A liberdade de opinião jurídica do advogado e a repulsa ao 'crime de hermenêutica'
4 de dezembro de 2024, 7h09
Será lícito punir um advogado (ou qualquer outro operador do Direito) por haver mal interpretado um estatuto normativo, seja ele constitucional ou legal?
Não me parece correto punir, tanto no plano administrativo-disciplinar quanto na esfera penal, o profissional do Direito que haja eventualmente incidido em erro (grosseiro ou não) na exegese de qualquer espécie normativa, sob pena de se criar um novo (e absurdo) tipo penal definidor da esdrúxula e inconstitucional figura do denominado “crime de hermenêutica”!
Ruy Barbosa , em “cause célèbre” por ele submetida em 1896 ao exame do STF, conseguiu que a Corte Suprema absolvesse o juiz gaúcho Alcides de Mendonça Lima , da comarca de Rio Grande (RS), absurdamente acusado de “erro de interpretação” do Direito e de rebeldia jurisdicional em face de sua frontal discordância com o entendimento sustentado e desejado por Júlio de Castilhos, então presidente do estado do Rio Grande do Sul!
Nenhum advogado (ou profissional do Direito) pode ser punido em razão de opiniões jurídicas por ele pronunciadas que reflitam as suas convicções pessoais ou a sua visão doutrinária do tema em discussão , sob pena de afronta aos princípios constitucionais da independência do advogado e de sua consequente liberdade intelectual!
Esse entendimento — de veemente repulsa ao anômalo “crime de hermenêutica” — registrou-se em histórico precedente absolutório do Supremo Tribunal Federal , firmado em 1897, no julgamento plenário do “recurso de revisão criminal nº 215”, e no qual o Supremo Tribunal Federal repudiou, por incompatível com nosso modelo constitucional, a figura que Ruy Barbosa denominara “crime de hermenêutica”!
Em 07/10/1899, a Suprema Corte, reexaminando sua anterior decisão proferida em 1897, reafirmou o juízo absolutório proclamado em favor do magistrado gaúcho que havia sido condenado por “crime de responsabilidade” tipificado no Código Penal de 1890, o primeiro Código Penal da República!
Vê-se , daí que nem a história judiciária de nosso país nem a pena vigorosa e respeitável de Ruy Barbosa, patrono dos Advogados brasileiros (e do Senado), dão razão a quem pretenda punir o advogado em virtude da interpretação, ainda que equivocada, que ele tenha dado a um texto normativo.
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