Prisão por planejar atentado inaugura parte polêmica de Lei Antiterrorismo
22 de julho de 2016, 19h26
As prisões feitas pela Polícia Federal de suspeitos de terrorismo foram as primeiras usando a Lei Antiterrorismo (Lei 13.260/2016). Além disso, os homens presos se enquadraram num aspecto inovador da norma: a punição de planejamento de atentado. Classicamente no Direito só é punível que coloca em prática um crime. A nova legislação diz que é possível punir o planejamento.
Para o criminalista Fernando Augusto Fernandes, as prisões foram ilegais, já que a lei não traz a tipificação de quais atos são considerados como planejamento de atentados. Para ele, do jeito que a legislação está, é preciso que o tenha começado de alguma forma para ser punido.
“A Lei Antiterrorismo pune os atos preparatórios, mas falha ao não tipificar quais são esses atos. Assim, somente o início do cometimento de algum crime poderia ser punido. Para que a prisão fosse válida, no meu ponto de vista, os suspeitos deveriam ter iniciado algum tipo penal. O fato de alguém pesquisar na internet a compra de uma arma não é crime, justamente por não iniciado a compra. A pessoa teria de iniciar uma ação tipificada para ser presa. A entrevista do ministro da Justiça deixa claro que não houve ação e, portanto, não houve ato preparatório", afirma Fernandes.
Autor x Fato
O juiz federal Ali Mazloum escreveu recentemente sobre esse tema na revista eletrônica Consultor Jurídico. No plano clássico do Direito, ele afirma que aquele que cogita matar seu inimigo e declara essa intenção, elabora plano, traça rota de fuga, compra arma de fogo, ainda não cometeu atos puníveis do crime de homicídio e nada pode ser feito para puni-lo.
Mazloum ressalta, porém, que o espírito do tempo exigiu que novas medidas fossem tomadas, para que punir quem planeja atentado. Nesse momento, entra-se em terreno acidentado: “Diante de alguma ambiguidade do pensamento expresso, não se pode optar pelo Direito Penal do Autor segundo a raça, cor ou credo do interlocutor. Deve-se investigar os fatos, cumprir o ditame constitucional do Direito Penal do Fato, para não se apontar em vão o dedo contra minorias e com isso contribuir para espalhar o ódio em nosso país”, escreveu o juiz.
Processo elástico e onipresente
Ruchester Marreiros Barbosa, delegado da Polícia Civil, também abordou o tema, em uma de suas colunas na ConJur. Sobre a tipificação penal do ato preparatório do atentado, ele afirmou que o legislador quer criar um processo penal elástico ou onipresente. “Não sabemos como se posicionará a doutrina e jurisprudência quanto a este dispositivo, mas parece que se for firmado entendimento viabilizando-o juridicamente, sua aplicação somente seria possível se fosse aplicada uma interpretação retrospectiva para se determinar uma espécie de prevenção para crimes antecedentes em razão do processo pelo crime de 'ato preparatório terrorista', para utilizarmos nosso exemplo”.
Gravidade do plano
Sobre a punição da preparação do atentado, os delegados Henrique Hoffmann Monteiro de Castro e Adriano Sousa Costa fizeram, em artigo na ConJur, distinção das penas para atos preparatórios imediatamente anteriores, atos preparatórios distantes e atos preparatórios remotos.
“Caso o agente pratique atos preparatórios imediatamente anteriores ao verbo nuclear do terrorismo, e não ocorrer a consumação por circunstâncias alheias à sua vontade, incide a tentativa antecipada (artigo 5º, caput – pena do crime consumado reduzida de 1/4 a 1/2). Já se o indivíduo abandonar voluntariamente a empreitada criminosa, ocorre a desistência voluntária ou arrependimento eficaz antecipados (artigo 10 – responde pelos atos praticados)”, explicaram os delegados.
Caso o agente pratique atos preparatórios distantes, o sujeito fica livre da responsabilidade penal. “Pense no exemplo: o sujeito aluga um apartamento pensando em, futuramente, criar um centro de treinamento de terroristas”, apontaram.
Já se os atos preparatórios remotos forem incriminados por tipo penal específico, a pessoa responderá pelo crime-obstáculo correspondente. “Visualize o exemplo: o indivíduo mantém em sua casa arma de fogo de uso permitido com o fim de, futuramente, apoderar-se de uma aeronave para provocar terror generalizado em razão de preconceito de cor. Responde pelo crime do artigo 12 do Estatuto do Desarmamento”, mostraram Hoffman e Sousa Cosa.
Preventiva, como as outras
Outro aspecto analisado por especialistas é a presença dos elementos para se manter os suspeitos presos. Para Francisco de Paula Bernardes Jr, criminalista do escritório Guillon & Bernardes Jr. Advogados e professor da Faap, as regras da prisão processual devem valer, igualmente, para todos os acusados, independentemente da acusação. “Nesse sentido, só se pode manter alguém processualmente preso quando presentes os requisitos da prisão temporária ou mesmo da prisão preventiva, previstos na legislação”, diz.
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