Assédio moral na administração pública: breve análise doutrinária e jurisprudencial
28 de dezembro de 2024, 9h13
O assédio moral no ambiente de trabalho é uma prática que tem recebido crescente atenção no campo jurídico, dada a sua relevância social e os impactos negativos que provocam na saúde dos trabalhadores e na eficiência organizacional. Na administração pública, o problema assume contornos específicos, uma vez que o vínculo funcional e a rigidez hierárquica podem agravar a situação de vulnerabilidade das vítimas.
Segundo Hirigoyen (2002), o assédio moral é caracterizado pela repetição de atos humilhantes ou constrangedores no ambiente de trabalho, afetando a dignidade e a integridade psicológica do trabalhador. No contexto da administração pública, a prática pode comprometer os princípios constitucionais da legalidade, moralidade e eficiência, previstos no artigo 37 da Constituição.
Este breve artigo tem como objetivo explorar os aspectos conceituais, doutrinários e jurisprudenciais do assédio moral na administração pública, apresentando potenciais soluções jurídicas para a sua mitigação.
Conceito e caracterização do assédio moral
O assédio moral é definido como uma conduta abusiva, repetitiva e prolongada, que tem por objetivo ou efeito degradar as condições de trabalho, atingindo a dignidade e a saúde do trabalhador (Hirigoyen, 2002). No âmbito da administração pública, essa prática pode manifestar-se de diferentes formas, como:
- Imposição de tarefas excessivas ou impossíveis;
- Restrição injustificada de atividades;
- Isolamento social do servidor;
- Uso abusivo do poder hierárquico para humilhar ou constranger.
Para Barros (2015), a identificação do assédio moral na administração pública requer a análise de três elementos fundamentais: a frequência da conduta, a intencionalidade do agente assediador e o impacto negativo na saúde física ou psicológica da vítima.
Fundamentos jurídicos
O combate ao assédio moral na administração pública está fundamentado em diversos dispositivos legais e princípios constitucionais. Destacam-se:
- Princípios constitucionais: A dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III) e os valores sociais do trabalho (artigo 1º, IV) são pilares para a proteção contra práticas abusivas.
- Legislação infraconstitucional: A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), apesar de ser aplicada principalmente ao setor privado, serve como parâmetro para a configuração de práticas abusivas no setor público.
- Normas específicas: Algumas legislações estaduais e municipais preveem sanções para casos de assédio moral no serviço público. Por exemplo, a Lei nº 12.250/2006, do Estado de São Paulo, dispõe sobre medidas de prevenção e punição ao assédio moral no âmbito estadual.
Doutrina e jurisprudência
A doutrina tem se debruçado sobre o tema do assédio moral no serviço público, destacando a necessidade de equilíbrio entre o poder hierárquico e o respeito à dignidade do servidor. Para Silva (2017), “o assédio moral na administração pública não é apenas uma afronta ao servidor, mas também um atentado contra a moralidade administrativa”.
Na jurisprudência, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e tribunais regionais têm reconhecido a prática de assédio moral e determinado reparações às vítimas. Destaca-se o seguinte julgado:
STJ, RMS 48.944/DF, relator ministro Herman Benjamin: “A prática reiterada de atos abusivos por superior hierárquico, capazes de humilhar servidor público, caracteriza assédio moral, ensejando reparação por danos morais.”
Essa decisão reforça a importância de uma postura ativa da administração pública na prevenção e punição do assédio moral, em consonância com os princípios constitucionais.
Efeitos do assédio moral
Os impactos do assédio moral são múltiplos, afetando tanto as vítimas quanto a organização pública. Entre os principais efeitos, destacam-se:
- Para a vítima: Danos psicológicos, como depressão e ansiedade; prejuízos físicos, como insônia e doenças psicossomáticas.
- Para a administração pública: Redução da produtividade, aumento do absenteísmo e comprometimento da imagem institucional.
Medidas de prevenção e combate
Para enfrentar o assédio moral na administração pública, é necessário adotar uma abordagem multidisciplinar, que inclua:
- Educação e sensibilização: Promoção de cursos e palestras sobre ética e relações interpessoais no serviço público.
- Canais de denúncia: Criação de ouvidorias e mecanismos de proteção para servidores que denunciem práticas abusivas.
- Normatização: Aprovação de leis específicas que tipifiquem e sancionem o assédio moral no serviço público.
Considerações finais
O assédio moral na administração pública representa um desafio complexo, que exige uma atuação integrada de legisladores, gestores públicos e operadores do direito. A construção de um ambiente de trabalho respeitoso e ético é essencial para assegurar a dignidade dos servidores e a eficiência da administração pública.
A partir da análise doutrinária e jurisprudencial, verifica-se que o ordenamento jurídico brasileiro dispõe de instrumentos relevantes para enfrentar o problema. No entanto, é indispensável avançar na conscientização e implementação de políticas efetivas para a prevenção e combate ao assédio moral.
Referências
BARROS, Alice Monteiro de. Assédio Moral no Ambiente de Trabalho. 3ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2015.
HIRIGOYEN, Marie-France. Assédio Moral: A Violência Perversa no Cotidiano. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37ª ed. São Paulo: Malheiros, 2017.
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