Eleição de mulheres não flexibiliza punição a partido por uso de laranjas, diz TSE
10 de novembro de 2023, 14h52
O fato de um partido político estimular a participação feminina nas eleições e apresentar bom desempenho de suas candidatas nas urnas não basta para flexibilizar a punição de cassação de toda a chapa se a legenda fizer uso de candidatas-laranja.
Essa conclusão é do Tribunal Superior Eleitoral, que nesta quinta-feira (9/11) decidiu cassar o registro de todos os filiados do PSD que concorreram a vagas na Câmara Municipal de Belém nas eleições de 2020.
O TSE reconheceu a fraude à cota de gênero praticada por duas candidatas que tiveram votação ínfima, não fizeram atos de campanha e não somaram gastos. Sem elas, a legenda não alcançou o percentual mínimo de 30% de mulheres concorrendo nas eleições proporcionais.
A condenação anula todos os votos de um dos partidos que tiveram melhor desempenho feminino nas urnas. A candidatura mais votada do PSD em Belém foi da vereadora Dona Neves, que agora perde o mandato. Ao todo, mulheres receberam 36,7% dos votos angariados pela legenda em Belém.
Relatora da matéria, a ministra Cármen Lúcia defendeu a não flexibilização da punição pelo TSE. “Não se pode fazer de conta que se está cumprindo a lei, porque lei não é aviso, sugestão e nem proposta. É uma norma para ser cumprida para que tenhamos um estado democrático”, afirmou ela.
Votaram com ela os ministros Benedito Gonçalves, André Ramos Tavares e Alexandre de Moraes.
Desistência tácita
O cenário em que uma fraude cometida por duas mulheres acaba por derrubar o bom desempenho de outras candidatas foi o que gerou discussão no TSE. A própria ocorrência do ilícito foi afastada pelo Tribunal Regional Eleitoral do Pará (TRE-PA), que viu desistência tática das duas acusadas.
Rayanne dos Santos, que é lutadora de MMA, abandonou a corrida eleitoral porque se lesionou e precisava se dedicar à recuperação, com o foco em novos combates. Já a candidata Zezinha precisou se dedicar a outra campanha, em uma chapa para direção de um sindicato.
Abriu a divergência o ministro Raul Araújo, para quem não era possível presumir a má-fé de ambas. Ele ainda defendeu que a Justiça Eleitoral analise o desempenho feminino dentro do partido para saber se ele, de fato, tentou se esquivar de incentivar as candidaturas de mulheres nas eleições.
No caso do PSD em Belém, o desempenho robusto de suas candidatas e a eleição de uma delas com a maior votação mostra que o espírito da lei foi respeitado, segundo ele. Assim, reconhecer a fraude à cota de gênero acabaria por seguir caminho oposto: reduzir ainda mais a representatividade das mulheres.
A posição foi acompanhada pelo ministro Kasiso Nunes Marques, que destacou a dificuldade de avaliar casos de desistência tática. “Entendo que, nesse caso, o fato, em que pese gravidade e necessidade de reprimenda, não agasalha a norma. Não há tipificação específica para isso.”
O ministro Floriano de Azevedo Marques ainda propôs uma solução intermediária: reconhecer a fraude à cota de gênero, mas modular a aplicação dos efeitos para impedir a derrubada de toda a chapa, e a consequente eleição de Dona Neves.
Fraude imune
A ministra Cármen Lúcia refutou a interpretação apresentada pela divergência. Para ela, o Judiciário não pode fazer concessões com ilícitos, sendo que a igualdade de gêneros na política deve ser alcançada seguindo a lei. “É assim que não se anda”, alertou.
O ministro André Ramos Tavares concordou ao afirmar que é preciso promover a mulher na política, mas não de qualquer jeito, nem com base em ilícitos eleitorais. “A eleição de uma mulher não pode significar uma imunização em relação a um contexto de fraude.”
Já o ministro Alexandre de Moraes, presidente da corte, apontou que a flexibilização teria o efeito de informar aos partidos que basta uma ou mais candidaturas femininas viáveis para justificar o uso de laranjas para preencher os 30% necessários. “Isso é muito perigoso, principalmente às vésperas das eleições municipais de 2024.”
AREsp 0600001-02.2021.6.14.0098
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