Violações à competência da Justiça do Trabalho praticadas pelo STF
24 de novembro de 2023, 8h00
No último dia 13 de novembro, a OAB-SP e mais 63 entidades, dentre elas, associações de advogados, juízes e procuradores do trabalho, centrais sindicais e sindicatos, divulgaram uma carta pedindo ao STF (Supremo Tribunal Federal) respeito e observância ao artigo 114 da Constituição.
A “Carta em Defesa da Competência Constitucional da Justiça do Trabalho” [1] — que pode ser assinada por qualquer pessoa e já conta com mais de 2.000 assinaturas — manifesta a apreensão das entidades signatárias em face das violações à competência constitucional da Justiça do Trabalho e à enorme insegurança jurídica provocada pelas recentes decisões do STF.
![](https://www.conjur.com.br/wp-content/uploads/2023/01/fabiola-marques-tarja.jpeg)
De fato, as últimas decisões do STF em matéria trabalhista, bem como as declarações de alguns ministros, em veículos de comunicação, são situações inéditas e preocupantes para a estabilidade do direito do trabalho; equidade tributária; arrecadações previdenciárias e fiscais; livre concorrência; além de impactar nos direitos sociais garantidos constitucionalmente.
A imagem que o Supremo tem passado à sociedade brasileira da Justiça do Trabalho é equivocada e capaz de propiciar um ambiente hostil e de instabilidade jurídica.
Não é de hoje que a Justiça do Trabalho sofre ataques, ameaças de extinção, imputação de responsabilidade pelos percalços econômicos do país ou, a culpa pelos altos índices de desemprego e aumento de informalidade, por parte de setores do empresariado, do poder executivo ou, legislativo, a depender do poder político de plantão.
A responsabilidade por tais questões, entretanto, não é da Justiça do Trabalho, nem tampouco da legislação trabalhista (vide a reforma trabalhista de 2017, pela Lei nº 13.467, que prometeu criar mais de 6 milhões de empregos [2] e não cumpriu), mas sim da economia e da desigualdade na distribuição de renda.
Ademais, a Justiça do Trabalho tem por objetivo dirimir os conflitos decorrentes das relações de trabalho ao exercer jurisdição especializada e proteger os trabalhadores de eventuais violações de direitos.
Ocorre, como já afirmado em coluna anterior [3], que o STF vem cassando decisões trabalhistas que reconheceram a existência de vínculo empregatício decorrente da fraude na contratação de pessoa jurídica.
O fenômeno da terceirização, presente há décadas nas relações do trabalho, foi normatizado pela Lei n. 13.429/17 e referendado pelo STF, no Tema 725 de repercussão geral, que firmou o entendimento de que a terceirização dos serviços pode ocorrer, inclusive, quando se tratar da atividade-fim da empresa.
A situação está posta e, não há mais decisões proferidas na Justiça do Trabalho contrárias à possibilidade de terceirização de atividade-fim e ao Tema 725 do STF. Assim, as empresas que desejam optar pela transferência de suas atividades principais para terceiros, estão amplamente amparadas pela Lei e pela Justiça do Trabalho, não havendo mais polêmicas sobre o assunto.
É importante esclarecer que na terceirização existem três partes envolvidas na contratação: a cliente (empresa que contrata os serviços), também chamada de tomadora dos serviços; a terceirizada ou prestadora dos serviços, que é a empresa que fornece os serviços; e, o trabalhador, que é a pessoa contratada pela empresa terceirizada, mas presta serviços ao cliente.
Porém, algumas empresas, para não se verem forçadas ao cumprimento das obrigações trabalhistas e previdenciárias (como férias, 13º salário, recolhimento de FGTS e contribuições sociais), contratam o empregado como “pessoa jurídica”, mas, na prática, exigem a prestação de serviços pessoal e habitual, de forma subordinada e mediante o pagamento de salário.
Deste modo, mascaram a relação de emprego por meio da assinatura de um contrato de prestação de serviços, no qual o empregado é obrigado a constituir uma “pessoa jurídica”, receber seu salário mediante a apresentação de notas fiscais, para evidenciar existência da terceirização.
A contratação de um empregado travestido de pessoa jurídica é o que se costuma chamar de “pejotização”, já que o trabalhador, para conseguir o emprego, se submete às exigências do empregador.
E é contra esta fraude que a Justiça do Trabalho pode ser acionada em razão de sua competência para julgar e dirimir os conflitos decorrentes das relações de trabalho (inciso I do artigo 114, CF).
Ademais, o artigo 9º da CLT determina que todo ato praticado com o intuito de desvirtuar a legislação trabalhista é nulo. Assim, após a análise minuciosa do conjunto probatório, poderá o magistrado trabalhista se convencer da ocorrência de fraude e, consequentemente, declarar nula a relação jurídica firmada entre as partes para reconhecer a existência de vínculo empregatício.
Portanto, o que vem afligindo os operadores do direito são as decisões monocráticas dos ministros do STF que estão invalidando os julgamentos dos magistrados do trabalho, julgando as reclamatórias improcedentes e determinando a remessa de tais processos para a Justiça Comum, em total afronta ao inciso I do artigo 114 da CF.
Diante de tais decisões, o trabalhador vítima de fraude está desamparado. Ainda que as provas apresentadas demonstrem cabalmente a existência de fraude e o direito ao vínculo empregatício, o cidadão tem seus direitos básicos violados.
Por fim, é urgente que a sociedade se una para que tais violações de direitos não ocorram, para que a Justiça do Trabalho seja respeitada e assim, garanta aos trabalhadores o respeito de seus direitos básicos.
[1] https://chng.it/25WYDhGzt6
[2] https://g1.globo.com/economia/noticia/nova-lei-trabalhista-vai-gerar-mais-de-6-milhoes-de-empregos-diz-meirelles.ghtml
[3] https://www.conjur.com.br/2023-set-01/reflexoes-trabalhistas-stf-analise-competencia-justica-trabalho/
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