Opinião

Averbação nos contratos de arrendamento de direitos minerários pela ANM

Autores

  • Orlando Mota Ribeiro

    é advogado mestre em Direito pela Ucsal-BA na linha de Direito Ambiental/Minerário pós-graduado em Direito Minerário pelo Cedin Educacional (MG) pós-graduado em Direito Tributário pelo Ibet MBA em Direito Executivo Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ) membro do Instituto Brasileiro de Direito Empresarial (Ibrademp) presidente da Comissão de Direito Minerário da OAB-BA e do Instituto Baiano de Mineração (Ibahm).

  • João Pedro França Teixeira

    é advogado pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho pela Faculdade Baiana de Direito master of laws em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ) pós-graduado em Direito Minerário pelo Cedin Educacional (MG) fundador e vice-presidente do Instituto Baiano de Mineração (Ibahm) e secretário-geral da Comissão de Direito Minerário da OAB-BA.

12 de julho de 2022, 9h09

O tema central deste artigo trata de uma insistente sobreposição de norma infralegal pelos agentes públicos vinculados à Agência Nacional de Mineração, qual seja: a exigência de averbação dos contratos de arrendamento constante na portaria nº 155/2016 (exarada ainda à época do Departamento Nacional de Produção mineral  DNPM), em que pese inexistir tal exigência na lei especial federal (Código de Minas).

Inicia-se com o seguinte questionamento: é lícito e razoável uma portaria criar uma exigência não prescrita em lei? Creio que não, porém o legislador entendeu pela sua razoabilidade!

O Código de Mineração não faz nenhuma menção ao instituto do arrendamento e sua necessidade de averbação. A única disposição próxima e de interpretação por analogia, vem do artigo 44, quando aduz que:

"A ANM estabelecerá em Resolução as hipóteses de oneração de direitos minerários e os requisitos e os procedimentos para a averbação de cessões, transferências e onerações de direitos minerários."

Em decorrência desta previsão, surgia na doutrina o seguinte questionamento: o contrato de arrendamento pode ser considerado um contrato oneroso? Caso assim possa ser considerado, traz-se à baila o disposto na Resolução nº 22/2020, editada pela própria Agência Nacional de Mineração:

"Artigo 2º Os prazos máximos para apreciação de requerimentos dos atos públicos de liberação das atividades econômicas sujeitos a aprovação tácita estão elencados no Anexo I a esta Resolução.
Anexo I 
— 
Solicitação de Oneração de direitos minerários —  120 dias."

É bastante razoável a necessidade de averbação do instituto do arrendamento no processo minerário, até para ciência, análise e homologação da autarquia sobre quem está realizando a lavra sobre bens de sua titularidade. Contudo, não se vislumbra essa exigência contida na Portaria nº 155/2016, como lícita por ausência de previsão expressa na legislação especial federal.

Ademais, volvendo à aprovação tácita mencionada na Resolução nº 22/2020 da ANM, faz-se remissão aos artigos 11 e 18 do Decreto nº 10.178/2019, mencionada no escopo da própria Resolução, que ventila:

"Artigo 11.  Para fins do disposto no §8º do artigo 3º da Lei 13.874, de 2019, o órgão ou a entidade não poderá estabelecer prazo superior a sessenta dias para a decisão administrativa acerca do ato público de liberação.
§1º O ato normativo de que trata o artigo 10 poderá estabelecer prazos superiores ao previsto no caput, em razão da natureza dos interesses públicos envolvidos e da complexidade da atividade econômica a ser desenvolvida pelo requerente, mediante fundamentação da autoridade máxima do órgão ou da entidade.
Artigo 18.  O prazo a que se refere o artigo 11 será:
I – de cento e vinte dias, para os requerimentos apresentados até 1º de fevereiro de 2021; e
II – de noventa dias, para os requerimentos apresentados até 1º de fevereiro de 2022."

Ou seja, no pior cenário, o empresário da mineração, caso tenha formalizado contrato de arrendamento dentro de qualquer processo minerário, terá um prazo máximo de 120 dias, para que este sinalagma contratual seja analisado, sob pena de incorrer em aprovação tácita.

E sobre a Lei 13.874/2019, mencionada no artigo 11 do Decreto nº 10.178/2019, cujo recorte segue acima, complementa-se para que não restem arestas interpretativas sobre o diploma:

"Artigo 3º São direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País, observado o disposto no parágrafo único do artigo 170 da Constituição Federal:
(…)
IX – ter a garantia de que, nas solicitações de atos públicos de liberação da atividade econômica que se sujeitam ao disposto nesta Lei, apresentados todos os elementos necessários à instrução do processo, o particular será cientificado expressa e imediatamente do prazo máximo estipulado para a análise de seu pedido e de que, transcorrido o prazo fixado, o silêncio da autoridade competente importará aprovação tácita para todos os efeitos, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em lei;
§8º O prazo a que se refere o inciso IX do caput deste artigo será definido pelo órgão ou pela entidade da administração pública solicitada, observados os princípios da impessoalidade e da eficiência e os limites máximos estabelecidos em regulamento."

O persistente tratamento inclinado à necessidade de averbação destes contratos de arrendamento acaba por suprimir as atividades mineiras, gerando custo de atraso e por via consequência inviabilizando o pleno emprego e fomento econômico da região, comprometendo a higidez das entidades empresarias com base em exigência contida em norma infralegal não prevista na lei especial. E os prejuízos não recaem apenas perante ao particular, como também à União, que também deixa de faturar através da renda gerada pela lucratividade do empreendimento.

Como bem leciona a doutrinadora Odete Medauar (in Direito Administrativo Moderno, p. 146, Editora Revista dos Tribunais, 5ª ed.) o princípio da legalidade traduz-se de modo simples na seguinte fórmula: "A Administração deve sujeitar-se às normas legais".

O princípio da legalidade, juntamente com o de controle judicial dos atos administrativos, nasceu com o Estado de Direito, e constitui uma das principais garantias ao respeito aos direitos individuais, haja vista que ao mesmo tempo que a lei define direitos, estabelece também os limites da atuação administrativa que tenha por objeto a restrição ao exercício de direitos em benefício da coletividade.

No ordenamento constitucional pátrio esse postulado além de se encontrar estampado no caput do artigo 37, está contido, ainda, no artigo 5º, inciso II, que assim preceitua: "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma senão em virtude de lei".

Não pode o minerador, que dispende vultuosas cifras na operacionalização da sua mina, ficar à mercê de uma exigência ilegal, padecendo da letargia do serviço público por todas as nuances notoriamente conhecidas por todo e qualquer cidadão brasileiro, no tocante à falta de funcionários efetivos, ausência de verba, abarrotamento processual, entre outros.

É vedada à Administração Pública, portanto, sob a justificativa de se encontrar atuando no exercício do poder regulamentar que lhe é conferido, contrariar o que está disposto na lei, nem criar direitos, impor obrigações, proibições ou penalidades que nela não estejam previstos, sob pena de flagrante ofensa ao princípio da legalidade (artigos 5º, inciso II, e 37, caput, da Lei Fundamental).

Autores

  • Brave

    é sócio do escritório Mota Ribeiro, Barbosa e França, presidente do Instituto Baiano de Mineração (IBAHM), mestrando em Direito pela Universidade Católica do Salvador, especialista em Direito Minerário pelo CEDIN-MG, MBA em Direito Executivo Empresarial pela FGV-RJ e pós-Graduado em Direito Tributário pelo IBET-BA.

  • Brave

    é advogado, sócio do escritório Mota Ribeiro, Barbosa e França, pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho, LLM em Direito Empresarial pela FGV, pós-graduando em Direito Minerário, vice-presidente da Comissão de Direito Minerário da OAB/BA, membro da Associação dos Advogados de São Paulo, membro do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor e vice-presidente do Instituto Baiano de Mineração (IBAHM).

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