Alteração de objeto licitado, do planejamento à fase de disputa
28 de dezembro de 2024, 8h00
Contextualização
Este artigo analisa uma situação que tem desafiado gestores públicos e licitantes: as alterações significativas nas especificações técnicas do objeto licitado, entre as fases preparatória e externa da licitação, prejudicando a efetividade das contratações públicas.
Estudo Técnico Preliminar e sua relevância
O artigo 18 da Lei nº 14.133/2021 estabelece a fase preparatória como momento crucial do processo licitatório, com o Estudo Técnico Preliminar (ETP) evidenciando o problema a ser resolvido e a melhor solução disponível, considerando, entre outros, os aspectos técnicos e mercadológicos. Trata-se de um instrumento de governança pública e que deve contemplar a análise abrangente do mercado, com fornecedores potenciais, soluções existentes e estimativas preliminares de custos.
Levantamento de mercado x pesquisa de preços
O processo de formação de preços na nova lei apresenta uma característica dual: uma primeira análise, de mercado, ainda na fase do ETP, e uma pesquisa de preços, definitiva, para dar base ao valor estimado da contratação. Esta estrutura encontra respaldo no artigo 23. Enquanto a pesquisa realizada durante o ETP serve como balizador para análise de viabilidade econômica da contratação, a definitiva deve ser atual e considerar diversas fontes, formando o preço de referência para a fase competitiva da licitação, com coerência em relação a objeto e mercado.
Alterações subsequentes e a pergunta central
Quando modificações significativas ocorrem após a elaboração do ETP, surge um questionamento fundamental: as alterações ainda se harmonizam com o estudo inicial? A resposta a esta pergunta, que será apresentada nos tópicos seguintes, tem implicações profundas para a licitação.
Impacto nas condições concorrenciais e na isonomia
Modificações substanciais, após o planejamento inicial, podem tornar a disputa anticoncorrencial. Os potenciais competidores identificados no estudo preliminar podem não mais corresponder ao perfil do objeto modificado, violando-se os princípios da competitividade e da isonomia, do artigo 5º da Lei nº 14.133/21.
Na prática, a alteração substancial do objeto pode resultar em restrição indevida do universo de fornecedores, incompatibilidade entre preços estimados e realidade de mercado, comprometimento da viabilidade econômica e até eventual distorção nas exigências de qualificação técnica dos licitantes.
Riscos ao erário e à eficiência da contratação
A persistência em alterações significativas sem um “replanejamento” pode resultar em contratações economicamente desvantajosas ou inviáveis, com objetos que sejam, ao final, inadequados às necessidades da administração, disputas judiciais e administrativas, prejuízo ao ciclo de vida do objeto (pela falta de novos estudos após alterações substanciais de características), tudo isso prejudicando o objetivo do processo licitatório, que é de uma contratação com resultado mais vantajoso, nos termos do artigo 11, inciso I, da Lei nº 14.133/21.
Competição desigual
Quando o objeto original é afetado por expressivas mudanças, não são apenas as especificações técnicas que se alteram, como também os valores de mercado, condições de entrega e outros aspectos, além do que, a falta de atualização tende a criar uma competição desigual, na qual produtos de qualidade inferior competem com produtos superiores, mas submetidos ao mesmo teto máximo de preço irreal, o que, adicionalmente, viola o artigo 11, inciso II, da Lei nº 14.133/21, pois não haverá justa competição. Os licitantes, desde logo, alertam que há algo errado, pelo preço referencial muito baixo, até para se iniciar a disputa, sendo que isso enseja provocação formal, pedindo acesso aos documentos de base da pesquisa original, para se aferir qual a causa daquela distorção de preços. E é importante que o agente de contratação possa verificar o que teria ocorrido.
Boas práticas para a administração pública
Para evitar os problemas mencionados, a administração pública deve adotar, entre outras, boas práticas de revisar o Estudo Técnico Preliminar se houver alterações significativas no objeto, assegurando que aquelas mudanças estejam devidamente documentadas e justificadas; e atualizar pesquisas de mercado e de preços, para refletir as novas especificações e valores estimados compatíveis com o mercado.
Conclusões
A preservação da coerência entre planejamento e execução de licitação representa a garantia de uma contratação eficiente, segura e vantajosa para a administração pública. Alterações significativas no objeto licitado, que levem à sua descaracterização, demandam novo planejamento, assegurando a legitimidade do processo e o efetivo atendimento ao interesse público, prevenindo danos ao erário e colocando a contratação no rumo da eficiência e da efetividade.
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