Opinião

Dano moral e sua valoração, frente à procedência parcial e à condenação em sucumbência

Autor

  • Fernando César Delfino da Silva

    é advogado professor universitário pós-graduado em Direito Tributário com formação para o Magistério Superior em Direito Empresarial pela Universidade Anhanguera (Uniderp) e mestre em Direito pelo Centro Universitário Eurípedes de Marília (Univem).

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22 de janeiro de 2023, 10h16

As questões de direito material devem ser compreendidas e interpretadas segundo o acontecimento e a congruência da norma direcionada para a resolução do conflito.

Nesse sentido, aqueles que litigam em juízo e buscam, por meio do devido processo legal, o recebimento de indenização por dano moral, devem informar ao Estado-Juiz o valor pretendido, ou seja, deve-se valorar a pretensão que se caracteriza como consequência do pedido de dano moral, assumindo o caráter indenizatório.

Sendo assim, a parte submetida ao dano moral reporta a situação que servirá de base para o pedido subjetivo, buscando valorá-lo.

Pois bem, a subjetividade do pedido de dano moral impõe ao advogado a análise quantitativa de qual seria o valor adequado para recompor ou compensar aquele abalo moral vivenciado pela pessoa, física ou jurídica.

Nesse aspecto, podemos entender que esse valor não está diretamente vinculado à vontade da pessoa, mas a fatores subjetivos de entendimento do Estado-Juiz, que atribuirá o valor do dano moral de acordo com o caso concreto, diferenciando-o a cada caso e a cada pessoa, física ou jurídica, atendendo ainda para questões de não enriquecimento e empobrecimento, mas sim como medida de caráter punitivo e educativo, objetivando que a parte condenada ao pagamento de indenização deixe de praticar os atos pelos quais foi condenada.

A jurisprudência é pacífica no sentido de reconhecer o direito à indenização por danos morais tanto à pessoa física como à pessoa jurídica.

Assim, questões processuais, impositivas, que obrigam o autor da ação a atribuir valor ao pedido de indenização por danos morais — limitando a atuação do magistrado, que se acha vinculado aos pedidos realizados pelo autor da ação —, demonstram que ao juiz cabe o julgamento do pedido dos danos morais (procedente ou improcedente), e o arbitramento do valor, limitado ao pedido inicial.

Valor da causa
Valorar a causa posta à apreciação do Estado-Juiz é o ato de precificar o custo da tutela jurisdicional para aquele determinado caso, o que indicará,o limite da ação e parâmetros para recolher, aos cofres públicos, as custas necessárias para a apreciação e julgamento do seu pedido.

Não haveria outra forma para o Estado precificar o custo da movimentação da máquina estatal, se não fosse por meio do valor atribuído à causa, de modo que coloca em efetivo exercício o princípio da isonomia, em que o custo estatal se amolda ao caso concreto.

Daí a obrigatoriedade de se atribuir valor à causa, que nem sempre guarda relação com o benefício pretendido e, quando guarda essa relação, se faz submetido ao livre convencimento do juiz, que, de acordo com a instrução processual, pode julgar o processo nos termos dos Artigos 485 ou 487 do CPC/2015.

Dessa forma, os valores pretendidos no processo funcionam como qualificadores do quantum vinculado ao pedido, de modo que podem se traduzir em julgamento procedente, improcedente ou parcialmente procedente e, este último, em específico, não se aplica quando do julgamento do pedido de dano moral.

Pois bem, o artigo 291 do CPC/2015 assim prevê: "A toda causa será atribuído valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico imediatamente aferível".

Nota-se que o comando normativo é impositivo, ou seja, todas as ações propostas devem indicar, ao seu final, um valor de causa, para que, sobre esse valor, possa ser atribuído o valor das custas processuais a ser recolhida.

O inciso V do artigo 292, do CPC/2015 trouxe, nos casos de ações indenizatórias, a obrigatoriedade da indicação do valor pretendido: "na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido;".

Diante da previsão legal, insculpida no CPC/2015, o autor da ação tem a obrigação de indicar o valor pretendido para a indenização por dano moral requerida, sob pena de incorrer na necessidade de emendar a petição inicial ou ter o indeferimento da sua petição inicial, em razão do descumprimento de requisitos obrigatórios para a formação do processo.

Nesse exato momento, o autor se encontra submetido a regras processuais que não são de seu conhecimento e que precisam ser resolvidas antes da distribuição da ação. Tais regras se encontram em choque, uma vez que, ao mesmo tempo que delimitam o pedido do autor da ação, impõem a obrigatoriedade de ser informada para fins fiscais, dada a necessidade de recolher as custas processuais.

Por esse motivo tem-se, sob o núcleo processual, a pergunta inevitável. Qual o valor do dano moral?

Valor do dano moral
Qual a intensidade e quanto vale o dano moral para o ofendido? Será que o magistrado, na frieza dos autos, tem condições de quantificar esse valor ao ponto de garantir que o arbitramento, efetivamente, amenize o sofrimento e seja suficiente para que o ofensor sinta a condenação e entenda o fim didático da mesma?

Neste sentido, só o ofendido é que tem a condição de valorar o dano sofrido. Entretanto, não consegue, no calor da situação, diferenciar a compensação pelo dano da impossibilidade do enriquecimento pessoal fundado no dano sofrido.

Assim, quando nos deparamos com casos em que há a necessidade de realizar o pedido de dano moral, vivenciamos uma situação complexa e de efeitos incalculáveis, uma vez que o operador do Direito, obrigatoriamente, deve-se adentrar ao núcleo da discussão e identificar: 1) se o fato é indenizável; 2) valor de indenização e; 3) entendimento que o Estado-Juiz tem sobre este fato indenizável e sua valoração.

Observa-se que apesar da existência de acórdãos pacíficos nos tribunais, os três requisitos de análise são subjetivos, inexistindo métrica de balizamento para que a valoração seja certa sob o ponto de vista financeiro do pedido.

Apesar de termos a certeza da legalidade e direito do pedido de dano moral, temos também a certeza do julgamento desse pedido, que será procedente ou improcedente. Entretanto, não temos a medida de valor diretiva do pedido, o que leva, em muitos casos, ao julgamento de parcial procedência.

E julgado parcialmente procedente do pedido de dano moral com fundamento em sua valoração data vênia está incorreto, uma vez que o julgamento se dá sobre a existência do dano moral indenizável e não sobre o valor atribuído ao dano moral.

A valoração é uma questão de adequação do pedido ao caso concreto que deve ser realizada pelo Estado-Juiz quando do julgamento da ação, o que não pode ser levado a parcial procedência, com a consequente condenação do autor da ação ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios de sucumbência, o que se mostra penoso e contrário aos princípios constitucionais e processuais.

Julgamento do pedido de dano moral
Sob a ótica constitucional, incisos V, XXXIV "a" e, XXXV do artigo  da CF, o pedido de dano moral se mostra legalmente possível, de modo que a pessoa que teve a sua moral violada, poderá socorrer-se do Poder Judiciário para ver-se proporcionalmente indenizado.

Anteriormente não havia a obrigatoriedade da indicação do valor pretendido a título de dano moral. Bastava o pedido genérico, sem subsunção ao valor da causa, ficando à critério do Estado-Juiz a valoração em caso de procedência do pedido.

Com a entrada em vigor da Lei nº 13.105/2015 — CPC, prestes a completar oito anos, o autor da ação deve, nos termos do inciso V do artigo 292, indicar o valor de indenização pretendido.

Portanto, passou a ser obrigatória a inserção do valor de indenização por danos morais pretendido na ação. No entanto, data vênia, tal valor deve servir para balizar o máximo pretendido pelo autor da ação, bem como para servir de base de cálculo para as custas processuais, ou seja, o valor atribuído ao pedido de dano moral é acessório ao próprio pedido de dano moral e, como tal tem sua relevância no que diz respeito ao preenchimento dos requisitos da petição inicial e base de cálculo para custas processuais. Esse valor não pode ir além disso.

Por esse motivo, nos deparamos com diversos valores atribuídos visando a valorar o dano moral, quando da elaboração do seu pedido, seja na petição inicial, seja na reconvenção.

No entanto, ao proferir a sentença e, apesar de reconhecer a existência do dano moral, o Estado-Juiz entende que o valor atribuído, em muitos casos, se mostra excessivo e, por esse motivo, profere julgamento de parcial procedência, pois deixa de lado o pedido de dano moral e passa a julgar o valor do dano moral.

Portanto, se o Estado-Juiz julga o fato e as provas, o pedido de dano moral deverá ser julgado procedente ou improcedente, inexistindo a possibilidade de julgamento parcial para este pedido.

O inciso I do artigo 487 do Código de Processo Civil prevê que, haverá resolução de mérito quando o juiz acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou reconvenção.

"Artigo 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz:

I – acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção".

Percebe-se que esta forma de julgamento, onde se analisa o pedido de dano moral torna a sentença justa, pois entrega ou não ao peticionante o seu pedido valorado de acordo com o fato, limitado no valor indicado em sua petição.

Ter reconhecido ou não a existência de dano moral indenizável é um direito facultativo que cabe a parte buscar em juízo. Se houver o reconhecimento da existência do dano moral, este ator será indenizado dentro dos limites estabelecidos pelo Estado-Juiz, levando-se em consideração a métrica indicada na petição.

Caso não tenha reconhecido o dano moral indenizável, este ator não será indenizado, uma vez que houve o reconhecimento pelo Estado-Juiz de que o fato em si não foi gerador do dano moral reclamado em petição e, por este motivo, arcará com as custas processuais e honorários de sucumbência, o que está correto sob a ótica do procedimento processual.

No entanto, se o julgamento for de parcial procedência, diante do reconhecimento da existência do dano moral indenizável, mas com valor menor que o indicado na petição, haverá penalidade ao peticionante, pois estará obrigado a arcar com custas processuais e honorários advocatícios de sucumbência, os quais são arbitrados, normalmente, em 10% sobre a diferença entre o valor de indenização indicado na petição e o valor condenado, o que não está correto, pois houve o reconhecimento da existência do dano moral indenizável e a adequação do valor ao caso concreto realizada pelo Estado-Juiz.

Não há indenização se não houver o reconhecimento da existência de dano moral indenizável e, por esse motivo, o julgamento de procedência ocorre efetivamente sobre o fato e não sobre o valor pretendido.

Conclusão
Existindo o pedido de dano moral, na petição inicial ou reconvenção, o valor atribuído a esse pedido deverá ser utilizado como métrica máxima do pedido realizado para fins de valorar, os critérios objetivos e subjetivos de valoração e adequação do quantum indenizável se mostra suficiente para reparar o dano moral sofrido.

Assim, o valor indicado na petição inicial ou reconvenção não poderá ser objeto passível a justificar eventual julgamento parcial, uma vez que o pagamento da indenização só existirá no caso da procedência do pedido de dano moral, sem o qual inexiste o dever de indenizar, o que confere ao valor apenas um caráter financeiro quantitativo e qualificador do pedido de dano moral, deixando de condenar, neste caso, o autor do pedido de indenização por dano moral, em honorários de sucumbência e custas processuais sobre a diferença entre o valor pedido e o valor condenado, fundado no critério do valor arbitrado pelo Estado-Juiz.   

Assim, reconhecida a existência do dano moral, estar-se-á realizando o julgamento de procedência do pedido de dano moral, seguindo ao arbitramento e adequação do valor de indenização, tendo por base as partes envolvidas no processo e o caso concreto posto à apreciação do Estado-Juiz, de modo que a indenização seja justa em seu caráter punitivo e educativo, evitando-se o enriquecimento de quem recebe e o empobrecimento de quem paga.

 


Referências

Código Civil – Lei 10.406/2002

Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015

Constituição Federal do Brasil 1988

Autores

  • é advogado, professor universitário, pós-graduado em Direito Tributário com formação para o Magistério Superior em Direito Empresarial pela Universidade Anhanguera (Uniderp) e mestre em Direito pelo Centro Universitário Eurípedes de Marília (Univem).

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