quem viajou?

TSE abranda rigor para comprovar gastos com transporte aéreo fretado em campanha

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10 de agosto de 2022, 12h24

Uma semana antes do início da primeira campanha eleitoral presencial pós-epidemia da Covid-19, o Tribunal Superior Eleitoral resolveu abrandar os requisitos para a comprovação de gastos de recursos públicos feitos por candidatos em relação à contratação de transporte aéreo fretado.

Daniel Santos/Ascom Terracap
Jurisprudência exigia lista de passageiros dos voos para comprovar que gastos estavam vinculados aos atos de campanha
Daniel Santos/Ascom Terracap

A mudança foi feita no julgamento das contas de Ciro Gomes nas eleições de 2018, quando concorreu para presidente. O candidato contratou voos fretados, mas não apresentou à Justiça Eleitoral a lista das pessoas que utilizaram o transporte.

Esse é um requisito importante porque, até então, a Justiça Eleitoral exigia controle documental rigoroso das despesas com fretamento de aeronaves, em razão de seu elevado valor e da utilização de recursos públicos.

Além das notas fiscais referentes aos gastos com transporte aéreo fretado, a documentação relativa aos passageiros transportados deveria servir para comprovar que o dinheiro público foi efetivamente empregado em atos de campanha, nos quais não seria viável usar voos comerciais.

Ao TSE, a defesa justificou que não tem essa informação porque foram deslocamentos rápidos no transcurso da campanha, com um aparato de assessores e seguranças para dar suporte ao candidato em seus compromissos. 

Ao analisar as contas, a Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidárias (Asepa) do TSE glosou R$ 286,5 mil em gastos com companhias de transporte aéreo e recomendou a devolução do valor aos cofres públicos. A Procuradoria-Geral Eleitoral concordou, a partir da jurisprudência sobre o tema.

Relator, o ministro Sergio Banhos propôs uma interpretação diferente. Para ele, o cenário apresentado nas contas de Ciro Gomes é suficiente para afastar a exigência da lista específica de passageiros nos voos.

Isso porque o candidato apresentou notas fiscais e comprovantes de pagamento, detalhou os trechos percorridos e citou notícias indicando atos de campanha nesses locais. Com isso, não é exigível apresentação de lista de passageiro em cada deslocamento.

"Diversamente do que acontece com atividades cotidianas, a campanha à presidência exige diversos compromissos e constantes deslocamentos, a abranger até mais de um estado no mesmo dia. É razoável considerar a impossibilidade de usar voos comerciais, considerando o atual período eleitoral, com prazo mais diminuto", disse.

Gil Ferreira/Agência CNJ
Ministro Lewandowski votou por manter irregularidades na prestação de contas pela ausência da lista de pessoas que usaram voos
Gil Ferreira/Agência CNJ

Sigilo da campanha
O ministro Alexandre de Moraes concordou com a interpretação sugerida. Para ele, deve ser presumida a licitude da despesa e da vinculação com atos de campanha, diante da falta de comprovação da má-fé no uso da verba pública.

"Há reuniões politicas em que não é possível divulgar nome dos participantes. Alguém do partido foi tentar 'subtrair' aliança de outro partido. Tentar convencer algum líder partidário. Isso faz parte da campanha, mas não pode ser divulgado", exemplificou.

A posição foi acompanhada por maioria de votos. Também votaram no mesmo sentido os ministros Maria Cláudia Bucchianeri, Mauro Campbell, Benedito Gonçalves e Luiz Edson Fachin.

Abriu a divergência e ficou vencido o ministro Ricardo Lewandowski. Para ele, no primeiro momento os deslocamentos tratam de estratégia de campanha. No entanto, na prestação de contas, há o legítimo interesse em saber quem viajou, para onde e, principalmente, o motivo.

Destacou que o sigilo de transporte é excepcionalíssimo, uma vez que a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) obriga a disponibilização da lista de passageiros de todos os votos. Logo, não se justifica a Justiça Eleitoral abdicar dessa informação.

Além disso, o princípio da economicidade desaconselha o abrandamento do rigor com gastos tão custosos como de transporte aéreo. Havendo opções mais baratas e viáveis, não há porque usar o fretamento de aeronaves por mera conveniência, opinou o ministro Lewandowski.

"Pessoalmente, entendo que, no primeiro momento, o partido não é obrigado a revelar com quem os candidatos vão se encontrar. Isso é estratégia eleitoral. Mas depois, na prestação de contas, as despesas com fretamento de aeronave, seja quais forem, a sociedade quer saber", disse.

"Ainda que se entenda que essas reuniões podem necessitar de sigilo, é impensável que permaneça a confidencialidade após eleições. Realizado  o pleito, a pedra de toque deve ser a transparência, ainda mais quando se trata de processo final de prestação de contas", acrescentou.

Prestação de contas 0601227-40.2018.6.00.0000

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