Moro, Deltan e Hardt agiram para desvio de R$ 2,5 bilhões, diz relatório
16 de abril de 2024, 12h54
No relatório de apoio à correição feita pelo Conselho Nacional de Justiça na 13ª Vara Federal de Curitiba, o delegado da Polícia Federal Élzio Vicente da Silva afirma que o ex-juiz Sergio Moro (União Brasil), hoje senador, o ex-procurador da República Deltan Dallagnol e a juíza federal Gabriela Hardt agiram em conluio para desviar R$ 2,5 bilhões dos valores oriundos da “lava jato” para criar uma fundação privada.
No período entre 2016 e 2019, diz o delegado no documento, Moro, Hardt e Dallagnol, além de outros procuradores da autodenominada “força-tarefa”, “atuaram para promover o desvio, por meio de um conjunto de atos comissivos e omissivos e com auxílio de agentes públicos americanos e dos gerentes da Petrobras Taísa Oliveira Maciel, Carlos Rafael Lima Macedo, e representantes da Petrobras não especificados, de R$ 2.567.756.592,009 destinados originalmente ao Estado brasileiro, para criação de uma fundação voltada ao atendimento a interesses privados”.
A pretensão dos procuradores e dos outros atores envolvidos caiu por terra após a Procuradoria-Geral da República — à época ocupada por Raquel Dodge — ajuizar ação de descumprimento de preceito fundamental perante o Supremo Tribunal Federal que suspendeu o acordo e, consequentemente, a fundação.
O delegado afirma no texto que o desvio se deu por meio de “atos omissivos e comissivos” ao permitir depósitos bilionários em contas judiciais vinculadas a réus colaboradores e empresas que firmaram acordos de leniência. Segundo Silva, foi permitido, de forma ilegal, que as autoridades dos Estados Unidos fizessem investigações no Brasil, tendo em vista que a Petrobras também passava por escrutinação naquele país.
O relatório é um documento complementar elaborado pela corregedoria-nacional de Justiça e é focado na abordagem dos fatos sob uma perspectiva criminal. Para elaborá-lo, foram colhidos depoimentos de Hardt (duas vezes), Eduardo Appio, Elias José Pudeulko, Fabiano Miyoshi Ezure, Flávia Cecilia Maceno Blanco, Gisele Becker, Ivanice Grosskopf, Carlos da Silva Fontes Filho, Deltan, Bruno Brandão e Vagner Silva dos Santos.
Nesta segunda-feira (15/4), em decisão monocrática do ministro Luis Felipe Salomão, corregedor-nacional de Justiça, o Conselho Nacional de Justiça determinou o afastamento de Hardt, do juiz federal Danilo Pereira Júnior e dos desembargadores Carlos Eduardo Thompson Flores e Loraci Flores de Lima, ambos do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, órgão recursal que analisava as mesmas ações em segunda instância. O julgamento no plenário do CNJ deve acontecer nesta terça (16/4). O relatório em questão trata apenas sobre o caso que envolve Hardt e Sergio Moro.
Argumento central
O documento alega que o principal indício de cometimento de crime se deu quando o ex-juiz Sergio Moro instaurou, de forma voluntária, um processo sigiloso que era restrito ao juízo, à “força-tarefa” e à Petrobras.
A abertura desta ação, diz o delegado, “foi feita especificamente para permitir o repasse não questionado de valores oriundos de acordos de colaboração e de leniência para a conta da Petrobras, alimentando a empresa com o dinheiro dos acordos, já cientes e conscientes os atores a respeito das apurações iniciadas pelos Estados Unidos em 2014 em face da empresa”.
Os participantes do acordo também tinham conhecimento das demandas dos acionistas minoritários da Petrobras e da investigação cível que tramitava no Ministério Público de São Paulo “com a intenção de promover o direcionamento de parte da multa que viria seria aplicada”.
De forma clandestina, os procuradores e o ex-juiz assumiram a posição de representantes do Estado brasileiro junto à petroleira e ao governo dos EUA, diz o relatório.
O delegado então contextualiza os movimentos dos tarefeiros e do ex-juiz, afirmando que suas condutas foram contraditórias e excessivamente proativas para promover a destinação dos recursos oriundos dos acordos de colaboração.
Moro, diz o texto, sabia desde 2015 que o MP-SP estava investigando o ressarcimento aos acionistas minoritários por conta da má-gestão na petroleira e também tinha conhecimento das apurações nos EUA.
Outro ponto que ajuda a delinear os crimes é a omissão em quantificar as perdas da Petrobras por conta das ações criminosas identificadas na “lava jato”. Até o momento, nem a empresa e nem as autoridades sabem dizer qual é o tamanho do prejuízo.
MPF e juízo, diz o texto, trataram a empresa de forma contraditória: “a) de um lado, cientes da existência de apurações em andamento nos EUA e no MP-SP e eleita ‘vítima para todos os fins’, a Petrobras recebia repasses de valores não questionados pelo juízo ou pelos titulares das contas judiciais; b) de outro, subjugaram a empresa, por meio de cooperação do MPF com as autoridades americanas, para que a Petrobras culminasse por assinar um acordo de assunção de compromissos que, em linhas gerais, promovia o retorno de valor superior ao que foi direcionado à companhia pelo juízo no bojo do citado processo, só que em atendimento a interesses privados.”
O relatório diz que, em oitiva, Deltan Dallagnol negou que tenha ocorrido negociação informal da “força-tarefa” com os norte-americanos, mas os documentos encontrados pela correição na 13ª Vara mostraram que essa interação aconteceu.
Silva cita que, nos processos em que há informações sobre a cooperação, existem “pedidos de auxílio realizados no interesse dos Estados Unidos da América em período posterior à já mencionada intercessão do então coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol, junto aos órgãos americanos, já buscando obter o retorno de parte da possível multa que viria a ser aplicada”.
Clique aqui para ler o relatório
Reclamação Disciplinar 0006135-52.2023.2.00.0000
*A íntegra do relatório foi incluída no texto em 28 de setembro de 2024.
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