Tornozeleira e pulseira

Monitoração eletrônica deve ser aplicada

Autor

  • é procurador de Justiça (MP-SP) mestre em Direito das Relações Sociais (PUC-SP) especialista em Direito Penal (ESMP-SP) professor e palestrante autor de diversas obras jurídicas dentre elas: Comentários à Lei de Execução Penal Manual de Direito Penal Lei de Drogas Comentada Estatuto do Desarmamento Provas Ilícitas e Tutela Penal da Intimidade publicadas pela Editora Juruá.

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30 de junho de 2010, 6h16

Uma das grandes dificuldades existentes nas Varas das Execuções Criminais é justamente o controle do sentenciado que tem deferido algum tipo de benefício, como o regime aberto, o livramento condicional ou a saída temporária.

Os métodos de fiscalização empregados são arcaicos e não possibilitam qualquer controle mais apurado. Geralmente, a fiscalização é feita pelo comparecimento do sentenciado ao setor de fiscalização e a ausência de cometimento de delitos.

O Estado tem o dever de fiscalizar o cumprimento da pena e o sentenciado a obrigação de se comportar adequadamente. A monitoração eletrônica nada mais é do que um método de controle da pena imposta ao sentenciado que se encontra fora da unidade prisional.

Depois de muitos anos de discussão, foi publicada a Lei 12.258, de 15 de junho de 2010, que alterou a Lei de Execuções Penais e instituiu em nosso ordenamento jurídico a monitoração eletrônica de sentenciados.

A monitoração geralmente é feita por aparelho afixado ao corpo do sentenciado em forma de pulseira ou tornozeleira. O dispositivo fornece informações necessárias à fiscalização, tais como localização do sentenciado e o respectivo horário. Para não impor desnecessário gravame, deve ficar o mais escondido possível.

A seção VI, do Capítulo I, do Título V da Lei de Execuções Penais, trata da monitoração eletrônica dos sentenciados. Outras alterações pontuais foram feitas nesta lei para adequar à legislação o emprego do meio eletrônico de controle dos condenados.

A fiscalização por meio eletrônico poderá ser imposta quando o juiz: 1) autorizar a saída temporária; 2) determinar a prisão domiciliar (artigo 146-B, da LEP).

Cuidando-se do cumprimento de pena privativa de liberdade no regime aberto, caso não exista na comarca casa do albergado ou estabelecimento congênere, é possível a determinação da prisão albergue domiciliar (PAD), ocasião em que o condenado cumprirá a pena em sua residência. Isso porque é função do Estado propiciar os mecanismos para a execução da pena, não podendo o condenado cumpri-la em regime diverso do estipulado por negligência estatal. Nesta hipótese, a fiscalização do cumprimento da pena se limitava ao comparecimento periódico do sentenciado ao setor de fiscalização para justificar suas atividades e à ausência da prática de crimes. Com a monitoração eletrônica, a fiscalização poderá ser feita adequadamente.

Também poderá ser determinada a monitoração eletrônica quando for imposto o regime aberto domiciliar nas hipóteses previstas no artigo 117 da LEP, ou seja, quando se tratar de: 1) condenado maior de 70 anos; 2) condenado acometido de doença grave; 3) condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; 4) condenada gestante.

As saídas temporárias dos presos que se encontram no regime semiaberto também poderão ser monitoradas eletronicamente. São situações que merecem especial controle, uma vez que o apenado ainda se encontra recluso, mas com alguma liberdade. Muitos condenados cometem crimes nestas ocasiões ou não retornam às suas unidades prisionais. Com o controle eletrônico, será possível uma fiscalização mais eficaz do cumprimento do benefício.

A competência para a determinação da monitoração será do Juízo da Execução, uma vez que cabe a ele autorizar as saídas temporárias e determinar o cumprimento da pena em regime aberto domiciliar.

Quando da aplicação de pena que implique o uso de meio eletrônico de monitoração o sentenciado será instruído acerca dos cuidados que deverá adotar com o equipamento e dos seguintes deveres: I – receber visitas do servidor responsável pela monitoração eletrônica, responder aos seus contatos e cumprir suas orientações; II – não violar, remover, modificar, danificar de qualquer forma o aparelho ou permitir que terceiro o faça (artigo 146-C, caput, I e II, da LEP).

A violação comprovada de ao menos um dos deveres impostos ao sentenciado em relação à monitoração eletrônica poderá acarretar, a critério do Juiz da Execução: 1) a regressão de regime; 2) a revogação da autorização de saída temporária; 3) a revogação da prisão domiciliar; 4) advertência, por escrito, para todos os casos em que o Juiz da Execução decida não aplicar algumas das medidas mais severas (artigo 146-C, parágrafo único, I, II, VI e VII, da LEP).

Em todas as hipóteses em que haja suspeita de violação dos deveres impostos ao sentenciado, antes da decisão judicial, será necessária a oitiva do Ministério Público e da Defesa, a fim de ser preservada a ampla defesa e o contraditório.

Poderá haver a revogação da monitoração: 1) quando se tornar desnecessária ou inadequada; 2) se o acusado ou condenado violar os deveres a que estiver sujeito durante a sua vigência ou cometer falta grave (art. 146-D, da LEP).

Não mais havendo necessidade da monitoração por qualquer motivo ou sendo ela inadequada para aquela situação, poderá ser revogada.

Cuidando-se de violação dos deveres impostos ao sentenciado (artigo 146-C, caput, I e II, da LEP) ou ocorrendo falta grave (artigos 50 e 52, da LEP), a monitoração também poderá ser revogada. Aliás, presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, poderá ser determinada pelo Juiz da Execução, com fundamento no poder geral de cautela, a sustação cautelar da monitoração, para, após a regular apuração dos fatos, ser procedida a decisão sobre a revogação. Advindo a revogação da monitoração, o Juiz, ao analisar o caso concreto, poderá aplicar as penalidades previstas no parágrafo único do artigo 146-C da LEP.

Embora o artigo 146-D, II, da LEP, também se refira a “acusado”, a monitoração eletrônica não alcança a pessoa processada, mas que ainda não tenha sido condenada definitiva ou provisoriamente. Somente será possível a monitoração eletrônica quando houver execução de sentença condenatória definitiva ou provisória. Portanto, o preso que possua condenação definitiva ou provisória pode ser monitorado eletronicamente. Já a pessoa presa cautelarmente, mas ainda sem condenação, não pode receber benefícios que impliquem a monitoração eletrônica.

A competência para a revogação da monitoração será do juiz das Execuções Criminais. Cabe a ele, ao analisar o caso concreto, decidir sobre a revogação e, se o caso, a medida que será aplicada dentre as previstas no parágrafo único, do artigo 146-C, da LEP.

O Poder Executivo de cada unidade da Federação (Estados e Distrito Federal) regulamentará a implementação da monitoração eletrônica (artigo 3º da Lei 12.258/2.010). A competência para legislar sobre direito penitenciário é concorrente entre a União e os Estados. A União dispôs sobre as normas gerais, ao passo que os Estados farão a regulamentação de acordo com suas peculiaridades (artigo 24, I, e parágrafos 1º e 2º, da CF).

Embora haja entendimento de que esse método de controle do condenado fira a dignidade da pessoa humana por ser vexatório e invadir excessivamente a intimidade do sentenciado, assim não entendemos.

A pessoa que cumpre pena perde ou tem restringido certos direitos fundamentais próprios do homem livre, como a liberdade e a intimidade. Cabe ao Estado o controle do sentenciado, que, durante a execução da pena, deve observar uma série de deveres, dentre os quais o seu monitoramento eletrônico, quando determinado judicialmente.

Não é razoável o cumprimento de uma sanção penal sem fiscalização que funcione a contento. A ausência de adequado controle do apenado não favorece a ressocialização, além de, em determinadas situações, deixar a sociedade à mercê de indivíduos que poderão colocá-la em risco.

Não se trata de meio vexatório, uma vez que o aparato será o menos visível possível. É muito pior para o sentenciado ser fiscalizado por policiais em seu trabalho ou residência.

Ademais, o instrumento não será empregado em todas as hipóteses, mas quando o magistrado, de acordo com o caso concreto, entender necessário para que a pena seja devidamente executada e cumprida.

O que não é aceitável é que sejam executadas penas sem o controle adequado, como se fossem de faz de conta. As finalidades da pena devem ser buscadas e o monitoramento eletrônico é um instrumento eficaz para que isso ocorra.

A Lei aprovada pelo Congresso Nacional possibilitava a fiscalização por meio eletrônico em outras hipóteses, como no livramento condicional, no “sursis” e em penas restritivas de direitos que implicassem limitação de horário ou de freqüência a determinados lugares.

Infelizmente, com uma argumentação pífia, foram vetados os dispositivos legais que permitiam a monitoração nesses casos. Diz a mensagem de veto:

“A adoção do monitoramento eletrônico no regime aberto, nas penas restritivas de direito, no livramento condicional e na suspensão condicional da pena contraria a sistemática de cumprimento de pena prevista no ordenamento jurídico brasileiro e, com isso, a necessária individualização, proporcionalidade e suficiência da execução penal. Ademais, o projeto aumenta os custos com a execução penal sem auxiliar no reajuste da população dos presídios, uma vez que não retira do cárcere quem lá não deveria estar e não impede o ingresso de quem não deva ser preso”.

A adoção da monitoração eletrônica, contrariamente ao sustentado pela Presidência da República, vem, justamente, a possibilitar a adequada individualização e suficiência da execução das penas, já que o condenado estará sendo fiscalizado e terá de cumprir corretamente a sanção que lhe foi aplicada.

Também não há violação ao princípio da proporcionalidade, uma vez que tão-somente é exigido do condenado que cumpra corretamente a sanção e as condições que lhe foram impostas por ocasião do gozo de benefício legal.

É certo que há custo para a implementação da monitoração, mas nada de extraordinário que impossibilite a adoção do novo sistema de controle de condenados.

O que não nos parece razoável é que, a pretexto de a monitoração eletrônica não “esvaziar as cadeias”, deixe de ser implementada e as penas continuem a ser executadas sem a necessária e adequada fiscalização.

Monitoração eletrônica não pode deixar de ser aplicada por não esvaziar as cadeias

Esperamos que o Congresso Nacional se mobilize para derrubar o veto Presidencial e, com isso, possamos ter um adequado sistema de execução de penas em meio aberto.

Autores

  • é promotor de Justiça em São Paulo, mestre em Direito das Relações Sociais e professor da PUC-SP, Escola Superior do Ministério Público de São Paulo e da Academia da Polícia Militar do Barro Branco.

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