Opinião

O quanto avançamos neste Dia Internacional dos Direitos Humanos

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10 de dezembro de 2023, 6h32

Comemora-se hoje o Dia Internacional dos Direitos Humanos. Em 1948, há exatos 75 anos, foi proclamada a Declaração Universal dos Direitos Humanos (Dudh) pela Assembleia Geral da ONU, como um “ideal a atingir por todos os povos e todas as nações” (ONU, 1948). Trata-se, portanto, de um marco significativo, elaborado no contexto histórico da Segunda Guerra Mundial e das severas violações ocorridas dentre as quais: o Holocausto (que levou à morte mais de 6 milhões de judeus) e o lançamento de bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki (cidades japonesas).

A Declaração Universal dos Direitos Humanos contempla um extenso rol de direitos, dentre os quais destacam-se: (i) o direito à liberdade, igualdade em dignidade e direitos (artigo 1); (ii) o direito à igualdade e a vedação ao tratamento discriminatório (artigo 2 e VII); (iii) o direito à  à vida, à liberdade e à segurança pessoal (artigo 3); (iv) a proibição à escravidão – em todas as suas formas (artigo 4); (v) a vedação à tortura (artigo 5); (vi) o direito de ser considerado como “pessoa” perante a lei em todos os lugares (artigo 6), dentre outros. 

ONU
Eleanor Roosevelt, presidente da Comissão de Direitos Humanos da ONU, em 1948

Por essa razão, o documento inspirou a elaboração de Constituições e Leis, em diversos países, que contemplam os direitos humanos em uma lógica universalista, que atendem a todos os seres humanos. Entretanto, questiona-se: Os direitos humanos são universais?

Os “direitos universais”
Conforme mencionado anteriormente, a Declaração Universal dos Direitos Humanos pautou-se em uma abordagem “universal” dos direitos humanos, que seriam inerentes a todos os seres humanos independente da sua cor, gênero, religião, classe social, nacionalidade, dentre outros. Trata-se, portanto, da visão tradicional sobre o tema, relacionada a um viés jusnaturalista (que compreende os direitos humanos como inerentes à essência humana) e juspositivista (que compreende que os direitos humanos advém das previsões legais — no âmbito nacional ou internacional — Constituição, Leis e Tratados Internacionais).

Ocorre que, para alguns estudiosos sobre o tema, a visão tradicional e universalista passou a não ser suficiente. Isso porque, além de apresentar-se como “utópica”, ainda inobserva a complexidade da implementação dos direitos humanos.

Conforme a “Teoria Crítica dos Direitos Humanos” (cujo principal autor é Joaquín Herrera Flores), os direitos humanos não podem ser confundidos com os direitos positivados, uma vez que a “maioria da população mundial não pode exercê-los por falta de condições materiais para isso” (FLORES, p. 27). 

Nas palavras do referido autor a principal tensão não é transformar um direito em um direito humano, mas transformar um direito humano em direito, bem como promover a “melhor implantação e efetividade aos direitos humanos” (FLORES, 27). Isso significa: proporcionar a concretização dos direitos e garantias por meio das práticas sociais, do exercício efetivo dos direitos.

Avanços na implementação dos direitos humanos no Brasil
Os direitos humanos podem ser definidos como o “conjunto de lutas pela dignidade”, cujos resultados serão alçados por meio de normas e políticas públicas adequadas, capazes de proporcionar a compreensão e aplicação por meio dos contextos históricos concretos, tal como uma produção cultural (FLORES, 34). Nesse sentido, os avanços sobre a implementação dos direitos humanos, pelos diversos países, são notórios.

No Brasil, o marco do processo de redemocratização foi a Constituição de 1988, a qual apresenta como fundamento da República Federativa do Brasil a “dignidade da pessoa humana” (artigo 1º, IV — BRASIL, 1988). Além disso, contempla um rol extenso (e meramente exemplificativo) de direitos e garantias fundamentais no artigo 5º, dentre os quais: igualdade de tratamento, vedação à tortura, liberdade de manifestação e de expressão (vedado anonimato), proteção da privacidade (inviolabilidade do domicílio, de correspondência, proteção a imagem e honra), acesso à justiça, ampla defesa e devido processo legal, etc. 

No âmbito infraconstitucional, em observância às subjetividades e necessidades de determinados grupos sobre direitos e proteções, destaca-se: o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), o Estatuto da Pessoa Idosa (Lei nº 10.741/2003); da  Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006 — que cria mecanismos para coibir a violência de gênero contra as mulheres), o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº  13.146/2015). 

Entretanto, conforme mencionado anteriormente, as disposições legais — per si — não são suficientes para trazer efetividade aos direitos. Por essa razão, analisar as políticas públicas sobre o tema é um fator determinante sobre os avanços em direitos humanos. Isso porque, conforme Maria Paula Dallari Bucci, as políticas públicas são um campo mais “concreto” do direito e “[…] o fim da ação governamental, as metas nas quais se desdobra esse fim, os meios alocados para a realização das metas e, finalmente, os processos de sua realização”(2001, p. 13).

Embora ainda enfrentemos índices alarmantes sobre desigualdade social, insegurança alimentar, acesso à educação, desmatamento, etc., observa-se como exemplos de políticas públicas relevantes: (i) Programa Universidade para Todos; (ii) Política Nacional de Alfabetização; (iii) Educação para Jovens e Adultos; (iv) políticas de distribuição de renda e redução de desigualdades (Bolsa Família); (v) Política Nacional do Meio Ambiente; (vi) Programa Criança Feliz; (vii) Casa da Mulher Brasileira; (viii) Plano Amazônia Sustentável.

Portanto, apesar de todos os avanços, ainda há um grande caminho a ser percorrido para que alcancemos o respeito à dignidade humana e a todos os direitos dispostos nos tratados internacionais e nos ordenamentos pátrios. Contudo, antes de finalizar, em referência a um trecho da tese do professor Eduardo Xavier Lemos, ressaltamos que “[…] acreditamos nos direitos humanos como resultado do processo de emancipação da humanidade e, por esse motivo, acreditamos que são o caminho para a Justiça Social” (2023, p. 422).

REFERÊNCIAS
BUCCI, Maria Paula Dallari. Buscando um Conceito de Políticas Públicas para a Concretização dos Direitos Humanos. (p. 5-16). InDireitos humanos e políticas públicas. São Paulo, Pólis, 2001.

FLORES, Joaquín Herrera. A reinvenção dos direitos humanos. Tradução de: Carlos Roberto Diogo Garcia; Antônio Henrique Graciano Suxberger; Jefferson Aparecido Dias.  Florianópolis: Fundação Boiteux, 2009.

LEMOS, Eduardo Xavier. Teoria crítica dos direitos humanos desde América Latina: a teoria e práxis do coletivo O Direito Achado na Rua. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2023.

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