"atuação irretocável"

Suicídio de investigado após ordem de prisão não gera suspeição do juiz da causa

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18 de setembro de 2022, 14h40

O fato de uma decisão de prisão temporária levar o investigado em um processo penal ao suicídio não é argumento juridicamente hábil para firmar a suspeição do juiz da causa, quando ele próprio não reconhece sua inaptidão para conduzir o processo.

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Luís Carlos Cancellier de Olivo foi preso em ação espetaculosa de investigação contra corrupção, que levou-o ao suicídio
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Com esse entendimento, a juíza federal substituta Janaina Cassol Machado, da 1ª Vara Federal de Florianópolis, foi mantida como a responsável pela ação penal que apura supostos crimes na administração da Universidade Federal de Santa Catarina.

A exceção de suspeição foi ajuizada por Eduardo Lobo, um dos professores da entidade. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região se recusou a afastar a magistrada, posição mantida pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, mas sem reavaliação de mérito.

A suspeição da juíza Janaina Cassol Machado foi suscitada como decorrência do suicídio de Luís Carlos Cancellier de Olivo, reitor da UFSC que foi afastado do cargo e preso preventivamente por ordem da magistrada, ao lado de outras seis pessoas, em 14 de setembro.

Ela determinou a prisão porque o Ministério Público Federal relacionou o reitor à acusação de chefiar uma quadrilha que teria desviado R$ 80 milhões de dinheiro público da educação. A cifra, divulgada com estardalhaço, na verdade, correspondia ao total dos repasses para um programa de EaD ao longo de oito anos. Os supostos desvios, depois foi esclarecido, não chegavam a R$ 2,5 milhões.

Janaína Cassol Machado saiu de licença um dia após a decisão. No dia seguinte, a juíza substituta Marjôrie Cristina Freiberger decidiu soltar Cancellier imediatamente por falta de provas.

Em 2 de outubro, ele se jogou no vão central do shopping Beiramar, em Florianópolis. Em mensagem deixada, apontou que "minha morte foi decretada no dia da minha prisão".

Para Eduardo Lobo, é impossível negar que não só o episódio do suicídio como seus desdobramentos repercutiram no âmbito da investigação, uma vez que a magistrada passou a atuar com uma versão pré-concebida prejudicial aos acusados.

Um exemplo citado pelo investigado é uma entrevista concedida pela juíza ao Jornal Catarinense em que mostra sua insatisfação com a soltura dos investigados, além de outros atos praticados pela juíza que a substituiu durante sua licença.

Quando analisou o caso, o TRF-4 concluiu que não há motivos para declarar a suspeição da magistrada. Afirmou que o contexto do suicídio do reitor não traz argumento juridicamente hábil para recusar o juízo por suspeição e que a atuação da juíza foi "irretocável".

A 5ª Turma do STJ não chegou a analisar a maior parte das alegações do recurso, por incidência da Súmula 7. Desconstituir as conclusões do TRF-4 demandaria reexame de fatos e provas, o que é proibido em sede de recurso especial.

Relator, o desembargador convocado Jesuíno Rissato afastou a suspeição causada pela entrevista da magistrada à publicação catarinense, destacando que o artigo 12 do Código de Ética da Magistratura Nacional afasta impedimento ao livre exercício do direito de manifestação do juiz.

"No caso concreto, a corte de origem, aparada pelo acervo fáticoprobatório presente nos autos, constatou que a d. Magistrada não discorreu, em entrevista à imprensa, diretamente sobre o conteúdo dos autos, motivo pelo qual não se pode presumir, de sua simples manifestação sobre os fatos, um juízo de valor que motive eventual suspeição para o julgamento da causa", afirmou. A votação foi unânime.

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REsp 2.004.098

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