Críticas ao projeto

Sem mudança na cultura do litígio, mediação não basta, dizem professores da USP

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23 de novembro de 2014, 15h37

A mediação não deve ter o objetivo de desafogar o Judiciário, mas de mudar a cultura do litígio. A opinião é o do professor Kazuo Watanabe, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, crítico da forma como a modalidade de solução de conflito vem sendo implementada no Brasil.

A avaliação foi feita durante o seminário sobre mediação e arbitragem, promovido pelo Conselho da Justiça Federal, em Brasília, na sexta-feira (21/11). No painel conduzido pelo ministro Marco Buzzi, do Superior Tribunal de Justiça, o professor Kazuo Watanabe  discutiu o tema “Aspectos gerais do marco legal” com a também professora da USP Ada Pellegrini Grinover.

“O Judiciário ainda está utilizando a mediação e a conciliação como meio alternativo para reduzir estoque de processos. É preciso adotar uma nova cultura, que encontre meios adequados de solução de conflitos, e não alternativos”, afirmou Watanabe.

A professora Ada Pelegrini criticou incisivamente o Projeto de Lei 7.169/2014. “A tardia ressurreição das nossas práticas conciliativas está ameaçada. O marco regulatório da mediação judicial não é esse projeto de lei”, disse. Para ela, a proposta que tramita na Câmara dos Deputados entra em conflito com as regras inseridas no projeto do novo Código de Processo Civil referentes ao tema.

Para os dois acadêmicos, o marco ideal era a Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça, cuja ideia era exemplar, mas que teve falhas em sua implementação. Os centros de solução de conflitos, segundo eles, nunca saíram do papel em muitos tribunais, e os que foram criados carecem de estrutura básica para funcionar.

Lentidão e desconfiança
No debate “Temas Controvertidos na Futura Lei de Arbitragem”, os palestrantes apontaram que a lentidão do sistema judicial brasileiro é uma das razões para a ampliação das práticas de conciliação, mediação e arbitragem no país. O debate foi mediado pelo ministro do Villas Bôas Cueva, do Superior Tribunal de Justiça, e contou com as participações do diretor da Faculdade de Direito da USP, professor José Rogério Cruz e Tucci, e do professor de Direito Civil Otávio Luiz Rodrigues Júnior, também da USP.

Os dois professores concordam que o pacto da mediação pode ser utilizado em inúmeras situações, envolvendo agências reguladoras, seguradoras de planos de saúde e  administração pública. Com a nova legislação, que ainda precisa ser aprovada no Congresso, o processo de arbitragem pode estar presente nas relações de consumo e nas trabalhistas e ser utilizada mais amplamente na área societária.

O professor Rodrigues Júnior lembrou que o Brasil passou por um processo similar a vários países quanto à aceitação da Lei de Arbitragem (Lei 9.307/96), em fases oscilantes de confiança e desconfiança. Ele acrescentou que, apesar disso, a lei se faz necessária.

Quando foi criada a atual Lei de Arbitragem, em 1996, o Brasil estava num contexto em que se discutia a inserção do país na política neoliberal. Os críticos aventavam uma possível privatização do Poder Judiciário, lembra Rodrigues Júnior. “Hoje percebemos que o projeto se ajusta claramente a uma necessidade social, independentemente de ideologias”, disse.

Para que a nova Lei de Arbitragem funcione, o professor Tucci entende que deve haver uma mudança cultural e de paradigma em relação ao comportamento do brasileiro diante do Judiciário. Mesmo diante de um crescente número de demandas resolvidas por arbitragem, no estágio atual ele acredita que não seria um mecanismo capaz de diminuir de fato o volume de causas levadas aos tribunais.

 “Enquanto continuarem sendo levadas aos tribunais questões que de antemão já se reconhece o resultado, não haverá solução para a lentidão. Nosso problema não é de legislação, mas de gestão e de cultura”, diz.

Experiência estrangeira
A discussão sobre o marco regulatório da mediação prosseguiu no debate mediado pelo ministro do STJ Mauro Campbell Marques. A experiência internacional na mediação foi apresentada pela advogada Juliana Loss de Andrade, que trabalha com mediação na Europa, onde faz doutorado na Universidade Paris-Sorbonne.

Segundo ela, embora a mediação esteja mais avançada na Europa, com legislação em vigor, muitos países enfrentaram os mesmos entraves do Brasil. Juliana Loss aponta que ter um marco legal é muito positivo e que, quando aprovado, isso vai refletir no maior uso da mediação.

No mesmo painel, a advogada Roberta Rangel, mestre em direito tributário, discorreu sobre as dificuldades de mediação com o poder público. Como a administração pública é parte em mais de 70% das ações que tramitam na Justiça, a tributarista reclama que muitos conflitos são simples e poderiam ser resolvidos por meio de mediação, ainda em âmbito administrativo. Com informações da Assessoria de Imprensa do CJF.

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