Opinião

Índices, números ou realidade? O futuro do trabalho encontra-se xeque

Autores

  • Andressa Munaro Alves

    é doutoranda e mestre em Direito pela PUC-RS bolsista Capes. Especialista em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Escola Superior Verbo Jurídico Educacional. Professora na pós-graduação em Direito e Processo do Trabalho e da Pós-graduação em Direito Previdenciário da PUC-RS. Professora no Programa de Graduação em Direito nas Faculdades Integradas São Judas Tadeu. Advogada.

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  • Diego Sena Bello

    é doutorando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) bolsista Capes mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) especialista em Direito do Trabalho no Centro Universitário Ritter dos Reis (Uniritter) graduado em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) professor no Programa de Graduação em Direito no Ibgen pesquisador do Núcleo de Pesquisas CNPQ/PUC-RS Relações de Trabalho e Sindicalismo e advogado.

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15 de novembro de 2023, 9h22

Recentemente a imprensa divulgou números atualizados sobre a taxa da empregabilidade no Brasil. Os números, que são fruto de pesquisa realizada pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) [1], no âmago do Portal do Ministério do Trabalho e Emprego, anunciam [2] a retomada dos números dos postos de emprego em solo brasileiro.

O órgão, que é competente para elaboração de estudos, pesquisas e projetos atrelados ao mercado de trabalho em solo tupiniquim, acaba por refletir futuros — novos e possíveis — planos governamentais, a julgar porque a partir da seriedade de suas pesquisas, possibilita trilha de caminho bem pavimentado aos próximos passos de retomada ou alterações de rota, notoriamente porque pesquisa científica qualifica caminho para projeções futuras.

Marcos Santos/USP Imagens

O fato é que a ascensão dos números, embora seja motivo de felicidade, haja vista o longevo período turbulento enfrentado durante e pós-pandemia, impressiona. Não pelas profissões ditas “empregáveis”, mas por nenhuma delas ter ligação com a tecnologia, não de forma direta. Isso porque, por exemplo, a agropecuária que é um dos ofícios lá apontados em ascensão, já percebe a inserção da tecnológica nas suas linhas de produção, etc.

Ora, a Revolução Tecnológica ou Quarta Revolução Industrial, caracteriza-se pelo elevado caráter disruptivo, que gera impactos tanto no trabalho, quanto na economia e nas relações sociais, havendo, portanto, transformação em todas as áreas da vida [3]. Assim, como já mencionado por esses autores em suas pesquisas,[4] ciente desse impacto generalizado, é indiscutível que o trabalhador da era digital necessita apresentar, para se manter integrado nesse novo ambiente, novas habilidades e competências comportamentais — e tecnológicas.

Apesar disso, ainda causa estranheza que dos empregos em crescente elevação nenhum lança mão da tecnologia como propulsora primordial. E pior: nenhuma das profissões ali apontadas foca-se na pessoa do trabalhador, mas em sua empregabilidade. O problema é o carrossel de emoções econômicas e sociais existentes no país tropical, elemento que, não raras vezes, justifica o decrescimento imediato desses números no ano seguinte. É preciso ser otimista, mas também necessário olhar (no e pelo) humano na lida.

E se a pesquisa focasse na figura do trabalhador? O quanto os trabalhadores encontram-se qualificados para o trabalho em 2023/2024? A tecnologia pode auxiliar na mão de obra humana — em atividades repetitivas —, para que o sujeito que labora possa desempenhar atividades pessoalíssimas e ligado as suas próprias habilidades?

Para que possamos fugir do “xeque mate” da gangorra da empregabilidade, oportuno e coerente o investimento em trabalhabilidade, eis que a partir do momento que as pesquisas se voltam para qualificação da pessoa do trabalhador [5], não há mais que se preocupar em “estar nas profissões em crescimento“, mas estar qualificado para “estar” trabalhando, não necessariamente “estar” empregado, vez que emprego é espécie do gênero trabalho, não o revés.

Além disso, é preciso compreender que o trabalhador efetivamente qualificado para o exercício da profissão — aqui, não se fala em emprego, mas profissão lato sensu e entrega de resultado melhor para o tomador dos serviços, de forma a contribuir para atividade econômica que se encontra vinculado, proporciona qualidade do produto e o torna ao final mais competitivo no mercado globalizado. Considerando tal novo cenário, urgente atuação estatal.

Nesse aspecto, inconteste que a mudança de paradigma não dispensa a inafastável participação do Estado, seja através de políticas públicas fomentadoras de requalificação para o trabalho, seja através da conscientização profissional para manter-se na lida, pois pensar em qualidade do trabalho é, sem dúvidas, pensar em resultado econômico. Logo, a máquina gira na tríade trabalho — economia — Estado, e não se pode dissociar o trabalho do econômico, pois preciso é superar a dicotomia antes defendida por alguns entre capital e labor.

Desse modo, entende-se que estruturar ações estatais a partir de dados, como o ora objeto de análise, que se concentram no modelo da relação de emprego é pensar a curto prazo. Pacífico é que o trabalho humano vive estágio flutuante, e por isso tem-se a percepção de que o Estado precisa formatar suas políticas governamentais à luz da trabalhabilidade, desfazendo-se de uma análise, com a máxima vênia, simplória que comemora o simples aumento no número de vínculos empregatícios registrados no período.


[1] BRASIL. Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED). Portal do Fundo de Amparo ao Trabalhador. Ministério do Trabalho e Emprego. Disponível em: https://portalfat.mte.gov.br/programas-e-acoes-2/caged-3/. Acesso em 06 nov. 2023.

[2] BRASIL. NOVO CAGED. Caged: Brasil cria mais de 1 milhão de empregos formais no 1º semestre de 2023 Em junho, mercado formal gerou 157.198 empregos. Maior crescimento ocorreu no setor de Serviços, com um saldo de 76.420 postos formais no mês. Disponível em: https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/noticias-e-conteudo/2023/julho/caged-brasil-cria-mais-de-1-milhao-de-empregos-formais-no-1o-semestre-de-2023. Acesso em 06 nov. 2023.

[3] HOFFMAN-RIEM, Wolfgang. Teoria geral do direito digital: transformação digital: desafios para o direito. Rio de Janeiro: Forense, 2021. p. 01.

[4] STÜRMER, Gilberto; BELLO, Diego Sena. El derecho fundamental al Trabajo: retos em la era del constitucionalismo digital. In: BALAGUER CALLEJON FRANCISCO; INGO WOLFGANG SARLET. (Org.). Derechos fundamentales y democracia en el constitucionalismo digital. 1. ed. Madrid: Aranzadi, 2023, v. 1, p. 46.

[5] ALVES, Andressa Munaro. A Trabalhabilidade como direito social fundamental: O critério da ponderação como alternativa à sua realização. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2023.

Autores

  • é doutoranda e mestre em Direito pela PUC-RS, bolsista Capes. Especialista em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Escola Superior Verbo Jurídico Educacional. Professora na pós-graduação em Direito e Processo do Trabalho e da Pós-graduação em Direito Previdenciário da PUC-RS. Professora no Programa de Graduação em Direito nas Faculdades Integradas São Judas Tadeu. Advogada.

  • é doutorando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), bolsista Capes, mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), especialista em Direito do Trabalho no Centro Universitário Ritter dos Reis (Uniritter), graduado em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), professor no Programa de Graduação em Direito no Ibgen, pesquisador do Núcleo de Pesquisas CNPQ/PUC-RS Relações de Trabalho e Sindicalismo e advogado.

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