Opinião

Dispensa de licitação e "mesmo ramo de atividade": a IN Seges nº 8/23

Autor

  • Gabriela Lira Borges

    é mestre em Governança e Planejamento Público pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) especialista em Direito Constitucional pela Universidade do sul de Santa Catarina (Unisul) e em Direito Tributário pela Uniderp/Anhanguera ex-procuradora do Estado do Acre ex-consultora jurídica da Consultoria Zênite ex-analista de Licitações do Sesc-Paraná assessora jurídica do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar-Paraná) autora de diversos artigos jurídicos versando especialmente sobre licitações e contratos regime de pessoal dos servidores públicos e Sistema S e consultora jurídica na área de licitações contratos e regime jurídico de servidores públicos.

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7 de abril de 2023, 11h16

Um dos primeiros atos normativos editados com a finalidade de regulamentar a Lei 14.133/21, a Instrução Normativa nº 67, também de 2021 disciplinou o procedimento para realização de dispensas de licitação sob a forma eletrônica e instituiu também o Sistema de Dispensa Eletrônica, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. 

Da mesma forma que previsto em outros regulamentos federais, a IN 67 previu sua utilização não apenas pela União, mas também por órgãos e entidades de outras esferas (estadual, distrital ou municipal) em suas administrações direta ou indireta, quando executarem recursos da União decorrentes de transferências voluntárias. 

Em relação à instrução processual, a IN 67 não inovou em relação ao já bastante completo artigo 72 da Lei 14.133/21 que condicionou a regularidade da instrução dos processos de contratação, inclusive dispensas, à presença dos seguintes documentos: I – documento de formalização de demanda e, se for o caso, ETP, análise de riscos, TR, projeto básico ou projeto executivo; II – estimativa de despesa, c) parecer jurídico e pareceres técnicos, se for o caso, que demonstrem o atendimento dos requisitos exigidos; d) demonstração da compatibilidade da previsão de recursos orçamentários com o compromisso a ser assumido; e) comprovação de que o contratado preenche os requisitos de habilitação e qualificação mínima necessária; f) razão da escolha do contratado; g) justificativa de preço e h) autorização da autoridade competente.

Um aspecto interessante que a IN 67 agregou ao cenário da dispensa foi a possibilidade de realização de pesquisa de preços simultânea à seleção do fornecedor prevista pelo artigo 16, §1º reforçando que a verificação quanto à "compatibilidade de preços será formal e deverá considerar, no mínimo, o número de concorrentes no procedimento e os valores por eles ofertados".

A previsão em questão, registre-se, apenas reitera a possibilidade de realização da verificação de adequação dos preços durante a análise das propostas dos fornecedores (e não por meio de pesquisa de preços prévia) já contida na IN 65, 2021 que regulamentou a pesquisa de preços no âmbito da Lei 14.133/21. 

Um ponto, porém, em que a IN 67, de fato, inovou disse respeito ao conteúdo jurídico conferido a um conceito adotado pela Lei 14.133/21 em seu artigo 75, §1º, inciso II o qual, para melhor visualização, aqui se transcreve: 

"Artigo 75. É dispensável a licitação:
(…)

§1º. Para fins de aferição dos valores que atendam aos limites referidos nos incisos I e II do caput deste artigo, deverão ser observados:

I – o somatório do que for despendido no exercício financeiro pela respectiva unidade gestora;
II – o somatório da despesa realizada com objetos de mesma natureza, entendidos como tais aqueles relativos a contratações no mesmo ramo de atividade".

Conforme se observa, a Lei 14.133/21 trouxe importantes balizas para o cálculo dos limites para as dispensas em razão do valor estabelecendo, neste sentido, que, para o cálculo de tais limites, deveriam ser considerados o somatório do que for despendido pela respectiva unidade gestora durante o exercício financeiro com objetos de mesma natureza, entendidos como tais aqueles relativos a contratações no mesmo ramo de atividade.

Minudenciando estes conceitos, a IN 67, em seu artigo 4º, §2º deu conteúdo à expressão mesmo ramo de atividade, nos seguintes termos: "§ 2º Considera-se ramo de atividade a partição econômica do mercado, identificada pelo nível de subclasse da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (Cnae)".

Os esforços normativos destinados a aclarar os conceitos dos parâmetros necessários para calcular os limites de dispensa, registre-se, visam nada mais do que contribuir para reduzir o fracionamento indevido de despesas. 

A inovação foi bastante bem recebida pois atrelou parâmetros de dispensa a uma fonte largamente conhecida pelo mercado qual seja a tabela Cnae e colocou fim, temporariamente, às rotineiras dúvidas sobre como calcular os valores para fins de dispensa de licitação. 
Pois bem, na edição do dia 29/03/2023 do Diário Oficial da União foi publicada mais uma novidade para o cenário das dispensas eletrônicas: a Instrução Normativa Seges nº 08, de 23/03/2023 que alterou a ainda recente IN 67, especificamente quanto à questão do que deve ser considerado mesmo ramo de atividade. 

Neste sentido, é o teor da recém-publicada IN nº 08: 
Art. 1º A Instrução Normativa Seges/ME nº 67, de 8 de julho de 2021, passa a vigorar com as seguintes alterações:

"Artigo 4º ……………………………………………………………………………………………………..
………………………………………………………………………………………………………………….
§2º. Considera-se ramo de atividade a linha de fornecimento registrada pelo fornecedor quando do seu cadastramento no Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf), vinculada:

I – à classe de materiais, utilizando o Padrão Descritivo de Materiais (PDM) do Sistema de Catalogação de Material do Governo federal; ou
II – à descrição dos serviços ou das obras, constante do Sistema de Catalogação de Serviços ou de Obras do Governo federal. (NR).

Artigo 2º Esta Instrução Normativa entra em vigor em 2 de maio de 2023".

De acordo com a nova redação dada à IN 67, a vinculação do ramo de atividade à descrição constante da tabela Cnae foi substituída pela vinculação ao PDM ou seja, ao padrão descritivo de materiais à descrição de serviços ou de obras do governo federal, constantes dos respectivos sistemas de catalogação de materiais e de serviços ou de obras do governo federal. 

A novidade, ao que tudo indica, destina-se a coibir com mais efetividade a prática do fracionamento indevido de despesas, porém o nobre objetivo ficará a depender da qualidade do conteúdo e do acesso aos sistemas de catalogação do governo, os quais, com efeito, tem sido objeto de constante aperfeiçoamento.

Autores

  • é mestre em Governança e Planejamento Público pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), especialista em Direito Constitucional pela Universidade do sul de Santa Catarina (Unisul) e em Direito Tributário pela Uniderp/Anhanguera, ex-procuradora do Estado do Acre, ex-consultora jurídica da Consultoria Zênite, ex-analista de Licitações do Sesc-Paraná, assessora jurídica do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar-Paraná), autora de diversos artigos jurídicos, versando especialmente sobre licitações e contratos, regime de pessoal dos servidores públicos e Sistema S e consultora jurídica na área de licitações, contratos e regime jurídico de servidores públicos.

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