Direito da Insolvência

A nova disciplina do stay period e as alterações em razão do plano alternativo

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19 de junho de 2023, 22h24

As suspensões e proibição relativas às ações ou execuções de créditos sujeitos à recuperação judicial, como consequência do deferimento do seu processamento, estão disciplinadas nos incisos I, II e III do caput do artigo 6º da Lei nº 11.101/05 (LRF) e compõem o chamado stay period, cuja disciplina sofreu algumas alterações pela reforma ocorrida em 2020.

A Lei nº 14.112/20 alterou a redação do §4º do artigo 6º da LRF, positivando, em lei, entendimento que já era pacífico na jurisprudência quanto à possibilidade de prorrogação do prazo de suspensão do stay period. Da expressa impossibilidade de prorrogação do prazo de suspensão, de 180 dias, passou-se, com a reforma, a admitir a possibilidade de uma única prorrogação e por igual período.

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A nova redação trazida pela reforma alerta, ainda, que a prorrogação deve se dar em caráter excepcional e somente se o devedor não tiver concorrido com a superação do lapso temporal, de forma a evitar abusos, assegurando, desse modo, a manutenção de ambiente favorável à negociação e a efetividade da utilização do instituto da recuperação judicial.

A despeito de a nova regra prever de forma peremptória a possibilidade de uma única prorrogação do prazo de duração do stay period, as normas que disciplinam a apresentação de plano alternativo devem ser consideradas para melhor compreensão dessa questão. Neste artigo, designar-se-á o prazo total do artigo 6º, §4º, da LRF, ou seja, o período de 180 dias e sua prorrogação por mais 180 dias, como prazo ordinário do stay period.

O §4º-A, I, do artigo 6º da LRF estipula que o decurso do prazo contido no §4º do mesmo dispositivo legal — ou seja, o prazo ordinário do stay period — sem que tenha ocorrido a deliberação sobre o plano de recuperação judicial proposto pelo devedor resultará no surgimento aos credores da faculdade de apresentarem plano alternativo. Esclarece, ainda, que se essa faculdade não for exercida nos 30 dias subsequentes, a consequência será a não aplicação das suspensões e proibições previstas nos incisos I a III do caput do artigo 6º.

As implicações do disposto no artigo 6º, §4º-A, I, da LRF para a duração do prazo do stay period são interessantes. Isso porque quando o referido dispositivo assegura que as suspensões e proibições dos incisos I a III do caput do artigo 6º não serão aplicáveis se os credores não apresentarem o plano alternativo em 30 dias, infere-se, por conclusão lógica, que as referidas suspensões e proibição persistirão até que esse fato se configure.

Logo, parece ser razoável concluir que não havendo a deliberação do plano de recuperação judicial no prazo ordinário do stay period, este último estará sujeito a uma outra hipótese de prorrogação, com fundamento legal, por período adicional de 30 dias. Essa hipótese de prorrogação extraordinária do stay period se dá diante da mera possibilidade de apresentação de plano alternativo pelos credores, independentemente da sua efetiva apresentação. Nesse cenário, portanto, em que não houve deliberação do plano do devedor no prazo do artigo 6º, §4º, da LRF, nem apresentação do plano alternativo dos credores nos 30 dias subsequentes, o prazo total do stay period será de 390 dias. Essa parece ser a consequência que se infere do quanto previsto no artigo 6º, §4º-A, I, da LRF.

Na hipótese, contudo, em que houver a apresentação do plano alternativo pelos credores nos 30 dias subsequentes ao término do prazo ordinário do stay period, haverá outra hipótese de sua prorrogação extraordinária. Nessa situação, dispõe o artigo 6º, §4º-A, II, que as suspensões e proibições previstas nos incisos I a III do artigo 6º da LRF perdurarão por mais 180 dias, contados do término do prazo ordinário do stay period. Nesse cenário, o prazo total do stay period será de 540 dias. Essa parece ser a consequência que se infere do quanto previsto no artigo 6º, §4º-A, II, da LRF.

A análise das disposições legais relativas à apresentação de plano alternativo acima realizadas parecem conduzir à conclusão de que a aplicação do prazo ordinário do stay period somente se verificaria para as hipóteses em que houver deliberação a respeito do plano de recuperação apresentado pelo devedor dentro desse espaço de tempo.

Contudo, mesmo para as hipóteses em que houver a deliberação do plano do credor dentro do prazo ordinário do stay period, a legislação passou a prever outras hipóteses legais para sua prorrogação, as quais também decorrem da possibilidade de apresentação do plano alternativo pelos credores.

Conforme se depreende do disposto no artigo 56, §4º, da LRF, após rejeição do plano de recuperação apresentado pelo devedor, os credores, em assembleia, deliberarão sobre a concessão de prazo de 30 dias para que haja apresentação de plano alternativo. Nessa situação, dispõe o artigo 6º, §4º-A, I, da LRF que as suspensões e proibições dos incisos I a III do caput do artigo 6º não serão aplicáveis caso os credores não apresentem o plano alternativo dentro de 30 dias contados da data dessa assembleia. Também nesse caso, parece ser decorrência lógica do quanto disposto em lei que houve criação de nova hipótese de prorrogação extraordinária do stay period, pelo prazo adicional de 30 dias. Isso porque somente após o decurso desse prazo de 30 dias concedido em assembleia de credores, será possível deixar de aplicar as suspensões e proibição previstas nos incisos I a III do caput do artigo 6º da LRF.

Por fim, caso haja a apresentação de plano alternativo pelos credores, o artigo 6º, §4º-A, II, da LRF dispõe que as suspensões e a proibição dos incisos I a III do artigo 6º do mesmo diploma normativo perdurarão por mais 180 dias.

Interessante observar que o termo inicial da contagem do prazo de 180 dias estipulado no artigo 6º, §4º-II, da LRF corresponde à data da assembleia geral de credores em que se houver deliberado a concessão de prazo para apresentação de plano alternativo. O início do termo inicial da contagem desse novo prazo coincidindo com a data da assembleia pode resultar em situações distintas. Mostra-se possível que, por ocasião da assembleia geral de credores, o prazo ordinário do stay period ainda não tenha se encerrado, de modo que, independentemente do tempo que lhe restasse, a sua duração seria automaticamente ampliada para 180 dias. Por outro lado, também parece ser possível que, por ocasião dessa assembleia, o prazo ordinário do stay period já tenha se encerrado, de forma que, como consequência da aplicação do artigo 6º, §4º-A, II, da LRF, haverá a criação de novo período de vigência das suspensões e proibições contidas nos incisos I a III do caput do artigo 6º da LRF, nesse caso com solução de continuidade em relação ao primeiro período.

A breve reflexão proposta nesse artigo, fundada na análise das alterações trazidas pela reforma de 2020 à disciplina dos §§4º e 4º-A do artigo 6º e do §4º do artigo 56, todos da LRF, parece sugerir para um aumento da complexidade da disciplina do stay period. Isso porque, conforme aventado acima, foi possível identificar novas hipóteses ordinária e extraordinárias de sua prorrogação, o que, certamente, será necessário atentar sobretudo no tocante à disciplina da relação da recuperanda com credores titulares de créditos não sujeitos.

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