Consultor Jurídico

Ausência de lei faz Judiciário decidir sobre terceirização

21 de maio de 2014, 7h26

Por Mauricio de Figueiredo Côrrea da Veiga, Fabrício Trindade de Sousa, Luciano Andrade Pinheiro, Matheus de Figueiredo Corrêa da Veiga

imprimir

No dia 16 de maio de 2014, encerrou-se a votação no Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) que tratava da existência de repercussão geral do tema ementado pelo ministro Luiz Fux desta forma: Recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Ação civil pública. Possibilidade de terceirização e sua ilicitude. Controvérsia sobre a liberdade de terceirização. Fixação de parâmetros para a identificação do que representa atividade-fim. Possibilidade.

Por seis votos a três, o STF reconheceu a repercussão geral do tema e julgará, à luz da Constituição Federal, se as empresas podem ou não ajustar com terceiros a prestação de serviços, mesmo se inseridos na atividade finalística de seu empreendimento. Esse é um fato relevante, não só para o judiciário, mas para a vida de pessoas e empresas que desenvolvem atividade econômica no país. O STF decidirá, finalmente, se o dogma construído na justiça do trabalho é adequado à ordem constitucional, e se há exagero na condução desse tema pelas cortes trabalhistas, especialmente pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Mais uma vez o STF assume papel de protagonista em tema de vital importância para a população brasileira e que aguarda votação no Congresso Nacional. Diante da notória letargia do Poder Legislativo que sofre constantes pressões de ambos os interessados na solução da controvérsia, o Projeto de Lei 4.330, que disciplina a terceirização de serviços, caminha a passos lentos.

É sabido que a Súmula 331 foi concebida no TST como uma síntese dos precedentes verificados na Justiça do Trabalho diante do fenômeno da precarização das relações existentes, quando surge a figura de um terceiro na relação entre aquele que paga pela prestação dos serviços e aquele que efetivamente a presta. Também não é novidade que o fundamento legal e primordial das decisões que levaram ao verbete sumular é o art. 9º da CLT, que prescreve que “serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”.

A realidade enfrentada nos inúmeros precedentes que deram origem à Sumula 331 é a do trabalhador que se vê obrigado a submeter-se a uma fraude, com vistas a subtrair-lhe direitos trabalhistas típicos e ao mesmo tempo proporcionar ao empregador uma exploração econômica excessiva do trabalho e do próprio trabalhador, daí a aplicação do artigo 9º da CLT e a consequente anulação dos contratos e a conformação de vínculo de emprego direto com o tomador.

O que se deliberou chamar de “precarização das relações de emprego” como efeito direto da terceirização pode ser traduzida, entre outras, na diminuição dos salários, ausência de preocupação com a saúde e segurança do trabalhador e enfraquecimento das relações de índole coletiva.

A jurisprudência trabalhista tem finalidade nobre, mas a precarização se tornou, dentro do judiciário, uma premissa lógica e incontestável. Isto é, admite-se — aprioristicamente — que qualquer relação estabelecida entre uma empresa e uma prestadora de serviços causa diminuição de salários, de benefícios, traz riscos ao trabalhador e enfraquece as negociações coletivas.

Nos parece que é justamente nesse ponto que reside o tropeço do verbete e que será alvo de julgamento no STF. Afinal, determinar que qualquer relação jurídica firmada com uma pessoa jurídica para execução de atividade específica é ilegal — se dentro da atividade-fim do tomador — inverte a própria lógica do direito, porque não é possível partir-se dessa realidade; é preciso investigar se ela existe.

Com efeito, a Justiça do Trabalho sempre se preocupou em distinguir atividade-fim e atividade-meio como método para considerar válida a terceirização de serviços. Porém, muito mais relevante do que encontrar critérios filosóficos para se definir uma e outra atividade é investigar se há ou não precarização do trabalho.

Há outro ponto crucial na discussão, que pelo voto do Ministro Luiz Fux também será alvo de julgamento pelo STF: a fixação do que vem a ser atividade-fim de uma empresa. A análise feita pelo judiciário trabalhista, especialmente nas ações civis públicas em que se pleiteia a proibição da terceirização, costuma ultrapassar limites de razoabilidade, porque baseadas exclusivamente em interpretação com forte carga ideológica dos objetos sociais das empresas. Todavia, em uma situação tão delicada quanto a terceirização, não é uma análise cartesiana que definirá a validade ou não da terceirização.

Existem inúmeros exemplos de terceirização de atividades finalísticas de uma empresa que são lícitas e muitas das vezes sequer questionadas por empregados ou sindicatos da categoria. À guisa de exemplo podem ser citadas as montadores de automóveis que em seus próprios pátios contam a prestação de serviços de empresas terceirizadas para instalação de equipamentos indispensáveis para o funcionamento de um veículo.

Mais uma vez, será necessária a intervenção do Poder Judiciário, tendo em vista a inércia do Poder Legislativo.