Opinião

Encerramento da locação residencial por iniciativa do locador

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3 de março de 2023, 13h13

Uma das dúvidas que podem pairar sobre a mente do morador de imóvel residencial alugado é a seguinte: o meu locador pode resolver encerrar o contrato de locação da noite para o dia sem qualquer justificativa?

A resposta imediata é "não". Isso porque, via de regra, o locador não poderá reaver o imóvel alugado antes do fim do prazo ajustado entre as partes (vide artigo 4º da Lei de Locações).

Por outro lado, é certo que a lei prevê algumas hipóteses em que o locador pode informar a sua intenção de que o locatário desocupe o seu imóvel com relativa brevidade.

Neste breve artigo, pretendemos esclarecer quais são essas principais hipóteses de encerramento, bem como os prazos previstos para a desocupação pelo locatário. Vamos a elas.

1) Prorrogação de contrato escrito com prazo igual ou superior a 30 meses.

Caso o contrato de locação seja escrito e tenha o prazo inicial igual ou superior a 30 meses, a lei prevê que, a princípio, este será encerrado automaticamente no referido prazo.

Porém, se o locatário continuar na posse do imóvel alugado após os 30 meses, por mais de 30 dias, sem oposição do locador, este mesmo contrato será considerado prorrogado por tempo indeterminado.

A partir de então (isto é, depois de passados os ditos 30 meses e mais de 30 dias), o locador poderá retomar o imóvel a qualquer tempo e sem necessidade de justificativa  o que se denomina "denúncia vazia"  bastando conceder o prazo de 30 dias para sua desocupação (vide artigo 46, §2º da Lei de Locações).

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), inclusive, já decidiu no sentido de que, neste caso, a notificação do locador concedendo o referido prazo de 30 dias para desocupação pelo locatário é indispensável até mesmo para o ajuizamento de ação de despejo por denúncia vazia. Isto é, antes de ajuizar a referida ação de despejo, o prazo de 30 dias deve ter sido regularmente concedido pelo locador (REsp nº 1.812.465  MG).

2) Contrato verbal ou escrito com vigência ininterrupta superior a cinco anos.

Agora imagine um contrato  verbal ou escrito  que tenha sido firmado por prazo inferior a 30 meses.

Neste caso, a Lei de Locações prevê que, findo o prazo contratual, a prorrogação será automática. Diferentemente da situação anterior, não se exigiria a permanência do locatário por mais de trinta dias após o prazo previsto, sem oposição do locador, para que o contrato passe a ter prazo indeterminado.

O cenário é basicamente este: ou o contrato de locação é firmado por pelo menos 30 meses, e somente será prorrogado com a anuência do locador, ou é firmado por prazo inferior a 30 meses e será prorrogado automaticamente após o implemento deste prazo.

(Caso o locador deseje evitar a prorrogação mencionada nos contratos com prazo inferior a 30 meses, terá de ficar atento a fim de notificar o locatário sobre a necessidade de desocupação do imóvel 30 dias antes do encerramento do prazo inicialmente previsto.)

Pois bem. Este contrato com prazo inferior a 30 meses, agora prorrogado por tempo indeterminado, poderá ser encerrado pelo locador somente quando a vigência ininterrupta da locação ultrapassar cinco anos (artigo 47, V, da Lei de Locações).

Vale lembrar que estamos tratando aqui das hipóteses de "denúncia vazia" do contrato pelo locador  isto é, retomada do imóvel sem necessidade de justificativa  e que existem outras situações em que o locador poderá reaver seu imóvel, antes do implemento da vigência dos referidos cinco anos, porém de forma justificada (vide artigo 47, I a IV, da Lei de Locações).

O STJ também já se pronunciou a respeito do referido prazo de cinco anos (REsp 1.511.978-BA), esclarecendo que este deve ser contado desde o início da relação contratual  e não apenas a partir da sua prorrogação.

3) Venda do imóvel locado sem cláusula de vigência averbada.

O terceiro e último caso que trataremos aqui se refere à alienação do imóvel. Na qualidade de novo proprietário, o adquirente do imóvel naturalmente substituirá o antigo locador.

(Não falaremos, neste artigo, sobre o direito de preferência do locatário para aquisição do imóvel, presumindo que este foi regularmente notificado para o exercício do referido direito, e que declinou).

Neste caso, a Lei de Locações prevê que, a princípio, o novo dono do imóvel poderá optar pela extinção do contrato de locação, desta vez concedendo o prazo de 90 dias para desocupação pelo locatário (artigo 8º da Lei de Locações). Vale dizer que o adquirente do imóvel terá um prazo  também de 90 dias, contados do registro da venda  para exercer o direito de notificar o locatário sobre a referida desocupação.

(Destaque-se que idêntico direito terá o promissário comprador e o promissário cessionário, em caráter irrevogável, com imissão na posse do imóvel e título registrado junto à matrícula).

Mas não será em todo caso que o adquirente de imóvel locado terá o direito de optar pela sua resilição.

A Lei prevê que o locatário estará protegido desta hipótese de extinção da locação, caso o contrato: 1) seja por prazo determinado; 2) contenha cláusula de vigência em caso de alienação; 3) esteja averbado junto à matrícula do imóvel. Os três requisitos são cumulativos (isto é, todos devem ser preenchidos). Vamos item por item.

Para que o locatário faça jus à proteção contra a denúncia imotivada do adquirente do imóvel, o contrato deve ter prazo determinado. Sendo assim, tal proteção não vale para os casos dos contratos prorrogados por tempo indeterminado, que mencionamos nos itens anteriores, e nem para aqueles já inicialmente firmados por prazo indeterminado.

Além disso, o contrato deve prever expressamente tal proteção  denominada pela lei de "cláusula de vigência em caso de alienação". Tal cláusula assegura que a locação permanecerá vigente mesmo em caso de alienação do imóvel. Sendo assim, ela representa uma exceção ao princípio da relatividade dos efeitos do contrato, segundo o qual este não produz efeitos senão entre as partes.

Contudo, isto não basta.

Considerando que terceiros não têm a obrigação  e por vezes, sequer a condição  de saber da existência e do conteúdo do contrato de locação vigente relativo ao imóvel que pretendem adquirir, é necessário que o contrato de locação esteja averbado junto à matrícula do imóvel.

Como dissemos, ausente qualquer dos três requisitos anteriores, o locatário não estará protegido da extinção do contrato pelo novo dono do imóvel.

Conclusão
Vistas as principais hipóteses de denúncia vazia do contrato de locação pelo locador, evidencia-se a relevância da própria formalização e conteúdo do contrato de locação escrito para a incidência de tais hipóteses.

Desta forma, é extremamente recomendável, tanto para o locador quanto para o locatário, que busquem uma assessoria jurídica contratual adequada no momento de firmarem uma relação de locação.

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