Evento trágico

STJ condena organização de rali pela perda da chance de sobreviver a acidente

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29 de abril de 2024, 16h51

A conduta negligente da organização de uma prova de rali, que não enviou ambulância e equipe médica ao local de um acidente, configurou ato ilícito que causou a perda da chance de sobrevivência de um dos participantes e, sendo assim, gerou dever de indenizar.

Ambulâncias estavam disponíveis, mas não foram acionadas para o socorro

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça condenou a empresa organizadora de um rali a pagar R$ 30 mil à mulher de um dos competidores, que morreu em acidente durante a prova.

A vítima pilotava um carro que capotou e caiu em um rio com as rodas para cima, ficando submerso. O navegador conseguiu sair do veículo e, sem poder ajudar o companheiro, correu para buscar ajuda.

Um dos competidores parou para ajudar e outro avisou a organização sobre a ocorrência. E foram os próprios participantes quem desviraram o veículo acidentado e constataram a morte do motorista.

A organização tinha duas ambulâncias à sua disposição, mas elas não foram acionadas. Segundo a mulher da vítima, houve negligência em virtude da ausência de socorro, motivo suficiente para gerar a obrigação de pagar indenização.

As instâncias ordinárias, porém, negaram o pedido. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais concluiu que o envio de ambulâncias não faria diferença, pois o carro ficou submerso mais de 11 minutos, tempo máximo citado por perito para resistência em caso de afogamento.

Perda de uma chance

Por maioria de votos, a 3ª Turma do STJ entendeu que a indenização é devida por dois motivos, conforme o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi.

Primeiro, pelo dano moral causado em decorrência da omissão de socorro. O fato de os organizadores terem deixado de enviar ambulâncias ao local do acidente violou a legítima expectativa que existia de que, em uma prova de rali, haveria, no mínimo, uma tentativa de salvar a vítima.

Segundo, pela aplicação da teoria da perda de uma chance, segundo a qual o ato ilícito que tolhe de alguém a oportunidade de obter uma situação futura gera o dever de indenizar.

No caso, o ato ilícito foi a omissão de socorro, embora ambulâncias e equipe médica estivessem prontas para atuar. Uma delas estava na largada da prova, a 3,7 km do local do acidente, percurso que leva 4,6 minutos para ser completado.

“Desse modo, existia chance séria e concreta de que a recorrida, se tivesse enviado a ambulância ao local de forma imediata, teria conseguido promover o resgate em menos de 11 minutos e prestar assistência médica, aumentando significativamente as chances de sobrevida do marido da recorrente”, concluiu a relatora.

Chance zero

A posição da magistrada foi acompanhada pelos ministros Humberto Martins, Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze. Abriu a divergência e ficou vencido o ministro Moura Ribeiro.

Para ele, o julgamento acerca da probabilidade razoável de que o envio imediato da ambulância ao local do acidente pudesse contribuir para acelerar o resgate e aumentar as chances depende de análise de fatos e provas, medida vedada pela Súmula 7 do STJ.

Além disso, a teoria da perda de uma chance só deve ser aplicada se essa chance é real, plausível e séria. Em seu entendimento, não havia no caso certa probabilidade de que o dano poderia ter sido evitado.

“Apesar de ser sedutora a tese de que se o socorro fosse prestado pela equipe médica o resultado seria diferente, os fatos convencem do contrário. Isso porque o principal ato a ser praticado nessas situações, em que o carro caiu dentro de um rio com as rodas voltadas para cima, é exatamente desvirar o carro e retirar a vítima. Não foi, pois, ausência de ambulância no local do acidente”, concluiu o ministro.

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REsp 2.108.182

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