SOBERANIA DOS VEREDICTOS

Júri absolve por clemência autor de suposta vingança e TJ-MG mantém decisão

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12 de dezembro de 2024, 8h19

A absolvição pelo crime de homicídio cometido por suposta vingança não é manifestamente contrária às provas dos autos se os jurados decidirem inocentar o réu por clemência e essa tese for sustentada pela defesa no plenário do júri. Com essa conclusão, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais negou provimento ao recurso de apelação do Ministério Público contra decisão do júri que absolveu um homem por matar outro a golpes de facão.

homem segurando faca / esfaqueamento

O homem matou a facadas o padrasto de sua mulher, que supostamente havia abusado das enteadas

“Não se discute aqui, diga-se, o acerto ou não da decisão, e sim a existência de lastro probatório mínimo nos autos, relacionado à versão vencedora quando da votação dos quesitos”, observou o juiz convocado Mauro Riuji Yamane, relator da apelação.

O crime ocorreu em novembro de 2022 e o réu o confessou. Ele alegou que ficou “fora de si” quando a sua mulher lhe confidenciou que ela e a irmã, ainda crianças, entre 2003 e 2007, foram vítimas de abusos sexuais cometidos pelo então padrasto. Diante dessa revelação, o acusado contou que se dirigiu à frente da casa do ex-padrasto da mulher e o atacou quando ele chegava ao local de bicicleta. Atingida na cabeça, no tórax, no abdômen, nos braços e nas pernas, a vítima faleceu no local.

O réu fugiu, sendo posteriormente identificado pela polícia e denunciado. Para o MP, o homicídio foi qualificado pelo motivo torpe, devido à vingança, pela crueldade e pelo emprego de recurso que impossibilitou a defesa da vítima.

Diante da vingança admitida pelo réu por estupros que sequer ficaram comprovados, porque as supostas vítimas nunca haviam acusado o padrasto, o MP sustentou no recurso ser a tese defensiva de clemência manifestamente contrária à prova dos autos. Porém, para o relator, “a decisão não pode ser considerada contraditória, ou esdrúxula, considerando que a defesa, em plenário, sustentou o seu pleito de clemência, amparado no suposto crime praticado pela vítima em detrimento da esposa do acusado”.

Os desembargadores José Luiz de Moura Faleiros e Alberto Deodato Neto acompanharam Yamane. O colegiado destacou ser muito estreita a possibilidade de cassação do veredicto popular por manifesta contrariedade à prova dos autos.

Conforme o acórdão, é proibido ao juiz togado invadir a competência privativa do tribunal do júri, cuja soberania decorre de princípio constitucional, exceto se a decisão dos jurados for absurda, escandalosa, arbitrária e totalmente divorciada das provas.

A decisão da 1ª Câmara Criminal do TJ-MG também citou que a possibilidade de absolvição em quesito genérico por clemência tem elevado grau de abstração e subjetividade, até porque a decisão dos jurados dispensa motivação. “Fala-se em democracia no júri por essa razão: a substituição do direito positivo a cargo do juiz pelo sentimento de justiça do júri popular”, finalizou o acórdão, reproduzindo esse ensinamento do jurista e professor Eugênio Pacelli de Oliveira.

Sem mais recursos

O acórdão transitará em julgado porque a Procuradoria de Justiça do MP-MG, com atuação nos tribunais superiores (PJTS), não recorrerá. Ela reconhece que a decisão do júri não foi manifestamente contrária à prova dos autos.

Segundo a assessoria especial da PJTS, a decisão dos jurados está embasada em uma “racionalidade mínima”, devido à vingança, não podendo se esquecer ainda da soberania dos veredictos prevista na Constituição Federal e do Tema 1.087 do Supremo Tribunal Federal.

Sob a relatoria do ministro Gilmar Mendes, no julgamento do recurso extraordinário com agravo 1.225.185, com repercussão geral, o STF fixou tese que pode ser aplicável ao caso sob exame, conforme a PJTS. Essa tese faz parte do Tema 1.087. Segundo ela, o tribunal de apelação não determinará novo júri quando tiver ocorrido a apresentação, constante em ata, de pedido tendente à clemência ao acusado e os jurados o acolherem.

A única ressalva do tema é a de que a tese da defesa tenha compatibilidade com a Constituição Federal, com os precedentes vinculantes do STF e com as circunstâncias fáticas apresentadas nos autos.

Processo 1.0000.24.269712-6/001

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