Prática Trabalhista

Uso da geolocalização como meio de prova na Justiça do Trabalho

Autores

  • é professor advogado parecerista e consultor trabalhista. Atuação estratégica e especializada nos Tribunais (TRTs TST e STF). Coordenador trabalhista da Editora Mizuno. Membro do Comitê Técnico da Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária. Membro e Pesquisador do Grupo de Estudos de Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social da Universidade de São Paulo (Getrab-USP) do Gedtrab-FDRP/USP e da Cielo Laboral.

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  • é pós-graduado lato sensu em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pela Escola Paulista de Direito (EPD) pós-graduado lato sensu em Direito Contratual pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) pós-graduado em Diretos Humanos e Governança Econômica pela Universidade de Castilla-La Mancha pós-graduando em Direitos Humanos pelo Centro de Direitos Humanos (IGC/Ius Gentium Coninbrigae) da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra membro da Comissão Especial da Advocacia Trabalhista da OAB-SP auditor do Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Paulista de Judô e pesquisador do núcleo O Trabalho Além do Direito do Trabalho da Universidade de São Paulo (NTADT/USP).

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12 de maio de 2022, 8h00

Indubitavelmente, com a chegada das novas tecnologias, o Direito do Trabalho vem sendo fortemente impactado, de modo que alguns temas precisam, com o passar do tempo, ser melhor estudados.

Dito isso, no ano de 2020, a Justiça do Trabalho passou a investir na capacitação dos magistrados e servidores na formação de provas por meios digitais [1]. O projeto denominado Programa Provas Digitais [2] tem por objetivo auxiliar os juízes na fase de instrução do processo, visando a celeridade processual, assim como contribuir na produção de provas para aspectos controvertidos.

Frise-se, por oportuno, que as provas digitais são informações tecnológicas que têm potencial para alcançar a verdade real dos fatos, possuindo embasamento legal no atual Código de Processo Civil de 2015 [3].

Nesse sentido, um dos mecanismos que vêm sendo utilizado para se obter essa efetiva veracidade no processo judicial trabalhista é a utilização dos registros de geolocalização, como, por exemplo, para a comprovação de labor extraordinário.

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Com efeito, através da geolocalização é possível obter dados precisos, a exemplos dos dias, locais e horários, de forma a facilitar a localização exata de um dispositivo móvel.

Entrementes, a partir dessas informações, se torna factível comprovar em que locais em que o empregado efetivamente transitou no decorrer de um período, possibilitando, assim, cotejar as suas alegações com essa prova digital.

Aliás, um dos pontos questionáveis é se tal prova digital poderia substituir e dispensar a produção da prova oral, a qual é tradicionalmente utilizada na Justiça do Trabalho. E, mais, outra questão problemática diz respeito à segurança da prova digital para embasar a decisão judicial e esclarecer as controvérsias existentes no processo.

Nesse diapasão, a empresa Google já chegou a admitir que os dados de monitorização de pessoas podem estar sujeitos a erros, a ponto de concluir que um indivíduo esteja em um local, quando, em realidade, está em uma "distância considerável" [4].

Recentemente, inclusive, uma das maiores empresas de tecnologia do mundo admitiu falhas no GPS de um número limitado de aparelhos de telefonia móvel, afetando o uso de aplicativos que utilizam a geolocalização [5].

Lado outro, não obstante os efeitos positivos obtidos através desta nova e contemporânea prova digital, surgem debates quanto ao risco do direito à privacidade do indivíduo.

No início da pandemia, a organização não governamental, Human Rights Watch, ponderou que o uso da geolocalização utilizada em diversos países para o combate da Covid-19 poderia colocar em risco os direitos humanos, comprometendo-se assim, à vida privada [6].

Do ponto de vista normativo no Brasil, a Constituição Federal dispõe em seu artigo 5º, inciso XII, que é "inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal".

De outro norte, a Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 [7], dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive, nos meios digitais. O intuito é garantir e proteger os direitos fundamentais da pessoa natural, dentre eles, a liberdade e a privacidade.

Sobre o assunto, oportunos são os ensinamentos Élisson Miessa [8]:

"Referida legislação trará inúmeras discussões acerca da aplicação da LGPD nas relações trabalhistas, desde a fase pré-contratual (na seleção dos candidatos, por exemplo), até após o término do contrato de trabalho (com o armazenamento das informações de antigos empregadores).
(…). Nesse contexto, podem surgir discussões relativas à possibilidade de juntada de provas que tenham informações pessoais de empregados pelas empresas nas reclamações trabalhistas. Assim, o empregador, em um processo trabalhista, estaria vedado de juntar uma prova que trouxesse dados pessoais de seu ex-empregado?".

Do ponto de vista internacional, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu artigo 12 [9], assegura a garantia da vida privada.

É certo que os tribunais têm sido provocados a emitirem um juízo de valor quanto a validade e aplicabilidade das provas digitais no processo do trabalho, notadamente quanto ao uso da geolocalização.

O entendimento sobre o assunto, porém, não se encontra pacificado.

Para os magistrados da 1ª Seção de Dissídios Individuais do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região [10], em que pese a geolocalização possa ser admitida como meio de prova, há ofensa ao direito líquido e certo ao sigilo telemático e à privacidade.

Em seu voto, o desembargador relator ponderou que "evidencia-se que a exibição da geolocalização da impetrante, durante largo período de tempo, vinte e quatro horas por dia, revelando os lugares e os horários em que a impetrante esteve, trata-se de medida que viola a privacidade e o sigilo dos dados telemáticos da autora, além de ser desarrazoada, visto que a duração da jornada externa da obreira poderia ser constatada pelos meios ordinários de prova".

Em sentido contrário, o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região validou o pedido para utilização da geolocalização do aparelho celular de uma empregada como meio de prova [11].

Para o desembargador relator [12], "se o novo meio probatório, digital, fornece para o fato que se quer comprovar — as folhas de ponto retratam o verdadeiro horário de trabalho — dados mais consistentes e confiáveis do que a prova testemunhal, não há porque sua produção ser relegada a um segundo momento processual, devendo, de outro modo, preceder à prova oral, ainda que mais tradicional, com vista a busca mais efetiva da verdade real, e, portanto, à maior segurança da prestação jurisdicional, bem assim atendendo ao princípio da rápida duração do processo".

Em arremate, é incontroverso que as provas digitais poderão contribuir para a efetividade do processo, contudo, cada caso deve ser analisado cautelosamente, a fim de evitar excessos, violação de princípios e ofensas aos direitos humanos fundamentais.


[1] Disponível em https://www.tst.jus.br/provas-digitais. Acesso em 4/5/2022.

[3] Art. 369. As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.

Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.

[8] Curso de Direito Processual do Trabalho – 8ª ed. rev., ampl. e atual. – São Paulo: Editora JusPodivm, 2021, página 711.

[9] Artigo 12. Ninguém será sujeito à interferência na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataque à sua honra e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques.

Autores

  • é mestre em Direito do Trabalho pela PUC-SP, professor de Direito do Trabalho da FMU, coordenador trabalhista da Editora Mizuno, membro do Comitê Técnico da revista Síntese Trabalhista e Previdenciária, coordenador acadêmico do projeto "Prática Trabalhista" (ConJur), membro e pesquisador do Grupo de Estudos de Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social, da Universidade de São Paulo (Getrab-USP), do Gedtrab-FDRP/USP e da Cielo Laboral.

  • é pós-graduado lato sensu em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pela Escola Paulista de Direito, pós-graduado lato sensu em Direito Contratual pela PUC-SP, pós-graduando em Direitos Humanos pelo Centro de Direitos Humanos da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, membro da Comissão Especial da Advocacia Trabalhista da OAB-SP, auditor do Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Paulista de Judô e pesquisador do núcleo "O Trabalho Além do Direito do Trabalho", da USP.

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