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Especialistas discutem caminhos jurídicos para descarbonização

21 de agosto de 2021, 8h34

Por Redação ConJur

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A descarbonização da economia depende de alguns fatores: a viabilidade técnica, jurídica e econômica de uma descarbonização da matriz energética; abordagens transversais à redução de emissões de carbono; descarbonização da eletricidade; descarbonização dos combustíveis, políticas públicas, tributação e renováveis e transbordamentos na cadeia de valor.

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Cácia Pimentel (esq.) e Maria João Rolim
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Esse também é o tema do livro "Caminhos jurídicos para a descarbonização no Brasil" (ed. Forum, 2021), obra composta por artigos de diversos especialistas que refletem sobre quais caminhos necessários para que o Brasil faça a transição para ter uma energia limpa como sua principal matriz.

O material é fruto da coordenação da advogada Maria João Pereira Rolim e da professora e advogada Cácia Pimentel. Além disso, é um projeto desenvolvido em parceria com o Sabin Center of Climate Change Law, da Columbia University, de Nova York.

Quatro autores participantes do livro responderam a perguntas sobre o futuro da energia limpa no Brasil e no mundo.

Leia abaixo:

A questão ambiental não respeita fronteiras. Como a regulação transacional será feita? Por órgãos multilaterais como a ONU? Como ter uma aplicação efetiva numa situação dessa?
Maria João Pereira Rolim — A ideia de regulação transnacional de modo teórico exige a abstração da limitação do instrumento legal na esfera nacional e tendo o Estado como o único ente detentor do poder de regular. É preciso abraçar um conceito mais amplo e descentralizado que envolve todo o conjunto de ações e arranjos destinados a obter ou influenciar um comportamento coletivo, no senso global, para que se atinja um objetivo também posto como global.

É nesse contexto que todo arcabouço legislativo estabelecido pelas Nações Unidas se enquadra, mas também aqui se inclui tantas outras iniciativas privadas e voluntárias que têm como objetivo regular comportamentos e assim atingir metas relacionadas ao desafio global que o processo de mudanças climáticas se insere.

Assim como toda a regulação concebida em nível internacional, existe sem dúvida uma limitação relacionada ao aspecto de enforcement da ideia de regulação transnacional, como aqui colocada, e é exatamente nesse ponto que emerge a importância do princípio da cooperação.

Mas, da mesma forma, é imperioso que se abstraia da noção de cooperação adstrita a relação entre entes públicos para abraçar as diversas possibilidades que iniciativas privadas e voluntárias pensadas internacionalmente oferecem. 

Qual dos Poderes brasileiros terá o papel mais importante nas políticas de energia limpa?
Cácia Pimentel — Todos os poderes republicanos precisam estar harmonizados e engajados na descarbonização do país. O papel do Legislativo é fundamental. Hoje o Brasil possui um sistema normativo fragmentado, que exige reformas legislativas, inclusive sob o aspecto de uma reforma tributária verde e justa.

Sobre o Executivo, é certo que o Brasil precisa acordar para a importância do monitoramento e da avaliação periódica das políticas públicas. A recente Emenda Constitucional 109, de 2021, exige que órgãos e entidades da Administração Pública façam avaliação das políticas públicas, inclusive com divulgação do objeto a ser avaliado e dos resultados alcançados, proporcionando a possibilidade de se prospectar novos cenários, obter maior envolvimento da sociedade civil e extinguir políticas públicas ineficientes e que apoiam indústrias poluentes.

Por sua vez, o Judiciário pode pacificar interpretações divergentes e trazer a segurança jurídica necessária para novos investimentos nesta nova economia.

A tributação e a desoneração serão um dos principais caminhos para o fomento da energia limpa?
João Dácio Rolim — Sim, considerando que no Brasil a carga tributária sobre a atividade econômica é relevante, se não o maior custo dela, as desonerações tributárias seriam bem importantes, ao menos até um estágio econômico em que a energia limpa tenha superado as fontes fósseis e se tornando sustentável do ponto de vista econômico e social. Por outro lado, e em paralelo, seria importante também acabar com subsídios fiscais para a energia não renovável e tornando-as mais gravosas fiscalmente.

A Constituição não somente autoriza estas medidas, mas as impõe do ponto de vista tributário e ambiental, e na ausência de medidas legislativas mais concretas, estaria ocorrendo uma omissão constitucional grave do legislador, que poderia ser remediada por medidas judiciais, como tem ocorrido em alguns países em linha com o ordenamento constitucional de cada um dos países e princípios e standards consagrados em acordos internacionais.

Como a intersecção das ciências do Direito, economia e regulação pode colaborar para o processo de descarbonização no Brasil?
Alice Khouri — Os subsídios existentes na cadeia produtiva da energia no Brasil devem refletir o esforço conjunto da economia e da regulação para, em observância ao Direito, contribuir no alcance dos objetivos de sustentabilidade e descarbonização, assumindo uma concepção do interesse público que compreenda sustentabilidade, segurança, universalidade e acessibilidade.