Opinião

Prescrição na nova Lei 15.040, marco regulatório no direito securitário

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  • é especialista em Direito Corporativo e Compliance pós-graduada em Processo Civil e Direito Civil pela Escola Paulista de Direito graduada em Direito pela Universidade Católica de Santos sócia e advogada no escritório Pallotta Martins palestrante instrutora in company e autora de artigos e professora convidada para cursos e eventos.

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21 de dezembro de 2024, 11h20

A Lei 15.040/2024, que entrará em vigor em dezembro de 2025, trouxe significativas alterações no regime prescricional aplicado aos contratos de seguro, impactando diretamente tanto segurados quanto seguradoras.

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homem e mulher assinam contrato

Entre as principais mudanças, destaca-se o marco inicial para a contagem do prazo prescricional, o qual, embora permaneça em geral de um ano, passou a ter como termo inicial a data da ciência da recusa expressa e motivada da seguradora.

Atualmente, o prazo de um ano para o exercício da pretensão do segurado é contado, em regra, da data do sinistro. Essa interpretação gera inseguranças jurídicas, especialmente em casos em que o segurado demora a comunicar o evento à seguradora.

A nova legislação busca solucionar essa questão ao estabelecer que, ainda que o segurado não avise a seguradora de forma célere, o prazo se inicia na data em que o segurado toma ciência da recusa expressa e motivada da seguradora.

Importante ressaltar que não é qualquer tipo de recusa que enseja a contagem do prazo. A recusa deve ser expressa e motivada, um critério que já vinha sendo adotado em parte da jurisprudência, mas que agora foi consolidado em lei. Esse ponto é essencial para evitar interpretações ambíguas e garantir maior proteção aos segurados e seguradoras.

Comunicação do sinistro à seguradora

Apesar das mudanças, a lei reforça a necessidade de que o segurado comunique o sinistro à seguradora de forma tempestiva. A demora injustificada na comunicação pode gerar implicações no âmbito judicial, como reconhecido reiteradamente pelo Superior Tribunal de Justiça [1] através de decisões onde se fundamenta que cabe ao juiz analisar, caso a caso, se houve atraso doloso ou desarrazoado na comunicação.

Caso o segurado não informe o sinistro de forma tempestiva, a ausência de uma data clara para o início do prazo poderia gerar a ideia de pretensões imprescritíveis, algo que teria impacto negativo no provisionamento das seguradoras e, consequentemente, na estabilidade do mercado.

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Por oportuno, importante relembrar do princípio duty to mitigate the loss, cláusula geral do sistema jurídico que impõe aos indivíduos o dever de mitigar danos, inclusive o próprio prejuízo. Em outras palavras, os contratantes devem tomar as medidas necessárias e possíveis para que o dano não seja agravado, de forma que a parte a quem a perda aproveita não pode permanecer deliberadamente inerte diante do dano.

Outra inovação relevante trazida pela Lei 15.040/2024 é a previsão de suspensão do prazo prescricional.  De acordo com a nova lei, a suspensão ocorre uma única vez, quando a seguradora recebe um pedido de reconsideração da recusa. Esse prazo permanece suspenso até o momento em que o segurado é cientificado da decisão final da seguradora.

Diante desta alteração, a vigência da Súmula 229 STJ deve ser enfrentada, pois este preceito prevê que “o pedido do pagamento de indenização à seguradora suspende o prazo de prescrição até que o segurado tenha ciência da decisão”.

Prazo prescricional em nova lei

No que tange às pretensões dos beneficiários ou terceiros prejudicados, a nova lei manteve o prazo prescricional de três anos, contado da ciência do fato gerador. Entretanto, ao contrário do prazo para o segurado, que se inicia a partir da recusa expressa e motivada, a lei não faz referência específica à recusa nesse caso. Isso pode gerar debates futuros sobre a aplicação do conceito de “fato gerador” nesses contextos.

Ademais, o inciso II, do parágrafo 1º do artigo 206 do Código Civil será revogado pela nova legislação quando do início de sua vigência, enquanto o inciso IV, do parágrafo 3º do artigo 206 do CC, que prevê o prazo de três anos para pretensões de beneficiários e terceiro prejudicado contra seguradoras em seguros de responsabilidade civil obrigatória, permanecerá vigente. Essa diferença pode gerar discussões jurisprudenciais acerca da interpretação e aplicação da nova lei.

A lei também unificou o prazo prescricional de um ano para outras pretensões relacionadas a seguros, incluindo:

Pretensões da seguradora contra o segurado ou estipulante para cobrança de prêmios;
Pretensões de intervenientes (corretores, agentes ou representantes de seguro) para cobrança de suas remunerações;
Pretensões entre cosseguradoras;
Pretensões entre seguradoras, resseguradoras e retrocessionárias.

Embora o prazo seja de um ano, a lei não detalha o marco inicial para essas situações. A definição desse termo inicial será crucial para evitar litígios e assegurar a segurança jurídica.

Limite de tempo para relatar sinistro

Por fim, acredita-se que tende a permanecer a discussão jurisprudencial sobre o limite de tempo para relatar o sinistro à seguradora diante da expressão “prontamente” sem que, contudo, um limite temporal seja estabelecido. Logo, até que o assunto seja pacificado em jurisprudência ou regulado por lei, importante observar o prazo previsto contratualmente. De todo modo, nos termos do artigo 205 CC, nenhuma pretensão pode superar 10 anos para seu exercício.

A Lei 15.040/2024 representa um marco regulatório no direito securitário brasileiro, unificando e ajustando os prazos prescricionais para melhor atender à dinâmica das relações entre segurados e seguradoras. Apesar das inovações, alguns pontos ainda suscitam debates, a exemplo do relatado acima, acerca do aviso do sinistro, bem como a interpretação do “fato gerador” em determinadas pretensões e a aplicação residual de dispositivos não revogados do Código Civil.

A prática jurídica e a jurisprudência desempenharão papel fundamental na consolidação dessas normas, promovendo maior segurança jurídica e estabilidade no setor de seguros.

 


[1] REsp n. 1.546.178/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 13/9/2016, DJe de 19/9/2016

Autores

  • é advogada e associada no escritório Porto Lauand, MBA em Direito Corporativo e Compliance, pós-graduada em Processo Civil e Direito Civil pela Escola Paulista de Direito e graduada em Direito pela Universidade Católica de Santos, associada.

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