atípicas apresentadas atualmente ao juízo, dentre elas grandes inovações, a título de exemplo: a penhora de direitos hereditários, a penhora de animais de estimação, a suspensão de perfis em redes sociais, entre diversas outras.

Portanto, a medida atípica é um instituto que pode e deve ser amplamente utilizado como forma de certificar o cumprimento da obrigação do devedor, de maneira a trazer maior efetividade ao processo executivo do judiciário brasileiro, uma vez analisado o caso e aplicando a medida atípica que condiz com a situação fática do devedor.

Discussão na jurisprudência do direito das execuções

Ante todo o exposto, nota-se que as medidas atípicas têm ganhado mais espaço e gerado mais discussão na jurisprudência do direito das execuções, tendo em vista a crescente necessidade de mecanismos que garantam a satisfação dos créditos em um cenário de frequente inadimplência.

Ao se apresentarem como alternativas às práticas tradicionais de coerção do devedor, essas medidas buscam compelir o executado ao cumprimento de suas obrigações judicialmente determinadas, utilizando sanções que impactam sua vida cotidiana de outros modos que não o monetário, como a suspensão da CNH ou o bloqueio de cartões de crédito.

No entanto, já existem precedentes claros que essas medidas de efetividade não devem ser deferidas em detrimento dos direitos fundamentais do devedor, exigindo uma análise cuidadosa e contextualizada das circunstâncias de cada caso, a fim de que estejam em harmonia com os princípios da proporcionalidade, razoabilidade e efetividade.

O referido acórdão evidencia a importância da aplicação dos referidos princípios na instrumentalização das medidas atípicas. É fundamental que o magistrado considere a dignidade da pessoa humana, a mínima onerosidade e a segurança jurídica, garantido que as medidas coercitivas não sejam desproporcionais ao devedor e à sua família, num contexto de direitos fundamentais e subsistência.

Dignidade do devedor

A jurisprudência, ao reconhecer que a execução deve respeitar o mínimo existencial, reforça que as medidas não podem ser meramente punitivas, mas sim indutivas, buscando sempre a realização do pagamento de forma que preserve a dignidade do devedor.

O que se percebe é que a suspensão dos julgamentos relacionados ao Tema 1137 do STJ revela um movimento em direção à uniformização e à clareza nas diretrizes sobre a aplicação de medidas atípicas. Esse cuidado é fundamental para evitar decisões conflitantes que possam gerar insegurança jurídica e prejudicar ambas as partes.

Assim, o debate sobre a eficácia das medidas atípicas deve considerar, de forma equilibrada, tanto os direitos dos credores quanto a proteção dos direitos fundamentais dos devedores. Tal abordagem é essencial para a construção de um sistema de execuções mais justo e efetivo, capaz de lidar com a complexidade das relações nas obrigações de crédito contemporâneas.

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