Voto de Fachin sobre lista tríplice universitária contradiz decisão anterior
9 de outubro de 2020, 20h30
O ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, lançou voto determinando que o presidente da República nomeie como reitor e vice-reitor de universidade federal apenas o candidato mais bem colocado na lista tríplice. Segundo o ministro, tal nomeação deve atender a três requisitos; segundo um deles, a escolha deve recair "sobre o docente indicado em primeiro lugar na lista".
Fachin é relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade 6.565, que contesta o artigo 1º da Lei 9.192/92. O dispositivo — que altera a lei 5.540/68 e o Decreto Federal 1.916/96 — estabelece que a nomeação dos reitores deve ser feita pelo presidente por meio de lista tríplice. As normativas, no entanto, não afirmam que o escolhido deve ser aquele que encabeça a seleção interna organizada pelas instituições federais.
O julgamento, iniciado pelo Plenário virtual nesta sexta-feira (9/10), vai decidir se o fato de o presidente deixar de escolher o candidato mais bem posicionado na lista viola ou não o princípio da autonomia universitária, segundo o qual as instituições têm liberdade didática, científica, administrativa, de gestão financeira e patrimonial. Até o momento, foi registrado apenas o voto de Fachin. A conclusão do julgamento está marcada para o próximo dia 19.
O entendimento do ministro parece contrariar seus próprios posicionamentos anteriores. Em 2016, por exemplo, ele decidiu que "não há hierarquia" dentro da lista tríplice e que "o presidente pode escolher livremente o nomeado". Na ocasião ele foi relator do Mandado de Segurança 31.771.
No caso, um professor de uma universidade federal acionou o STF contra ato da Presidência da República que havia reconduzido uma professora à reitoria da instituição. No entendimento do autor, que integrava lista tríplice, ele deveria ser o reitor, pois teria a maior qualificação entre os três candidatos. Fachin, no entanto, denegou a segurança, justamente por entender que o presidente da República tem poder discricionário, respeitadas as limitações previstas pela respectiva legislação.
Especialistas ouvidos pela ConJur divergiram sobre o posicionamento mais recente de Fachin. Para eles, obrigar a nomeação de quem encabeça a lista acaba por invadir uma atribuição que é do presidente. Ao mesmo tempo, dizem, a autonomia das universidades deve ser respeitada.
De acordo com a constitucionalista Vera Chemim, os dispositivos impugnados na ADI não dispõem com absoluta clareza e precisão que o presidente deve escolher a primeira indicação da lista tríplice.
"O presidente da República tem o poder discricionário de realizar escolhas, desde que sejam acobertadas pelos critérios de necessidade e conveniência. Neste caso, ele pode escolher qualquer nome entre as três indicações mais votadas pelas instituições envolvidas, sem necessariamente afrontar o princípio da autonomia e a Constituição Federal", diz.
Ela ressalta que, do ponto de vista lógico, a escolha deveria recair sobre o primeiro indicado. Mas, graças ao poder discricionário, que é previsto constitucionalmente, nada impede que seja nomeado outro candidato da lista.
"Os dispositivos legais questionados pela ADI não padecem de inconstitucionalidade material, a menos que o STF venha a mudar a sua compreensão sobre o tema e criar uma nova jurisprudência visando emprestar maior precisão àqueles dispositivo, indo ao encontro da decisão de Fachin no sentido de manter a interpretação conforme a Constituição, e acrescentando a obrigatoriedade da escolha do primeiro nome da lista", prossegue.
Para Pedro Estevam Serrano, professor de Direito Constitucional, não faz sequer sentido formular uma lista tríplice se o presidente for obrigado a nomear apenas o indicado mais bem colocado.
"Não há sentido falar em lista tríplice quando se considera que há a obrigatoriedade de nomear o primeiro indicado. O presidente pode escolher qualquer um dos três. O que a Constituição e a lei estabelecem é um equilíbrio de vontades entre a soberania popular, representada pelo presidente, e a vontade da comunidade universitária, representada pelo conselho. Autonomia não é independência", diz.
Ele comentou, ainda, outros dois pontos do voto. No primeiro, Fachin define que o presidente não pode fugir da lista tríplice no momento de nomear os reitores e vice-reitores. No segundo, determina que a composição da lista deve ser respeitada, sem intervenções.
Os três pontos aos quais Serrano se refere, constantes do voto de Fachin na ADI, são:
"Medida cautelar parcialmente deferida, com efeitos a partir da data do protocolo ação, a fim de que a nomeação de Reitores e Vice-Reitores atenda concomitantemente aos seguintes requisitos: (I) ater-se aos nomes que figurem na respectiva lista tríplice; (II) respeitar integralmente o procedimento e a forma da organização da lista pela instituição universitária; e (III) recaia sobre o docente indicado em primeiro lugar na lista."
"A AGU deu um parecer buscando condicionar a decisão do colegiado universitário. O colegiado consulta a comunidade, mas não é obrigado a segui-la. A AGU quis obrigar o colegiado a adotar determinados critérios no momento de elaborar a lista tríplice. No entanto, a composição da lista é espaço de absoluta autonomia universitária e quem fala em nome da universidade é o colegiado. Então os itens um e dois da decisão estão corretos. O que está equivocado é o item três [que determina a nomeação do candidato mais bem posicionado]", afirma.
Já para o advogado Celso de Barros Correia Neto, sócio do Medeiros e Barros Correia Advogados e professor universitário, prestigiar a lista tríplice é dar maior efetividade ao princípio da autonomia.
"O artigo 207 da Constituição Federal é claro ao prescrever que as universidade gozam de autonomia: deve ser espaço de liberdade, aberto e plural. E todo o arcabouço normativo que lhe ampara deve estar estruturado no sentido desta diretriz", afirma.
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ADI 6.565
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