Extensão de direitos sem vínculo não aplica garantia de emprego à gestante
11 de março de 2022, 8h00
O Direito do Trabalho sempre é levado a socorrer situações novas de trabalho, muitas vezes imprevisíveis, como por exemplo a que vivemos nos tempos atuais com o trabalho prestado por meio de aplicativos, chamada relação de trabalho por subordinação a algoritmo. Entretanto, no passado, a legislação trabalhista, impulsionada pelos fatos, foi obrigada a dar função de estatuto jurídico à permanência de trabalhadores em trabalhos de curta duração, destinados ao atendimento de demanda especial, sem perspectiva de continuidade.
A fim de evitar a contratação de trabalhadores diretamente pelas empresas, a citada lei criou a figura da empresa de trabalho temporário, que autorizada pelo Ministério do Trabalho, faz a intermediação da mão-de-obra, ou seja, seleciona trabalhadores quando acionada pelo cliente interessado (tomadora de mão-de-obra) e os encaminha para a execução do trabalho, cuja característica é ter a condição de temporário. Portanto, a base jurídica da relação que se estabelece entre fornecedora de mão-de-obra, empresa tomadora de mão-de-obra e trabalhador é o trabalho temporário. Não fosse assim, a continuidade implicaria vínculo direto com o tomador, pois ausentes os elementos essenciais da natureza jurídica do trabalho temporário.
Também para evitar a contratação de trabalhadores diretamente pelas empresas é que a função de contratar é da empresa fornecedora-de-mão de obra, caso contrário, estaria presente a pessoalidade na contratação do trabalhador, ensejando a nulidade do contrato, gerando vínculo direto com o tomador da mão-de-obra.
Desta feita, pode-se afirmar que a base jurídica do modelo permitido pela Lei nº 6.019/74, é a natureza do trabalho temporário, na forma disposta pela lei, ou seja, para atender demanda complementar de serviço ou substituição de pessoal permanente. Diga-se, por oportuno, que, embora a lei estabeleça período limites de utilização desse modelo jurídico relativamente ao trabalhador, o prazo do contrato deve ser determinado pela execução do trabalho de natureza temporário, ou seja, cessado o trabalho, cessa a relação jurídica. Não se trata, pois, de contrato de prazo determinado nos termos do artigo 443 da CLT e, menos ainda de modalidade pois a estrutura jurídica da relação não é direta com o tomador de mão-de-obra.
Considerando que o Direito do Trabalho tem por hábito tratar de vínculo de emprego, na prática foram adotadas expressões absolutamente equivocadas, como "empregado temporário", "contrato de prestação de serviços" ao se referir à fornecedora de mão-de-obra com igualdade à empresa de serviços terceirizados. O trabalhador não pode ser empregado porque não deveriam estar presentes a pessoalidade na contratação nem a continuidade de trabalho; a empresa fornecedora de mão-de-obra, não tem gestão na empresa tomadora do trabalho prestado pelos trabalhadores encaminhados, que ficam à disposição do tomador.
Na mesma toada, confundem-se os direitos exclusivos do vínculo de emprego com aqueles que foram estendidos aos trabalhadores inseridos em trabalho temporário.
E, assim, durante bom tempo a jurisprudência trabalhista, por extensão e por confusão com contrato de trabalho por prazo determinado, reconhecia aos trabalhadores acidentados a garantia de emprego ou à gestante a estabilidade como se empregados fossem. A confusão é natural porque exalta-se o caráter protetivo da lei ao trabalhador e a tendência protecionista da Justiça do Trabalho. Todavia, o fundamento jurídico e fático não se ajusta ao trabalho de natureza temporária.
Pesquisando no sitio do TST, encontra-se notícia publicada em 2/9/2021, de decisão da 4ª Turma, com a seguinte manchete "Fim de contrato temporário impede trabalhadora de ter estabilidade destinada às gestantes".
E informa a notícia que, segundo os ministros, "o contrato de trabalho temporário, com prazo certo para ser encerrado, foi cumprido integralmente, e a estabilidade da gestante só ocorre quando há dispensa arbitrária ou sem justa causa".
Ao verificar o acórdão constata-se a seguinte fundamentação:
"No entanto, o Tribunal Pleno desta Corte, no julgamento do IAC-5639-31.2013.5.12.0051, fixou tese jurídica no sentido de que 'é inaplicável ao regime de trabalho temporário, disciplinado pela Lei nº 6.019/74, a garantia de estabilidade provisória à empregada gestante, prevista no art. 10, II, b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias'".
E depois, com todo respeito, traz fundamentos que se afastam dos elementos julgados, trazendo o socorro da Súmula 244, que se aplica à relação de emprego e que estendeu a proteção da estabilidade gestante às empregadas mesmo quando contratadas mediante contrato de prazo determinado (item III, da Súmula).
E, depois, finaliza invocando a tese firmada pelo STF no Tema 497 da repercussão geral que está assim sintetizada:
A incidência da estabilidade prevista no artigo 10, inciso II, do ADCT, somente exige a anterioridade da gravidez à dispensa sem justa causa.
E, assim, adota tese de trabalhadora contratada como empregada mediante contrato de prazo determinado, enfrentada pelo STF e que se refere à estabilidade na hipótese de rescisão antecipada do contrato de prazo, fato que ensejaria o pagamento dos salários até o prazo previsto para término do contrato.
Em se tratando de trabalho temporário, como observado, o prazo é o da realização do trabalho sem condicionamento a prazo contratual e, deste modo as análises e fundamentos devem ser aqueles da tese do Pleno do TST, no IAC-5639-31.2013.5.12.0051, a fim de que as situações jurídicas não se confundam.
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