Ação militar

Intervenção no Rio é decretada por Temer, mas questão está na pauta do Supremo

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16 de fevereiro de 2018, 13h08

O presidente Michel Temer assinou, no começo da tarde desta sexta-feira (16/2), decreto que autoriza a União a intervir na segurança do Rio de Janeiro. A medida — inédita desde a Constituição de 1988 — agora precisa ser aprovada pelo Congresso. No entanto, além do Executivo e do Legislativo, a definição sobre a questão também caberá ao Judiciário: um pedido de intervenção federal no Rio foi liberado para julgamento pela 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal. 

Tomaz Silva/Agência Brasil
Forças Armadas assumirão a segurança pública do estado do Rio de Janeiro.
Reprodução

Com isso, o comando da segurança pública do Rio será transferido às Forças Armadas. Policiais civis e militares e bombeiros responderão ao comandante militar do Leste, general Walter Souza Braga Netto. O secretário de Segurança fluminense, Roberto Sá, foi afastado do cargo.

O artigo 34 da Constituição estabelece que a União só pode intervir nos estados ou no Distrito Federal para manter a integridade nacional; repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da federação em outra; acabar com grave comprometimento da ordem pública; garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da federação ou a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial.

Além disso, cabe intervenção federal para reorganizar as finanças de estado que suspender o pagamento de dívida por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força maior, ou deixar de entregar aos municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição, dentro dos prazos estabelecidos em lei e para assegurar de princípios constitucionais como forma republicana, sistema representativo e regime democrático; direitos da pessoa humana; autonomia municipal; prestação de contas da Administração Pública e aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.

O decreto de intervenção deve indicar a amplitude, o prazo e as condições da intervenção e, se cabível, nomeará um interventor para o estado. A norma deverá ser submetida à apreciação do Congresso ou da Assembleia Legislativa do estado em até 24 horas.

Uma vez aprovada a intervenção, a Constituição não pode receber nenhuma emenda enquanto ela estiver em vigor. Como o decreto prevê a intervenção até 31 de dezembro, a ação no Rio deve sepultar, por ora, a reforma da Previdência — a não ser que ela seja suspensa, o Congresso a vote e a operação seja restabelecida.

Quando a situação que motivou a intervenção for regularizada, as autoridades afastadas de seus retornarão a eles, exceto se houver algum impedimento legal.

Ação no STF
Um outro pedido de intervenção federal no Rio de Janeiro foi liberado para julgamento pela 2ª Turma do Supremo no dia 2 de fevereiro. Em 2016, pouco antes das Olimpíadas, o advogado Carlos Alexandre Klomfahs apresentou petição à Procuradoria-Geral da República pedindo representação do órgão quanto a esse assunto na corte.

Segundo o advogado, o aumento da criminalidade, as mortes de policiais e o atraso no pagamento de salários de servidores estaduais mostram que a ordem pública está comprometida, e direitos humanos estão sendo violados.

O então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, manifestou-se pelo arquivamento da representação. De acordo com ele, não havia situação excepcional a justificar a intervenção.

Contudo, Klomfahs impetrou mandado de segurança contra a decisão de Janot. Para o advogado, o PGR agiu de forma ilegal ao colocar em segundo plano a segurança dos cariocas e dos turistas que iriam visitar o Rio para os Jogos Olímpicos.

A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, negou o MS. Diante disso, Klomfahs interpôs agravo interno. No recurso, o advogado alegou que a decisão da magistrada não foi fundamentada e que, pela importância do caso, ele deveria ser analisado por órgão colegiado.

Em novo parecer, Janot destacou que cabe ao chefe do Ministério Público Federal propor a intervenção de um estado ao STF, conforme o artigo 129 da Constituição. Além disso, ele ressaltou que só o PGR pode avaliar os fatos apresentados e ponderar sobre a viabilidade jurídica de se requerer a implementação de “medida profundamente cerceadora da autonomia federativa do estado do Rio de Janeiro”.

Na visão de Janot, a insistência de Klomfahs pela revisão do entendimento da PGR “significaria destoar do plexo de competências criado pela Constituição Federal”. O então procurador-geral também apontou que a indispensabilidade do advogado na administração da Justiça não significa que ele tenha poder para defender direitos difusos.

“Se isso, de fato, procedesse, ao advogado caberia litigar contra quem fosse, não obstante a qualificação da parte a quem representa. O advogado é porta-voz do representado e só pode pleitear uma dada situação jurídica minimamente compatível com a parte detentora e veiculadora de direitos subjetivos”, opinou Janot.

Ele não negou “a existência de sérias violações ao direito da pessoa humana, banalização da vida e graves limitações orçamentárias das autoridades locais”. No entanto, Rodrigo Janot declarou que “essas falhas administrativas já estão instaladas na rotina do estado do Rio de Janeiro há anos, assim como em outras regiões do país”. Assim, não dá para considerar que o governo fluminense perdeu o comando e nomear um interventor. Dessa maneira, ele opinou pela rejeição do agravo interno.

Histórico do Supremo
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, o STF nunca aprovou uma intervenção em um estado. Conforme entendimento firmado durante o julgamento de vários pedidos, o Supremo definiu que a intervenção é uma medida extrema, e que deve haver prova da continuidade da crise institucional para ser decretada. 

A PGR pediu intervenção em Rondônia, em 2008, por uma crise em seu sistema prisional. Outros pedidos de intervenção por falta de pagamento de precatórios e reintegração de posse foram rejeitados pelo STF.

Em 2010, após a prisão do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda, o então procurador-geral da República Roberto Gurgel não conseguiu aprovação do Supremo para intervenção. Na época, a Polícia Federal desencadeou a chamada operação caixa da pandora, investigação que apurou a existência de um esquema de compra de apoio parlamentar na Câmara Legislativa do Distrito Federal, que ficou conhecido como mensalão do DEM.

*Texto atualizado às 14h34 do dia 16/2/2018 para acréscimo de informações.

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