Acordo de leniência com CGU e AGU contém avanço de ação judicial, decide STF
27 de dezembro de 2024, 13h50
O acordo de leniência anticorrupção que tenha tido a participação do ente público ao qual cabe o ajuizamento de demandas para responsabilização judicial impede o prosseguimento de uma nova ação sobre o mesmo fato.
Com esse entendimento, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal manteve, por maioria, um acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que havia extinto uma ação civil pública por improbidade administrativa contra a empreiteira OAS.
Acordo de leniência
O grupo econômico celebrou um acordo de leniência junto à Controladoria-Geral da União e à Advocacia-Geral da União para ressarcir danos que causou mediante atos fraudulentos investigados no âmbito da operação “lava jato”.
A Petrobras, contra a qual foram perpetrados os danos, contestou, no entanto, que o acordo não lhe promovia reparação integral e pediu o prosseguimento de uma ação civil pública por improbidade administrativa, por meio da qual pretendia ser efetivamente indenizada.
Em agravo regimental em sede de recurso extraordinário com agravo, a estatal argumentou que não integrou a elaboração do acordo de leniência e que os valores já ressarcidos por meio dele poderiam ser abatidos em eventual condenação no processo de improbidade.
Responsabilização na leniência
O relator do agravo, ministro Gilmar Mendes, destacou, ao iniciar o voto seguido pela maioria, que a Lei Anticorrupção (12.843/2013) instituiu um regime duplo de responsabilização das pessoas jurídicas em casos de corrupção: a administrativa e a judicial.
No campo da responsabilidade administrativa, explicou o ministro, cabe à CGU, no âmbito do Executivo federal, celebrar os acordos de leniência relativos a atos lesivos à administração pública. Quanto à responsabilização judicial, o ajuizamento de demandas a fim de promover reparação, o que tem natureza indenizatória, cabe ao órgão de advocacia do ente público e ao Ministério Público.
Gilmar escreveu ainda que, no âmbito do Poder Executivo Federal, já há normativa que prevê a celebração de acordo de maneira conjunta entre a CGU e a AGU, órgãos que titularizam a responsabilização administrativa e judicial, respectivamente.
Trata-se da portaria interministerial CGU/AGU 2.278/2016. O artigo 2ª dela prevê que a celebração conjunta dos acordos poderá abranger a atenuação de sanções previstas na Lei Anticorrupção, na Lei 8.666/1993 e ainda na própria Lei de Improbidade Administrativa.
“Em outras palavras, a cooperação entre CGU e AGU permitiu que os Acordos de Leniência Anticorrupção desdobrassem seus efeitos tanto no regime de responsabilidade administrativa da Lei 12.846/2013 quanto sobre os múltiplos regimes de responsabilidade judicial, que são titularizados pela AGU”, escreveu o ministro, segundo o qual a extinção da ação de improbidade pelo TRF-4 foi acertada.
“Acaso mantido o curso da ação, haveria inegável sobreposição fática entre os ilícitos admitidos pelas colaboradoras perante a CGU/AGU e o objeto de apuração pela via judicial. Se tal sobreposição fática não for considerada de forma harmônica, sobreleva-se o risco de determinada empresa ser apenada duas ou mais vezes pelo mesmo fato”, argumentou ainda o decano do Supremo.
Efetividade do sistema anticorrupção
Para Gilmar, a propositura de uma nova ação judicial mesmo após a celebração de acordo de leniência incorreria não apenas em bis in idem, mas também geraria riscos à própria efetividade do sistema anticorrupção.
“A lógica subjacente ao modelo de justiça negocial que se expande no mundo no combate à macrocriminalidade econômica é a de instituir um rígido regime de colaboração que obriga os signatários a trazer aos autos substrato probatório que permita o aprofundamento das investigações por parte do Estado. Em outras palavras, para além de um mero negócio jurídico bilateral, os Acordos de Leniência apresentam verdadeira natureza de meio de obtenção de prova”, acrescentou o relator do agravo.
Gilmar foi acompanhado pelos ministros Dias Toffoli, Nunes Marques e André Mendonça. Teve voto vencido o ministro Edson Fachin, presidente da 2ª Turma do STF, que defendia o prosseguimento da ação de improbidade administrativa, sob o entendimento de que o acordo de leniência celebrado pela CGU e AGU não foi capaz de reparar integralmente os danos causados pela OAS à Petrobras.
Atuaram na causa os sócios do Cal Garcia, Müller Martins Advogados.
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RE 1.426.295
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