Gritos e sussurros

ONG com atuação empresarial quis interferir em eleições com dinheiro público

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23 de março de 2022, 10h53

O chefe da Transparência Internacional Brasil, Bruno Brandão, afirmou em entrevista à Folha de S.Paulo que o financiamento público de campanhas políticas é uma reação à 'lava jato' que praticamente "legaliza a corrupção".

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DivulgaçãoPara Brandão, uso de dinheiro público nas eleições 'legaliza a corrupção', mas em fundo gerido por entidade privada, tudo bem

"É uma corrupção institucionalizada, por meio da explosão [da quantidade] de recursos públicos e da redução absurda dos mecanismos de controle", comentou Brandão sobre o fundo eleitoral.

Ele atacou o aumento do fundo eleitoral público deste ano para R$ 5 bilhões e a falta de transparência nos gastos e de mecanismos de prestação de contas.

Quando trabalhava com a apelidada "força-tarefa da lava jato", Brandão planejou com os procuradores de Curitiba montar esquema para que, na eleição de 2018, fossem eleitos apenas candidatos lavajatistas. O plano previa também o fuzilamento moral de opositores elencados em uma lista negra a que deram o nome de "adeus, queridos".

O diretor da Transparência, que atua como empresa de lobby em diversos países, tinha planos ambiciosos. Ele queria ser co-administrador de dois fundos: o de R$ 2,5 bilhões oriundos da Petrobras e outro de R$ 2,3 bilhões do acordo de leniência da J&F Investimentos. As duas tentativas fracassaram.

No caso da J&F, os empresários negaram-se a delegar a tarefa de investir em projetos sociais à T.I. e aos procuradores. O Ministério Público Federal do Distrito Federal queria destinar R$ 2,3 bilhões (dos R$ 10,3 bilhões totais do acordo) para um projeto de "controle social da corrupção" e "campanhas educativas".

O programa seria supervisionado pela Transparência Internacional — uma entidade de direito privado decidindo como gastar dinheiro público (uma vez que devolvido ao Estado, por meio do acordo de leniência).

A história foi contada pela ConJur em dezembro de 2020: o procurador-Geral da República, Augusto Aras, tomou conhecimento de um depósito no valor de R$ 270 milhões, exigidos pelo MPF-DF. O depósito relacionado ao acordo de leniência da holding da JBS foi feito em 3 de dezembro. Prontamente, Aras alertou a subprocuradora-geral da República Maria Iraneide Olinda Santoro Facchini, coordenadora da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão, informando-a de que a destinação correta do dinheiro seria o Fundo de Direitos Difusos ou revertidos em favor da União.

Esses R$ 270 milhões faziam parte dos R$ 2,3 bilhões que seriam usados nas iniciativas de "controle social da corrupção". O arquiteto da operação seria o conselheiro da TI e assessor informal da "lava jato" Joaquim Falcão.

A fundação do acordo da J&F seguiria os mesmos moldes daquela que a turma da "lava jato" tentou criar com o dinheiro de multa paga pela Petrobras, R$ 2,5 bilhões. A iniciativa foi brecada por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, e o dinheiro foi distribuído para contenção incêndios na Amazônia e para educação em vários estados.

Em resumo: Brandão acha absurdo o contribuinte pagar pela viabilização do processo eleitoral que beneficiará a todos os candidatos indistintamente. Mas defendeu que ele próprio participasse da gestão de fundos, com capital semelhante ao do fundo eleitoral — e que ajudariam a eleger apenas candidatos da turma dele.

Atração fatal
A relação da Transparência Internacional com a "lava jato" vem de longa data. Uma troca de mensagens entre Brandão e Deltan Dallagnol, divulgada em 2020, revelou que o procurador deu acesso ao chefe da TI-B aos termos do acordo da Petrobras antes que ele fosse assinado.

As mensagens hackeadas também os mostram combinando estratégias de intervenção na imprensa a favor da "lava jato", como a produção de estudos encomendados para que a recuperação econômica do país fosse atribuída à operação.

Em março de 2021, a Fundação Getúlio Vargas enviou uma notificação à sede da Transparência Internacional, na Alemanha, acusando a seção brasileira de ter usado mão de obra, expertise  e instalações da própria FGV para cumprir um memorando firmado com a "lava jato", mas sem o seu consentimento.

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