No próximo dia 7, os desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo escolherão seus novos dirigentes, que ficarão no cargo pelos próximos dois anos. No Judiciário, a vice-presidência é tão concorrida quanto o cargo principal, de presidente. Isso porque diferentemente do que ocorre no Executivo, a vice-presidência do Judiciário paulista é ocupada pelo candidato mais votado, e não por aquele eleito concomitantemente com o presidente. Ou seja, não há uma chapa. É cada um por si. A regra vale para todos os cargos em disputa.
Para as próximas eleições, concorrem ao posto de vice três desembargadores: Caio Eduardo Canguçu de Almeida, Roberto Antônio Vallim Bellocchi e Antônio Carlos Munhoz Soares.
Pelo regimento interno do TJ, a vice-presidência é um cargo de direção, junto com o do presidente e do corregedor-geral. Compete ao vice, entre outras funções, despachar recursos extraordinários e especiais em matéria cível contra acórdãos do Órgão Especial e da Câmara Especial, despachar mandados de segurança impetrados contra o presidente, o segundo, o terceiro e o quarto vices e o corregedor-geral e executar as decisões do Órgão Especial.
Evidente, então, que a tarefa de quem for eleito ao posto não é fácil. Mais ainda se for levado em conta que o Tribunal de Justiça paulista é um dos mais congestionados do Brasil, com maior número de processos e, consequentemente, maior lentidão. Nessa morosidade, qualquer sugestão vinda do vice será bem vinda.
A Consultor Jurídico conversou com os candidatos para traçar um perfil de cada um, saber os projetos para o tribunal, opiniões e carreira na magistratura. Foram discutidos pontos que estão em alta: eleições no Órgão Especial, aposentadoria compulsória, salários dos juízes, orçamento do Judiciário, entre outros. Para eles, a verba destinada ao TJ é insuficiente e juiz ganha pouco sim.
Apenas o candidato Antônio Carlos Munhoz Soares não quis falar com a reportagem da Consultor Jurídico. A entrevista foi agendada, o desembargador recebeu a repórter mas se recusou a falar. Como um “homem da lei”, explicou o desembargador, é a esta que deve respeito. “Jornal por jornal, todo dia aparece um novo”, sentenciou.
Orçamento e informatização
As principais falhas do Judiciário paulista, na visão do desembargador Caio Eduardo Canguçu de Almeida, são o baixo orçamento e o sistema de informatização do tribunal. São esses os dois pontos para os quais pretende voltar suas atenções se for eleito para a vice-presidência do TJ paulista.
Para o desembargador, o orçamento de R$ 4 bilhões é a metade do necessário para o tribunal, já que a dívida do TJ chega aos R$ 2 bilhões. Para resolver esse problema, afirma, seria necessário contratar uma equipe de especialistas para estudar o caso e negociar com os poderes Executivo e Legislativo.
Quanto à informatização, Canguçu de Almeida reconhece que ela ainda é fraca na Justiça Estadual e, se fosse adequada, agilizaria consideravelmente o trabalho no tribunal. “O ideal é integrar toda a Justiça Estadual”, acredita.
Essa é a primeira vez que Caio Eduardo Canguçu de Almeida é candidato a algum cargo no TJ-SP. Aos 66 anos, faz parte do Órgão Especial, formado pelo 24 desembargadores mais antigos e pelo presidente. Como um dos 12 mais novos do Órgão Especial, corre o risco de perder o posto quando for aplicado o princípio instituído pela Reforma do Judiciário de que metade de Órgão Especial deve ser eleita. Nem por isso é contra a imediata aplicação da medida, mediante regulamentação do próprio tribunal.
“Na sessão em que o Órgão Especial analisou a questão, eu votei contra a regulamentação interna e a favor de esperar a Lei Orgânica da Magistratura para definir as normas”, explica. Seu voto foi o mesmo da maioria e os desembargadores decidiram esperar. No entanto, diante da demora da Loman, Canguçu de Almeida mudou de idéia. “Temos de aplicar a legislação. Já que a Loman não vem, que seja então por resolução interna do tribunal.”
Ele é a favor também da aposentadoria compulsória aos 75 anos, mas com algumas restrições. Para Canguçu de Almeida, a partir dos 70 anos, o desembargador deveria ser submetido a uma análise para saber se tem condições físicas e intelectuais de continuar na magistratura. “Existem juízes que estão no auge intelectual aos 70 anos, mas o tribunal também não deve ser obrigado a manter até os 75 aqueles que não têm mais aptidão”.
Canguçu de Almeida resolveu se candidatar à vice-presidência para contribuir com o aprimoramento do Judiciário. Sabe, no entanto, que, se for eleito, sua rotina mudará, mas não se incomoda com isso. Ele, que mora em Campinas, a 100 quilômetros de São Paulo, terá de vir todos os dias para o tribunal. Hoje, ele só vem quando tem sessão ou algum compromisso agendado.
O desembargador se formou na PUC — Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em 1963 e foi premiado como o melhor aluno do curso. Em 1967, com 26 anos, ingressou na magistratura. Foi promovido a desembargador em 1988 e, desde maio do ano passado, integra o Órgão Especial. Em casa, longe das formalidades da magistratura, Canguçu de Almeida é apenas pai de cinco filhos (dois juízes e dois advogados) e avô de nove netos. Seu hobby é a sua profissão. “É por isso que eu não me aposento”, declara.
Modernização da Justiça
Aos 65 anos, o desembargador Roberto Antônio Vallim Bellocchi é o presidente da Seção de Direito Público do TJ paulista, cargo que antes era denominado como a 4ª vice-presidência. Ele foi eleito para a função em 2002 e reeleito em 2003.
Se for eleito para a vice-presidência, faz parte dos seus planos incentivar a modernização do tribunal, que ele se orgulha de dizer que é o maior da América Latina. O desembargador, no entanto, se preocupa com a verba destinada para o Judiciário paulista. Sem dinheiro suficiente, argumenta, não há como se promover essa modernização necessária para a sociedade.
Vallim, que ocupa o Órgão Especial já há cinco anos, foi um dos desembargadores que votou pela eleição imediata para a metade das vagas do Órgão. “O tribunal tem condições de regulamentar a medida e aplicar as eleições o mais rápido possível, fazendo valer aquilo que está determinado na Reforma do Judiciário.” Como parte da metade dos desembargadores mais antigos, ele não corre o risco de perder sua cadeira, mas garante que isso não influencia sua posição, já que quer fazer valer a Constituição.
O desembargador entrou na magistratura aos 25 anos, em 1966, um ano após se formar na PUC — Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Para ele, essa deve ser a idade mínima para que um bacharel possa ser nomeado juiz. Defende, também, a aposentadoria compulsória aos 75 anos. “É o tempo que forma o magistrado”, acredita.
No TJ já há 21 anos, Vallim considera que os juízes, principalmente aqueles no início de carreira, ganham pouco. Para ele, isso desestimula o ingresso na carreira. “O juiz tem de ser remunerado dignamente”, defende. O desembargador acredita, também, que o Judiciário como um todo é mal interpretado e culpado pelos problemas do país, posição essa que deve mudar. “Os juízes têm um trabalho desumano, muito pesado, e ainda são mal compreendidos. Mas é importante ressaltar que juiz também é humano, sofre e tem alegria, ou seja, passa por todas as coisas como qualquer outro”, compara. Roberto Antônio Vallim Bellocchi é viúvo, pai de dois filhos e avô de uma neta.