Opinião

É possível deduzir as contribuições extraordinárias de Previdência do IRPF?

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18 de julho de 2022, 17h05

O Regime de Previdência Complementar, disciplinado pela Lei Complementar nº 109 de 29 de maio de 2001, consiste em um regime privado, de caráter facultativo, operado por entidades de previdência complementar, cujo objetivo principal é garantir planos de benefícios de caráter previdenciário aos que assim optarem.

Por se tratar de regime autônomo em relação ao regime geral de previdência social, a atuação do Estado é voltada para [1]: a) formular a política de previdência complementar; b) disciplinar, coordenar e supervisionar as atividades das entidades de previdência complementar; c) determinar padrões mínimos de segurança econômico-financeira e atuarial; d) assegurar o acesso às informações; e) fiscalizar as entidades de previdência complementar; e f) proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios.

As contribuições são classificadas em: a) normais, sendo aquelas destinadas ao custeio dos beneficiários; e b) extraordinárias, que são as destinadas ao custeio de déficits, serviços passados e outras finalidades não incluídas na contribuição normal [2].

As contribuições extraordinárias, assim, destinam-se a trazer equilíbrio financeiro, quando por meio de avaliação atuarial, for constatado que as contribuições a serem pagas não serão suficientes para custear os benefícios previdenciários. Nesse sentido, o §1º do artigo 21 da Lei Complementar nº 109 traz previsão expressa dessa forma de contribuição:

"Artigo 21. O resultado deficitário nos planos ou nas entidades fechadas será equacionado por patrocinadores, participantes e assistidos, na proporção existente entre as suas contribuições, sem prejuízo de ação regressiva contra dirigentes ou terceiros que deram causa a dano ou prejuízo à entidade de previdência complementar.
§1º O equacionamento referido no caput poderá ser feito, dentre outras formas, por meio do aumento do valor das contribuições, instituição de contribuição adicional ou redução do valor dos benefícios a conceder, observadas as normas estabelecidas pelo órgão regulador e fiscalizador".

Em sendo instituída e devidamente paga a contribuição extraordinária, será possível deduzi-la do imposto de renda da pessoa física? A dúvida surge, uma vez que o artigo 69 da Lei Complementar nº 109 [3] e a Lei nº 9.250/1995, que trata do importo de renda das pessoas físicas, não é clara.

O artigo 8º da referida lei dispõe sobre a forma como deverá ser formulada a base de cálculo do imposto de renda, sendo esta a diferença entre as somas de todos os rendimentos percebidos durante o ano-calendário, das deduções previstas no rol do inciso II. Vale dizer, as deduções não comporão a base de cálculo do imposto de renda.

Dentre as hipóteses de dedução, a lei prevê que será possível deduzir as contribuições para as entidades de previdência privada domiciliadas no País, cujo ônus tenha sido do contribuinte, destinadas a custear benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social [4].

A Lei fala em "contribuições para as entidades de previdência", não havendo dúvidas de que as contribuições ordinárias são passíveis de serem deduzidas da base de cálculo do imposto de renda da pessoa física. Entretanto, a lei não é expressa em relação às contribuições extraordinárias, o que abre margem para que a Receita Federal não autorize a dedução destas contribuições. Nesse sentido, é o entendimento da Solução Consulta nº 6005  SRRF06/DISIT, de 26 de fevereiro de 2019, embasado na Solução de Consulta Cosit nº 354, de 06 de julho de 2017 [5]:

"Apenas as contribuições normais (aquelas que se destinam ao custeio de benefícios) às entidades fechadas de previdência privada domiciliadas no Brasil são dedutíveis do Imposto sobre a Renda de Pessoa Física, observadas as condições estabelecidas na legislação, bem como, respeitado o limite de 12% sobre o total dos rendimentos computados na determinação da base de cálculo do imposto devido na Declaração de Ajuste Anual".

O entendimento da Receita Federal é no sentido de se permitir a dedução apenas das contribuições ordinárias, sob o fundamento de que a finalidade das contribuições extraordinárias (custear déficits), seria diversa da previsto na lei do imposto de renda, o que, em razão do princípio da estrita legalidade em matéria tributária (§6º do artigo 150 da Constituição Federal), não autorizaria a dedução.

A postura da Receita Federal fez com que muitos contribuintes buscassem na justiça o direito a dedução da base de cálculo do imposto de renda das contribuições extraordinárias, uma vez que a lei não faz qualquer restrição.

Em que pese não haver ainda manifestação do Superior Tribunal de Justiça sobre o assunto, em 2018, a Turma Nacional de Uniformização da Justiça Federal firmou a tese de que: "As contribuições do assistido destinadas ao saneamento das finanças da entidade fechada de previdência privada podem ser deduzidas da base de cálculo do imposto sobre a renda, mas dentro do limite legalmente previsto (artigo 11 da Lei nº 9.532/97)" [6].

Assim, há margem para buscar na justiça a dedução da base de cálculo do imposto de renda da pessoa física das contribuições extraordinárias de previdência, devendo ser observado o limite de 12% do total dos rendimentos computados na determinação da base de cálculo do imposto devido na declaração de rendimentos [7].

 


[1] Artigo 3º da Lei Complementar nº 109 de 2001.

[2] Artigo 19 da Lei Complementar nº 109 de 2001.

[3] Artigo 69. As contribuições vertidas para as entidades de previdência complementar, destinadas ao custeio dos planos de benefícios de natureza previdenciária, são dedutíveis para fins de incidência de imposto sobre a renda, nos limites e nas condições fixadas em lei.

[4] Artigo 8º A base de cálculo do imposto devido no ano-calendário será a diferença entre as somas:

I – de todos os rendimentos percebidos durante o ano-calendário, exceto os isentos, os não-tributáveis, os tributáveis exclusivamente na fonte e os sujeitos à tributação definitiva;

II – das deduções relativas:

e) às contribuições para as entidades de previdência privada domiciliadas no país, cujo ônus tenha sido do contribuinte, destinadas a custear benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social.

[5] ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA FÍSICA  IRPF EMENTA: CONTRIBUIÇÃO EXTRAORDINÁRIA A PLANO FECHADO DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR. INDEDUTIBILIDADE.

[7] Artigo 11 da Lei nº 9.532/1997. As deduções relativas às contribuições para entidades de previdência privada, a que se refere a alínea e do inciso II do artigo 8o da Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, e às contribuições para o Fundo de Aposentadoria Programada Individual (Fapi), a que se refere a Lei nº 9.477, de 24 de julho de 1997, cujo ônus seja da própria pessoa física, ficam condicionadas ao recolhimento, também, de contribuições para o regime geral de previdência social ou, quando for o caso, para regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos municípios, observada a contribuição mínima, e limitadas a 12% do total dos rendimentos computados na determinação da base de cálculo do imposto devido na declaração de rendimentos. (Redação dada pela Lei nº 10.887, de 2004)

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