Anuário da Justiça

A especialização dos órgãos judiciais em matéria empresarial

Autores

  • é sócio fundador do escritório Brigagão Duque Estrada – Advogados presidente nacional do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa) presidente honorário da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF) vice-presidente do Fórum Permanente de Direito Tributário da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro former member of the Executive Committee of The International Fiscal Association (IFA) membro do Conselho de Altos Estudos de Finanças e Tributação (Caeft) da Associação Comercial de São Paulo membro do Conselho de Administração da Câmara Britânica (Britcham) diretor da Federação das Câmaras de Comércio do Exterior (FCCE) e professor na pós-graduação de Direito Tributário da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

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  • é advogado do escritório Brigagão Duque Estrada Advogados mestrando do programa de pós-graduação em Direito Constitucional da Universidade Federal Fluminense e integrante do Núcleo de Pesquisa em Direito e Política dos EUA.

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2 de dezembro de 2024, 8h00

*Artigo publicado no Anuário da Justiça Direito Empresarial 2024, lançado na última semana, na Fiesp. A versão impressa está à venda na Livraria ConJur (clique aqui). Acesse a versão digital pelo site do Anuário da Justiça (anuario.conjur.com.br).

No ano de 2019, o Conselho Nacional de Justiça recomendou aos tribunais de Justiça do país que promovessem a especialização das suas respectivas varas, bem como criassem câmaras/turmas de segunda instância especializadas em Direito Empresarial.

Capa do Anuário da Justiça Direito Empresarial 2024

Em outras palavras, o CNJ opinou pela atribuição de competência temática aos órgãos de julgamento de primeira e segunda instâncias dos respectivos tribunais para que processassem e julgassem litígios que tivessem por objeto matérias afeitas ao Direito Empresarial (e.g., falência e recuperação judicial).

Os fundamentos para essa iniciativa foram: (i) a gravidade dos prejuízos decorrentes da “aplicação ineficaz das ferramentas legais do sistema de insolvência empresarial” (e.g., encerramento de empresas viáveis, extinção de empregos etc.); e (ii) a evidência científica de que “varas especializadas em recuperação empresarial e falência são significativamente mais eficientes (…) do que as varas de competência comum cumulativa”.

Parece-nos acertada a recomendação do CNJ. Quanto maior a autonomia epistemológica de determinado ramo do direito – refletida no direito positivo através de complexas leis especiais e esparsas que o diferenciam sobremaneira tanto em termos de direito material (e.g., Lei das Sociedades Anônimas) quanto no rito pelo qual seu processo respectivo se dará (e.g., Lei de Recuperação Judicial e Extrajudicial e de Falência) –, maior será a necessidade de especialização do Poder Judiciário para lidar com as demandas que lhe digam respeito.

Observe-se, entretanto, que a implementação da especialização acima mencionada, apesar de recomendada pelo CNJ há cerca de cinco anos, ainda apresenta margem para avanço. De fato, levantamento efetuado por este Anuário da Justiça indica que “são 16 os estados com varas especializadas no primeiro grau e cinco tribunais de Justiça com câmaras de Direito Empresarial em segundo grau”.

Tanto a literatura jurídica, quanto a prática forense são uníssonas em reconhecer os múltiplos benefícios que decorrem da especialização dos órgãos integrantes do Poder Judiciário, entre os quais, os ganhos na qualidade da prestação jurisdicional, no tempo de tramitação dos processos e na previsibilidade quanto às soluções que serão adotadas pelos(as) magistrados(as) incumbidos do julgamento das demandas ajuizadas.

Ocorre, entretanto, que o efetivo atingimento das melhorias acima referidas depende da cuidadosa e criteriosa implementação prática da especialização recomendada pelo CNJ.

Não se pode ignorar que a inadequada operacionalização da especialização nos tribunais pode gerar determinados efeitos colaterais que devem ser evitados (ou, ao menos, mitigados), tais como (i) o congestionamento dos órgãos especializados; (ii) a desmotivação dos(as) magistrados(as) integrantes desses órgãos; (iii) o engessamento da jurisdição prestada; e (iv) a proliferação de conflitos de competência.

Em relação ao aspecto destacado no item (i), acima, é imperativo que o tribunal identifique – através de levantamento interno, prévio à especialização – o número de ações e recursos periodicamente distribuídos às varas e câmaras de competência comum que tenham por objeto matérias compreendidas na especialidade que se pretende implementar. Esse mapeamento prévio permite que se estime de antemão o número de varas, câmaras e magistrados(as) necessários para que os órgãos especializados a serem criados possam absorver adequadamente a demanda do tribunal, sem, com isso, assoberbar os(as) julgadores(as) e inviabilizar a razoável duração do processo, que se revela como direito fundamental de todo e qualquer jurisdicionado.

No que se refere ao ponto endereçado no item (ii), acima, é de todo recomendável que as lideranças dos tribunais tenham a preocupação de tornar o exercício da atividade judicante em tais órgãos especializados atrativo para os(as) julgadores(as), eis que ela exige, como é o caso de toda especialização, maior esforço e aprendizado para lidar com matérias de alta complexidade.

Gustavo Brigagão, página 12 - Anuário Direito Empresarial 2024

Gustavo Brigagão, advogado e presidente nacional do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (CESA)

Os(as) magistrados(as) que compuserem esses órgãos especializados haverão de ter o interesse em se especializar nas matérias que venham a ser por eles julgadas. Garantir que o volume de trabalho seja adequado e valorizar a carreira daqueles que exerçam a desafiadora jurisdição especializada são medidas que têm o mérito de atrair maior número de magistrados interessados em seguir esse caminho.

Evita-se, assim, que determinado órgão de julgamento se concentre nas mãos de um(a) ou poucos(as) magistrados(as), cenário indesejável que não só representa dificuldades de ordem prática, mas também cria o risco de engessar e empobrecer a jurisdição em si.

Isso porque o dinamismo de matérias complexas exige elevada interação entre os profissionais envolvidos, de forma que a atuação conjunta de magistrados que possuam diferentes percepções tem o mérito de oxigenar e enriquecer o debate no âmbito da jurisdição especializada.

Por fim, a especialização somente se demonstrará exitosa caso a atribuição de competências aos órgãos julgadores seja exercida de forma adequada.

De fato, a demarcação das hipóteses que atrairão a competência dos órgãos especializados demanda detida reflexão, pois qualquer imprecisão ou dubiedade nessa delimitação traz consigo o risco do surgimento de conflitos de competência (seja ele verificado entre diferentes varas especializadas ou entre essas últimas e as varas comuns).

Marco Alexandre Gonçalves, página 12 - Anuário Direito Empresarial 2024

Marco Alexandre Gonçalves, advogado

Em outras palavras, é imprescindível que os temas de competência dos órgãos especializados de julgamento sejam elencados da forma mais específica possível, e que esse rol seja constantemente revisitado e aprimorado para dirimir eventuais conflitos de competência passíveis de materialização.

Conclui-se, assim, que a especialização e divisão das funções no Poder Judiciário são tendências positivas, que promovem maior eficiência e celeridade na prestação jurisdicional.

A especialização, contudo, deve ser realizada com cautela, de modo a evitar possíveis efeitos colaterais que venham a frustrar o desiderato que orientou a sua implementação.

Anuário da Justiça Direito Empresarial 2024
2ª edição
188 páginas
Editora Consultor Jurídico
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  • é presidente nacional do Cesa (Centro de Estudos das Sociedades de Advogados); presidente honorário da ABDF (Associação Brasileira de Direito Financeiro); vice-presidente do Fórum Permanente de Direito Tributário da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro; ex-membro do Executive Committee of The International Fiscal Association (IFA – 2017/18); membro do conselho de administração da Câmara Britânica (Britcham); diretor da Federação das Câmaras de Comércio do Exterior (FCCE); membro do Caeft (Conselho de Altos Estudos de Finanças e Tributação), da Associação Comercial de São Paulo; professor da Faculdade de Direito da Universidade Cândido Mendes (1993/2004); professor na pós-graduação de Direito Tributário da Fundação Getulio Vargas – FGV; sócio fundador do escritório Brigagão, Duque Estrada — Advogados.

  • é advogado do escritório Brigagão, Duque Estrada Advogados, mestrando do programa de pós-graduação em Direito Constitucional da Universidade Federal Fluminense e integrante do Núcleo de Pesquisa em Direito e Política dos EUA.

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