Sem dolo, sem pena

Sem intenção prévia de lesar, acusado de 17 estelionatos é absolvido

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25 de abril de 2023, 10h46

O crime de estelionato exige que eventual resultado lesivo seja precedido de intenção do agente de enganar a vítima para obter vantagem ilícita. Com esse entendimento, por 3 votos a 2, a 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) acolheu embargos infringentes para absolver um despachante condenado por 17 estelionatos.

MrDm/Freepik
Para o TJ-MG, no crime de estelionato
deve haver a intenção de lesar
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Relator dos embargos, o desembargador Marcílio Eustáquio Santos afirmou que as provas demonstram que o acusado não teve prévia intenção de enganar as vítimas e lesar seus patrimônios. "Tratou-se, em verdade, de desacerto contratual, por ato ilícito, sem dúvidas, mas não penalmente típico. Configura-se o crime de estelionato quando há engodo preordenado, emprego doloso de meio fraudulento para iludir a vítima a prejuízo, obtendo vantagem ilícita".

Acusado de cometer 17 vezes o crime de estelionato contra clientes e de ocultar documentos públicos de parte das vítimas por dez ocasiões, o réu foi condenado em primeira instância a quatro anos, cinco meses e dez dias de reclusão, em regime inicial semiaberto. Ele recorreu e a 7ª Câmara Criminal, por 2 votos a 1, proveu parcialmente o apelo apenas para conceder ao recorrente os benefícios da assistência judiciária gratuita.

A falta de unanimidade na decisão colegiada possibilitou ao recorrente opor os embargos infringentes, a fim de que a matéria fosse reapreciada pela 7ª Câmara Criminal, agora com a inclusão de dois novos julgadores.

Revisor da apelação e voto vencido para absolver o réu, o desembargador Sálvio Chaves havia destacado que o Direito Penal se destina à repressão de "conduta verdadeiramente gravosa", mas o apelante, "embora imprudente, jamais desejou lesionar o bem jurídico tutelado".

Virada de jogo
O relator dos infringentes seguiu o entendimento do voto minoritário da apelação. O desembargador Cássio Salomé aderiu a esse ponto de vista, acrescentando que não percebeu dolo prévio na conduta do embargante, indispensável para a caracterização do estelionato. "A meu ver, a atuação se afigura mais como um descontrole/desorganização do despachante na realização dos serviços do que uma má-fé, em si, do profissional."

Os desembargadores Agostinho Gomes de Azevedo e Paulo Calmon Nogueira da Gama divergiram do relator dos embargos, mantendo os votos que proferiram por ocasião do julgamento da apelação. Segundo eles, não há de se falar em absolvição do crime de estelionato por ausência de dolo.

Os magistrados argumentaram que o acusado confessou ter se apossado de valores dos clientes, repassados em virtude de sua profissão, "de modo que o dinheiro foi empregado em proveito próprio".

O réu, agora absolvido, alegou que atuava havia mais de 15 anos como despachante, mas se encontrava em situação financeira difícil. Por isso, começou a receber valores de novos clientes para executar serviços anteriores pendentes, chegando a um ponto de não conseguir mais honrar todos os compromissos. Quanto aos documentos, admitiu que reteve alguns, mas com o intuito de apenas fazer os trabalhos contratados, sem qualquer objetivo de se beneficiar ou causar prejuízo alheio.

Processo 1.0035.15.017392-6/002

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