Opinião

Reconhecimento jurídico e implicações legais da paternidade socioafetiva

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  • é advogada do escritório Lara Martins Advogados responsável pelo núcleo de Direito de Família e Sucessões especialista em Direito das Famílias e Sucessões Planejamento Familiar Patrimonial e Sucessório e presidente da Comissão de Jurisprudência do IBDFam-GO.

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11 de agosto de 2024, 6h03

A paternidade socioafetiva é um conceito jurídico que reconhece a relação de pai ou mãe com um filho baseada no vínculo afetivo e social, em vez da ligação biológica. Essa forma de paternidade ocorre quando uma pessoa assume voluntariamente o papel de pai ou mãe na vida de uma criança, criando um laço de afeto, cuidado e convivência que se sustenta no tempo e é reconhecido pela sociedade e, eventualmente, pelo sistema jurídico.

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A principal diferença entre a paternidade socioafetiva e a biológica está na origem do vínculo. Na paternidade biológica, a relação é estabelecida através de uma conexão genética. Por outro lado, na paternidade socioafetiva, o vínculo é construído pelo afeto e pelo comportamento de cuidar, proteger e orientar a criança, independentemente de qualquer laço de sangue.

O reconhecimento da paternidade socioafetiva pode ter implicações legais, como direitos e deveres relacionados à guarda, convivência e sustento da criança, além de aspectos sucessórios. No Brasil, a jurisprudência e a legislação têm evoluído para reconhecer e proteger esses vínculos, sempre considerando o melhor interesse da criança.

O reconhecimento da paternidade socioafetiva pela Justiça envolve a consideração de diversos critérios, com o objetivo de garantir que o vínculo seja genuíno e no melhor interesse da criança.

Principais critérios

– Relação de afetividade duradoura e estável: deve haver uma convivência contínua e significativa entre o pai/mãe socioafetivo(a) e a criança. Essa convivência precisa ser baseada em afeto, cuidado e respeito, demonstrando um vínculo emocional consolidado ao longo do tempo;
– Manifestação pública do vínculo: a relação deve ser publicamente reconhecida e aceita. A sociedade e a comunidade devem reconhecer a pessoa como pai ou mãe da criança, demonstrado através de atos, comportamentos e a forma como a criança e o adulto são tratados no meio social;
– Intenção de assumir a parentalidade: a vontade clara e inequívoca de assumir as responsabilidades de pai ou mãe deve ser evidenciada. Isso inclui o desejo de cuidar, educar e proteger a criança, assumindo todas as responsabilidades legais e morais associadas à parentalidade;
– Melhor interesse da criança: o reconhecimento da paternidade socioafetiva deve sempre considerar o melhor interesse da criança. Isso significa avaliar se o vínculo socioafetivo é benéfico para o desenvolvimento emocional, psicológico e social da criança, assegurando-lhe estabilidade e segurança;
– Inexistência ou coexistência de vínculo biológico: o reconhecimento pode ocorrer tanto na ausência de um vínculo biológico estabelecido quanto em coexistência com um vínculo biológico, permitindo a multiparentalidade (biológica e socioafetiva).

Procedimento

O reconhecimento da paternidade socioafetiva no Brasil pode ser realizado pela via judicial ou extrajudicial. O procedimento administrativo (extrajudicial) é realizado em cartório. De acordo com o Provimento nº 63/2017 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), é possível reconhecer a paternidade ou maternidade socioafetiva diretamente em cartório de registro civil, sem a necessidade de processo judicial.

O procedimento é gratuito e pode ser solicitado por pessoas maiores de 18 anos, acompanhadas de duas testemunhas que atestem a relação de afetividade e convivência. Não deve haver conflito com um vínculo de filiação biológica já estabelecido.

Quando o reconhecimento não é viável em cartório, ou em caso de disputas, é necessário ingressar com a ação judicial de reconhecimento de paternidade socioafetiva. A ação pode ser proposta pelo pai/mãe socioafetivo(a), pelo menor representado por seu responsável legal ou pelo Ministério Público. O juiz avaliará provas como documentos, depoimentos de testemunhas e outros elementos que comprovem a existência de uma relação afetiva duradoura e estável.

Feito o reconhecimento, os pais socioafetivos terão os seguintes direitos e deveres:

Direitos
– Convivência e guarda: direito de conviver com a criança ou adolescente e solicitar a guarda compartilhada ou exclusiva;
– Participação nas decisões: direito de participar ativamente das decisões importantes na vida do filho;
– Direitos sucessórios: filhos socioafetivos têm os mesmos direitos sucessórios que os filhos biológicos;
– Proteção legal: direito de proteger a criança em situações legais.

Deveres
– Sustento: obrigação de prover o sustento do filho, incluindo alimentação, educação, saúde e outras necessidades básicas;
– Cuidado e educação: dever de cuidar e educar a criança.
– Proteção: responsabilidade de proteger a criança de qualquer forma de abuso, negligência ou perigo;
– Convivência: manter um relacionamento saudável e presente com a criança.

Os pais socioafetivos podem enfrentar desafios como resistência dos pais biológicos, desentendimentos familiares, dificuldade em comprovar o vínculo, burocracia administrativa, demora no processo judicial, e estigma social. Apesar disso, o reconhecimento da paternidade socioafetiva é uma conquista importante para assegurar o bem-estar e os direitos da criança.

Conflitos podem surgir quando há divergências sobre o reconhecimento de vínculos parentais ou disputas sobre direitos e deveres em relação à criança. A Justiça brasileira adota uma abordagem cuidadosa, sempre visando o melhor interesse da criança, avaliando o tempo de convivência, vínculo afetivo, e, em alguns casos, aceitando a multiparentalidade.

Considerações finais

O reconhecimento da paternidade socioafetiva é uma evolução importante na legislação brasileira, proporcionando segurança jurídica e emocional para as crianças, e assegurando que todos os vínculos afetivos e parentais sejam respeitados e protegidos.

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