Suprema Corte dos EUA rejeita recurso contra decisão de tribunal do Havaí sobre porte e posse de armas
12 de dezembro de 2024, 10h31
A Suprema Corte dos EUA negou um pedido de certiorari para julgar um recurso contra decisão do Tribunal Superior do Havaí que trombou de frente com um precedente da própria corte – e, alegadamente, com o dispositivo da Segunda Emenda da Constituição que dispõe sobre posse e porte de armas no país.
O precedente foi estabelecido na decisão de New York State Rifle & Pistol Association v. Bruen de 2022. Nessa decisão histórica, a Suprema Corte reconheceu, pela primeira vez, o direito de um cidadão de portar uma arma em lugares públicos para defesa pessoal, revogando uma lei estadual que requeria uma licença justificada para fazê-lo.
A Segunda Emenda, por sua vez, estabelece: “Sendo uma milícia bem regulamentada necessária para a segurança de um estado livre, o direito dos cidadãos de possuir e portar armas não deve ser violado”.
Foi nesses fundamentos que Christopher Wilson sustentou seu pedido de recurso à Suprema Corte (em Christopher L. Wilson v. Hawaii) contra a decisão do Tribunal Superior do Havaí que manteve a legalidade de uma ordem de prisão contra ele, por porte ilegal de arma. Wilson foi pego em uma propriedade rural alheia com uma arma carregada na cintura, em violação à lei estadual que exige registro da arma, bem como licença para portá-la em lugares públicos. A lei permite apenas manter uma arma em casa.
A Segunda Emenda não se refere ao direito de portar armas ocultas em lugares públicos nem à constitucionalidade de leis federais ou estaduais que regulamentam a compra, posse e porte de armas. A expansão do uso de armas decorreu, portanto, da interpretação da emenda pelos seis ministros conservadores da corte.
Espírito de Aloha
Mas os ministros da mais alta corte do Havaí têm outras ideias e teses, mais fundamentadas na Constituição do Havaí (que, para eles, tem precedência sobre a Constituição federal) e mais alinhadas ao “espírito de Aloha”.
Sobre o precedente, o tribunal do Havaí declarou: a Suprema Corte decidiu que a Segunda Emenda protege o direito de um indivíduo de possuir e portar armas, incluindo em público; mas a Constituição do Havaí não reconhece esse direito, apesar de ter um dispositivo bem parecido com o da Segunda Emenda.
O tribunal sustentou sua decisão em três pilares: 1) a corte discorda da interpretação da Suprema Corte sobre o porte de arma; 2) com base nos princípios do federalismo, a Constituição estadual prevalece sobre a federal; 3) a corte honra o “espírito de Aloha” na interpretação das leis — e, é claro, esse é um fundamento excepcional.
“No Havaí, o espírito de Aloha inspira a interpretação constitucional. Quando esta corte exerce o poder em benefício da população e no cumprimento de suas responsabilidades, obrigações e serviços ao povo, nós podemos contemplar e afirmar a força da vida e considerar o espírito da Aloha”, diz a decisão do caso State of Hawaiʻi vs. Christopher L. Wilson,
(A palavra “Aloha”, bem conhecida como um cumprimento em encontros e despedidas dos havaianos, sintetiza os sentimentos de amor, afeição, paz, compaixão, clemência, bondade, gentileza e amabilidade, bem como a coordenação entre a mente e o coração, dizem os pesquisadores).
“O espírito de Aloha não combina com o estilo de vida idealizado pelas instituições federais, que permitem ao cidadão andar por aí com armas mortíferas durante suas atividades cotidianas. A história das Ilhas Havaianas não inclui uma sociedade em que pessoas armadas circulam pela comunidade, com a intenção de combater os objetivos mortais dos outros”, escreveu o relator da decisão unânime, ministro Todd Eddins.
“O livre direito de portar armas em público degrada outros direitos constitucionais. O direito à vida, à liberdade e à busca da felicidade abrange o direito de circular livremente, com segurança, paz e tranquilidade. Leis que regulam o uso de armas em público preservam a liberdade e promovem esses direitos”, diz a decisão do tribunal.
O Havaí tem uma das leis de controle de armas mais rigorosas do país. E, por isso mesmo, a segunda menor taxa de mortes por armas de fogo, de acordo com a instituição Centers for Disease Control (a menor taxa é de Massachusetts).
O caso, agora, volta para um fórum criminal que deverá julgar Wilson por porte ilegal de arma.
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