A Lei nº 14.133/2021 e a indevida aglutinação de objetos em licitação
17 de dezembro de 2021, 8h00
A aglutinação de objetos de natureza distinta dentro de um mesmo item ou lote de edital de licitação, evidentemente, prejudica a competitividade.
O entendimento dos órgãos de controle interno e de controle externo é de que o gestor público precisa demonstrar, na instrução processual, os benefícios ou prejuízos de aglutinar ou separar objetos em parcelas distintas, do ponto de vista técnico e econômico, considerando que há sempre um objetivo de melhor aproveitamento das possibilidades do mercado.
Por exemplo, edital de pregão não pode aglutinar em um mesmo lote, inseparável, itens com serviços diversificados em custos, formação de preços e habilitações exigidas, como a locação de veículos leves (com ou sem motorista), o fretamento de ônibus para transporte de passageiros (esse mediante conformidade perante a Agência Nacional de Transporte Terrestre — ANTT), além de locação de máquinas pesadas para utilização em obras.
Em outro exemplo, não se pode aglutinar serviços profissionais jurídicos e de contabilidade, porque, além de regulações que assim não o permitem, os potenciais competidores atuam em seus nichos específicos, conseguindo as propostas mais vantajosas naquilo que possuem atuação, experiência e, reputa-se, habilitação perante as normas de regulação profissional.
Assim, não se pode juntar objetos desiguais alegando economia de escala ou facilidade de gestão de um só contrato.
Quando alegações desse tipo surgem, a primeira pergunta a se fazer é se a pesquisa prévia de preços considerou comparações "com ou sem" aglutinação dos objetos e se houve disparidade de quantidade de ofertantes em uma situação ou outra ou, ainda, quantos contratos anteriores de entes públicos tiveram aglutinados ou separados aqueles itens.
Uma das maiores falhas identificadas pelos entes de controle, quanto à etapa de planejamento, é a falta de visão para considerar esses fatores antes da alegação de se obter economia de escala.
Muitas vezes, isso nem sequer foi avaliado do ponto de vista comparativo e significa porta aberta para jogo de planilha nos valores dos serviços, alguns mais baratos e outros mais caros do que os de valores de mercado, exatamente porque não houve essa separação no planejamento e, depois, a competição real segmentada por empresas dos ramos próprios, ou seja, com poucas licitantes e com todo tipo de fórmula matemática para vitória que leva à uma contratação antieconômica.
Feitas essas considerações, cumpre frisar que, no tocante ao planejamento de compras, a nova Lei de Licitações, a Lei nº 14.133/2021, estabelece em seu artigo 40, inciso V, alínea "b", como princípio, entre outros, o do parcelamento, "quando for tecnicamente viável e economicamente vantajoso", dispondo sobre algo similar no seu artigo 47, inciso II, mencionando o princípio do parcelamento como obrigatório "quando for tecnicamente viável e economicamente vantajoso".
Importante complementar essas disposições iniciais com as sub regras aplicáveis.
No caso de compras, deve-se observar as ressalvas dos parágrafos segundo e terceiro do artigo 40 da lei:
"§2º. Na aplicação do princípio do parcelamento, referente às compras, deverão ser considerados:
I — a viabilidade da divisão do objeto em lotes;
II — o aproveitamento das peculiaridades do mercado local, com vistas à economicidade, sempre que possível, desde que atendidos os parâmetros de qualidade; e
III — o dever de buscar a ampliação da competição e de evitar a concentração de mercado.
§3º. O parcelamento não será adotado quando:
I — a economia de escala, a redução de custos de gestão de contratos ou a maior vantagem na contratação recomendar a compra do item do mesmo fornecedor;
II — o objeto a ser contratado configurar sistema único e integrado e houver a possibilidade de risco ao conjunto do objeto pretendido;
III — o processo de padronização ou de escolha de marca levar a fornecedor exclusivo".
No caso de serviços, as ressalvas estão no parágrafo primeiro do artigo 47 da lei:
"§1º. Na aplicação do princípio do parcelamento deverão ser considerados:
I — a responsabilidade técnica;
II — o custo para a Administração de vários contratos frente às vantagens da redução de custos, com divisão do objeto em itens;
III — o dever de buscar a ampliação da competição e de evitar a concentração de mercado".
Considerando que tais normas são para a fase preparatória da licitação, tem-se a conclusão de que gestores públicos precisam, realmente, atentar para a particularidade de solicitar cotações de preços ou buscar contratos similares com ou sem aglutinação de itens, porque se a pesquisa de preços já tiver sido direcionada previamente e tão somente para itens aglutinados os resultados podem ser fictícios e não realistas, não demonstrando a verdadeira vantajosidade para a Administração, ou seja, dentro de uma avaliação "com ou sem" aglutinação de objetos.
Essas ponderações parecem repetitivas, mas o fato de se ter na Lei nº 14.133/2021 a renovação das mesmas matérias evidencia a sua relevância, cabendo aos gestores públicos a observância das mesmas linhas jurisprudenciais contra o aglutinamento indevido e que alertam para o fato de que pesquisas de preços formuladas com essa base errada contaminam todo o processo.
A nova lei, basicamente, veio trazer uma disciplina mais detalhada, com parâmetros que vão auxiliar na segurança jurídica da tomada de decisão e na análise de controle dos processos licitatórios, quanto à temática de aglutinar ou parcelar objetos, de mesma natureza ou de natureza distinta.
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